Este país não deixa de me surpreender. Vivemos a queixar-nos das dificuldades, da falta de oportunidades, de não sermos devidamente reconhecidos e até das nossas difíceis condições geográficas, como argumentos para o fraco desenvolvimento que temos tido ao longo da história.
Como país, a vida tem-nos dado grandes oportunidades que não soubemos aproveitar ou que deitámos, e aparentemente continuamos a deitar, pela janela.
Lisboa foi a cidade escolhida em 2019 para acolhimento da Jornada Mundial da Juventude (JMJ) em 2022. A pandemia deu ao país mais um ano para se preparar, já que o evento foi adiado para 2023. Este fim-de-semana, a um ano do evento, deparamo-nos com uma discussão em praça pública sobre quem paga e quem organiza.
Em 2019, o católico Marcelo Rebelo de Sousa e os ateus Fernando Medina e Bernardino Soares souberam perceber a dimensão do que estava em causa e a projeção que a escolha traria para o país e para as cidades organizadoras. Na verdade, a decisão sobre qual a cidade eleita para a realização da JMJ é atualmente uma disputa de dimensão planetária, tão renhida como no caso dos grandes eventos desportivos.
Lisboa conseguiu ser a escolhida. Ainda nos lembramos todos daquele célebre vídeo de Marcelo Rebelo de Sousa: “Lisboa, Portugal, conseguimos…”. Era uma manifestação presidencial de satisfação, quando no Panamá foi confirmado pela voz do próprio Papa que a próxima edição da Jornada Mundial de Juventude seria em Lisboa.
Fiquei pasmada quando li na imprensa que agora, a um ano do evento, tudo está por fazer e há um braço de ferro entre a Câmara de Lisboa e o Governo sobre quem paga a JMJ e quem é responsável pelo evento.
Expliquem lá bem o que está a acontecer porque não estou a perceber. Acham mesmo que este é o tempo e o argumento para se porem com discussões que podem e terão impacto lá fora? A um ano do início de um acontecimento que coloca durante uma semana as atenções do mundo inteiro em Portugal e em Lisboa, com a chegada prevista de mais de um milhão de jovens dos quatro cantos do mundo, estamos a arriscar um fiasco ou mudar o cenário para quem o quiser acolher? Eu estou a perceber bem o que se passa ou estarei enganada?
Não interessa se somos católicos ou não. A JMJ é, provavelmente, o maior evento internacional que já ocorreu em Lisboa. Muitíssimo maior e com incomparável impacto internacional se quisermos contrapô-lo, por exemplo, à WebSummit. E os nossos responsáveis políticos estão a discutir trocos na praça pública? É isso?
Madrid, aqui ao lado, acolheu este evento em 2011. Estiveram presentes na capital espanhola mais de dois milhões de jovens. São incontáveis os benefícios que a cidade colheu da organização deste evento. Como sempre, os espanhóis chegaram, viram e venceram. Não fizeram peixeirada na praça pública, organizaram bem e ganharam os louros.
Falo do exemplo espanhol, porque acho há muito tempo que, mais do que criticar e invejar os nossos vizinhos, devíamos aprender com eles. Os espanhóis terão muitos defeitos, mas são patriotas e têm um sentido de defesa do seu território e dos seus como ninguém. A esse propósito, recomendo a leitura do artigo do João Morgado aqui no Observador. Conta-nos como, enquanto por cá dormíamos e desperdiçávamos dinheiro sem utilidade prática, nuestros hermanos encomendaram um filme à Amazon para contar ao mundo que a grande viagem da circunavegação realizada há quinhentos anos foi na verdade levada a cabo pelo navegador espanhol Elcano, apesar dos destemperos do português Fernão de Magalhães. Já tinha visto esta versão da história no pavilhão espanhol da Exposição Mundial no Dubai. Confirma-se agora que enquanto os portugueses dormem, discutem e tratam da sua vidinha, os outros países crescem e valorizam-se, se necessário for, à custa da nossa incompetência.
Tudo isto é triste. Tudo isto é fado. Tudo isto é Portugal no seu pior.