O nosso melhor analista eleitoral, Pedro Magalhães, já deu a entender que acha prematuros os resultados das sondagens que têm saído nos jornais acerca das presidenciais, como se estas eleições fossem não só «favas contadas» mas, pior do que isso, algo sem importância de maior. Segundo Magalhães, esses resultados arriscam-se a ser os melhores que o conhecido comentador de televisão que lidera actualmente as sondagens poderá vir a ter: «Não me admiraria que estes resultados acabassem por ser o ponto mais alto da candidatura de Marcelo à presidência». E é verdade que o candidato faz tudo o que pode para diminuir a importância das eleições de Janeiro, como se quisesse varrer para debaixo do tapete aquilo que um novo presidente deveria fazer a fim de desatar o nó cego que continua a atar a política portuguesa.
Assim como é verdade que, em melhores alturas, o antigo primeiro-ministro, Passos Coelho, tinha a impressão que esse candidato seria um «catavento televisivo». E é também é exacto que, pouco antes da vitória aritmética extraída das últimas legislativas pelo PS e confrades, havia nas tertúlias televisivas nocturnas quem pensasse em empurrar o antigo presidente da Câmara do Porto, Rui Rio, para as presidenciais e hoje já estão empurrá-lo para se candidatar contra Passos Coelho no próximo congresso do PSD.
A verdade, para concluir, é que o partido não tinha um candidato susceptível de personificar vitoriosamente o programa político da mesma Coligação que começara a tirar Portugal do buraco onde Sócrates e o PS haviam enterrado o país. Durão Barroso poderia ter sido esse candidato mas é provável que a marca desastrosa deixada pela invasão do Iraque em 2003, à qual ficou associado desde o encontro dos Açores, o tenha impedido de se candidatar, apesar da experiência entretanto adquirida como presidente da Comissão Europeia e até como primeiro-ministro quando sucedeu à fuga de Guterres perante as suas responsabilidades (2001).
O resultado é que o terreno ficou aparentemente livre para o tal «catavento» com muito pouca experiência governativa e nenhuma internacional, que durante anos se limitara a dar opiniões, geralmente sem consequências, sobre os casos semanais televisivos. Por exemplo, confesso não me recordar de qualquer opinião vinculativa do actual líder das sondagens presidenciais acerca dos seis anos e tal que o país atravessou sob a dominação de Sócrates… Assim como não se lhe ouviu, desde que é candidato, uma palavra sobre as imperiosas exigências europeias da política monetária e financeira do país, em suma, sobre o verdadeiro significado do conceito de austeridade!
Dito isto, estas sondagens resolvem um problema. Mas não tranquilizam. Resolvem o problema de como votar. A minha posição sobre o semi-presidencialismo português é pública há muitos anos. Sou contra: neste género de sistemas, os Presidentes têm mais votos do que poder efectivo e isso cria, inevitavelmente, ilusões populistas desde o tempo de Eanes e agora de novo, quando Cavaco se viu impedido constitucionalmente de dissolver a Assembleia da República recém-eleita de forma a clarificar a manobra da «frente popular».
Sempre achei que o número de parlamentares devia ser reduzido, digamos, para 150 deputados eleitos num círculo único, mas reforçado, como era regra na monarquia liberal e na 1.ª República, por uma «segunda câmara» com 5 senadores eleitos por cada distrito e região autónoma (100 ao todo). Este Senado constituiria não só um freio necessário contra determinadas maiorias parlamentares mas também uma forma de representação regional que compensasse, quando necessário, a proporcionalidade do círculo único. O PR seria eleito de entre eles pelos deputados e senadores, sendo a base eleitoral alargada aos presidentes e vereadores das câmaras municipais a fim de dar mais peso territorial à presidência da República. Mas nada disto é para agora…
Hoje, já que as sondagens são tão simpáticas para o favorito, é possível abster-se e, no caso de ele não ser eleito à primeira, haverá tempo para emendar na segunda volta… De qualquer modo, prevejo que perto de 50% dos eleitores se abstenham e é compreensível que assim seja, quando o principal candidato já apregoa que será Presidente daqui a poucas semanas e, pior do que isso, se proclama «politicamente neutro». E nós a julgar que o PR não era apenas para «cortar fitas», mas sim para condicionar os partidos quando tal fosse necessário, como fizeram Eanes, Soares e Sampaio, e foi pena Cavaco não o ter feito quando Sócrates perdeu a maioria absoluta em 2009!
O candidato aparentemente destinado a ser eleito anuncia, em contrapartida, que não será «socialmente neutro». Lamento, mas não é essa a sua função. Além do governo, há incontáveis órgãos da sociedade civil consagrados às questões sociais, desde a Santa Casa da Misericórdia até à Fundação da Casa de Bragança, criada no Estado Novo em apoio à antiga família real e à qual o referido candidato preside actualmente. Os trunfos avançados por ele não tranquilizam minimamente uma grande parte do eleitorado. Há muito quem queira alguém que assuma as responsabilidades políticas que são próprias de um PR e que diga como é que o país sairá do atoleiro partidário que começa sufocar-nos. A notoriedade não chega!