Há uma angústia nacional no ar que respiramos dos últimos meses. Que nos sobra desta frágil sensação de não confiarmos no tempo e nas coisas.

Na situação extraordinária da pandemia que nos trouxe sequelas sociais e económicas incalculáveis, tínhamos este anseio incontido do regresso à normalidade. E foram emocionantes os primeiros encontros, abraços, afectos que trocámos entre todos. Eram sentimentos guardados e contidos há demasiado tempo. Tristezas e alegrias por fazer e partilhar. Tempos por cumprir que queríamos viver a todo o custo.

Mas este regresso à normalidade deixou-nos parte do que fomos e pensámos que muitas coisas deixariam de ser como eram porque nos habituámos a que assim fosse ou não fosse.

Perdemos o ímpeto social que tínhamos. Refugiámo-nos mais na família pequena em prejuízo das famílias maiores que nos reuniam a todos de forma incondicional. Ficámos tímidos. Ficámos parciais na forma como ambicionamos a nossa felicidade. E ficámos amargos – muito amargos, contra tudo e contra todos os que nos desarranjaram a vida.

Como o alvo, apesar de tudo, era indistinto, a amargura projectou-se em forma de aversão sobre as instituições da normalidade.

E, claro, o sistema político foi o principal alvo da nossa esperança, mas também do nosso rancor.

Como, em português, o rancor medra sempre mais do que a esperança, o pessimismo do que o optimismo, etc, etc, queríamos mudar, queríamos vingar-nos dos tempos maus em que nem os funerais e os nascimentos eram respeitados.

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E começaram os populismos. De forma incerta e caótica. Mas começaram. Depois, o que em protesto tínhamos dito uma vez, ficou dito. Atrevemo-nos a dizer outra vez. E nada aconteceu! Então, afinal, mudar não era assim tão difícil ou criticável. No sistema partidário vimos coisas que não eram previsíveis. A direita descompôs-se ou desmultiplicou-se. Passou a ter extremismos que, até aqui, só eram admitidos à esquerda. Por seu lado, a esquerda, protagonizada pela estranha gerigonça, sucumbiu à sua diferença de género. E a partir daí ficou cinzenta, difícil de concertar ou mobilizar.

As lideranças estavam gastas e era preciso mudar. De todo o sistema partidário relevante todos os protagonistas mudaram. Resta a anunciada substituição no Bloco de Esquerda. Apenas ficou, irritantemente sorridente, António Costa.

Mas não se pense que ele não teve desgaste – público, interno e pessoal. Nunca vi um Governo de maioria desrespeitar-se tanto a si próprio em tão pouco tempo. Desbaratar de uma forma mortiça e infantil o capital de esperança que, apesar de tudo, sobrou da pandemia.

O Chega apareceu na direita de rompante e a luta fratricida deixou um CDS, sempre equilibrador e estruturante, de fora da contenda.

Em que estamos então?

Fartos disto tudo! Das trapalhadas, da sensação que temos de que quem governa, ou não quer governar, ou apenas quer governar-se. De que as alternativas são alternativas de protesto e não de poder….

Então, porque não nos dão a normalidade?

Para um caminhante exausto como eu neste deserto da política, ouvir, ainda que indistintamente, que o oásis está perto, despertou em mim uma ânsia e um clamor que não consigo calar. É que alguém falou de um acordo pré-eleitoral do CDS e do PSD!

E nesta única frase, tudo o que é normal e aprazível pode acontecer, como quase tudo o que nos faz reencontrar com uma feliz normalidade. Vejam só: ajudávamos António Costa a reencontrar-se com a sua ambição política internacional, a sorrir pela primeira vez de forma sincera; calávamos o protesto unipessoal e desgovernado de André Ventura, que não nos devolve nada, muito menos constrói algo de credível e promissor; ignorávamos este “salta pocinhas” entre a esquerda e a direita, paladino de um capitalismo desumanizado e libertário que parece ser a Iniciativa Liberal. Aproveitávamos para fazer vingar a história remetendo os radicalismos comunistas e bloquistas para a exiguidade e marginalidade que as suas doutrinas, derrotadas pela História, realmente merecem. E, finalmente, equilibrávamos o País numa afirmação democrática confiável, onde o essencial passa a ser o que sempre foi!

Será uma miríade? Espero que não! O País precisa de estabilidade e de uma normalidade segura e consistente Sem experimentalismos!

Venha o velho PSD e venha o velho CDS. Venham juntos devolver-nos a normalidade. Fazer o velho Portugal das coisas seguras!