É muito comum ouvir lamentos de tristeza devido aos dias de chuva. São muitas as pessoas que se sentem tristes pela falta de sol e a inundação dos pingos de chuva. Sentem-se esquisitas, irritadas, nostálgicas.

Estes sentimentos de tristeza associados ao tempo são de alguma forma normais, porque os tons cinza do céu ampliam os mesmos tons do tempo interno. Acrescente-se as razões bioquímicas, pois sabemos dos efeitos da falta de luz na diminuição da absorção da vitamina D, da produção de serotonina, dopamina, diminuição da libertação de endorfinas, todos estes ingredientes químicos responsáveis pelo bom estado de humor. Em simultâneo e contraponto, assistir-se ao aumento dos níveis de melanonina, que influenciam  o aumento de sonolência e de preguiça, contribui para a vontade de ficar em casa e não querer sair da cama. Murchar é o mood, assim, mais natural.

Há pessoas muito sensíveis às alterações climáticas e, nomeadamente, às mudanças sazonais. Oscilam os seus estados alegre/triste, ativo/inerte, expansivo/introvertido, de acordo com os ciclos meteorológicos, flutuação da luz. Mudam os ritmos de vida e hábitos do dia-a-dia, deixando-se influenciar por tais condições do ambiente externo.

Está identificado o fenómeno da depressão sazonal (e não confundir com bipolaridade, assunto de natureza patológica bem mais acentuada e que, infelizmente, é com facilidade anunciada no senso comum de modo desapropriado). No caso da depressão sazonal, deparamo-nos com sintomas depressivos como alteração do ritmo de sono, sentimentos de tristeza, tendência ao isolamento social, fadiga, dores corporais. A tendência à inatividade leva a manter uma certa inércia em não querer sair do casulo caseiro. Chegados os dias longos e os cheiros da primavera, estes sintomas depressivos dissipam-se e a vontade de sair e o aumento de ânimo revitalizam as sensações de satisfação e contentamento.

Não tem de ser necessariamente mau encarar os momentos de maior recolhimento e introspeção convocados pelos dias chuvosos. Aliás, tal até pode ser um meio bem reconfortante para reparar questões internas que necessitam de sossego e pousio para se tornarem mais esclarecidas e perceptíveis em benefício de uma maior auto-consciência. Só sentindo alguma nostalgia é que somos capazes de tocar nos nossos afetos mais profundos e daí transformar o que houver para reorganizar e regenerar.

Lembremos o último filme de Woody Allen, Um dia de chuva em Nova Iorque, ouçamos Autumn Leaves nas várias versões de Nat King Cole, Sara Vaughan, Chet Baker, Bill Evans, Autumn in New York, por Billie Holiday, para nos deixarmos envolver pelo encanto e romantismo do outono, da chuva, do frio. Deixar aquecermo-nos por dentro em contraste com o frio de fora.

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