A Câmara Municipal de Lisboa “lança para o desemprego” agentes dos serviços secretos da Rússia e de vários outros países que têm representação diplomática na capital portuguesa; em tempo de pandemia, Ferro Rodrigues apela aos portugueses que se apresentem em massa em Sevilha para apoiar a selecção de futebol e outros nossos dirigentes, incluindo o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, ficam ofendidos quando Angela Merkel ousa criticar a forma como em Portugal se combate a pandemia.

A lista de episódios que mostram que Portugal não parece ser um país a sério é longa, mas esses exemplos, mesmo sem o da corrida de António Costa para o banco, são suficientes não só para o provar, como também o facto de uma grande parte dos portugueses não se preocuparem com a sua segurança, a sua saúde e o seu futuro.

No caso da transmissão de dados pessoais pela CML, a embaixada da Federação da Rússia foi, de longe, a mais beneficiada. Segundo o relatório interno sobre a partilha de dados pela Câmara Municipal de Lisboa, tornado público pelo Observador, os diplomatas russos receberam de bandeja dados sobre os organizadores de 27 manifestações – não só das realizadas à frente do edifício situado na Rua Visconde de Santarém, mas também noutras zonas de Lisboa quando alguém protestava contra Vladimir Putin.

Estes números mostram que se a Câmara Municipal de Lisboa não está infiltrada por agentes dos serviços secretos russos (aqui vou ser acusado de estar sob o domínio de alucinações russofóbicas ou anti-putinistas), então estamos perante um aparelho extremamente incompetente, que viola de forma grave a Constituição Portuguesa. Será que os funcionários municipais enviavam para a embaixada de um país os emails apenas porque o nome desse país estava mencionado neles? Seria extremamente importante esclarecer qual o critério utilizado para o envio desses emails, quem são os verdadeiros responsáveis, pois conhecemos apenas os “bodes expiatórios” encontrados por Fernando Medina para salvar a face.

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Por exemplo, aquando da visita de Svetlana Tikhonovskaya, líder da oposição bielorrussa ao ditador Alexandre Lukachenko, servo obediente de Vladimir Putin, foi realizado um encontro com manifestantes que consideram que o primeiro só existe por obra e graça do segundo. Será que o pedido de autorização dessa iniciativa também foi parar à embaixada da Rússia? E os nomes dos ucranianos que protestaram contra a ocupação da Crimeia e do Leste da Ucrânia?

Perante uma situação tão séria, os apoiantes de Fernando Medina tentaram transformar este caso numa espécie de anedota, afirmando que os organizadores das manifestações anti-Putin tinham “escarrapachados” os seus dados pessoais nas redes sociais e que os serviços secretos russos não têm qualquer problema em chegar a eles sem o contributo dado pela Câmara Municipal de Lisboa. Claro que não faltaram as insinuações de que eles poderiam estar ao serviço de forças estranhas que pretendem derrubar Putin do poder.

Ora, não é verdade que os organizadores dessas e de outras manifestações têm todos os dados pessoais publicados nas redes sociais, nomeadamente a morada ou o local de trabalho, mas acredito que os serviços secretos russos não têm dificuldade em chegar a eles sem os dados cedidos pelas nossas autoridades. Por exemplo, basta olhar para o número de diplomatas que trabalham na embaixada da Federação da Rússia, mais de 20, para concluir que se trata de um número exagerado de diplomatas para um país tão pequeno. Além do mais, nem todos os agentes ou simpatizantes do regime de Putin trabalham na representação diplomática…

Mas quero sublinhar aqui, que a Rússia não é a culpada desta trapalhada toda, pois ela, tal como outras embaixadas, apenas se aproveitou do desleixo e incompetência reinantes nas nossas instituições. Culpados são os políticos que nos dirigem e que não são responsáveis por nada quando chega a hora da verdade. Respondem com respostas estapafúrdias, como “pedimos aos russos para eliminar os nomes”, ou que tudo não passa de um erro de secretaria.

Não se trata de um erro, mas de um crime que se vai acumulando com outros. Vejamos o combate à pandemia. Haverá outro país, além de Portugal, onde o presidente do Parlamento apele aos cidadãos para que, durante uma pandemia, assistam aos milhares a um jogo de futebol, mesmo que no país vizinho? Não podemos entrar nem sair da Região Metropolitana de Lisboa aos fins de semana, mas, na quarta-feira, podemos ir à bola a Sevilha? E o Presidente da República não encontra nada mais importante do que o futebol?

Não são os políticos, no entanto, os únicos culpados. Todos nós, Portugueses, somos responsáveis porque os elegemos, ou através da ida às urnas ou através da abstenção. Temos os políticos que merecemos.

Vivemos num mundo cada vez mais inseguro e complicado, mas queremos continuar a acreditar que Portugal é um país seguro e nada nos pode acontecer. Só acontece aos outros…

Porém, quando as coisas começam a dar para o torto, são cada vez mais os que veem a salvação em Andrés Venturas ou num qualquer outro D. Sebastião autoritário. Os actuais partidos do “arco governamental” estendem o tapete vermelho para a passagem solene do novo “salvador”. Será que a História se repete mesmo e os Portugueses não tiram conclusões? O que sucedeu depois da balbúrdia que foi a Primeira República (1910-1926)?

É verdade que, desta vez, temos cheques e bazucas da União Europeia, mas para que servem eles se Portugal continua a cair cada vez mais para a cauda da UE?