O Boletim Económico de maio do Banco de Portugal apresenta a produtividade do trabalho como tema em destaque (“Produtividade aparente do trabalho em Portugal na última década: uma abordagem ao nível da empresa”), tendo concluído que apesar de as empresas exportadoras serem mais produtivas do que as suas congéneres não exportadoras, “nenhum dos grupos registou ganhos assinaláveis de produtividade entre 2008 e 2017”.

Esta conclusão é, simultaneamente, preocupante e desafiante.

Para compreender esta dupla adjetivação, importa recordar Paul Krugman segundo o qual a existência de comércio internacional assenta em duas razões básicas. Em primeiro lugar, uma vez que os países têm características distintas, tal como com as pessoas, poderão beneficiar das suas diferenças encontrando um equilíbrio no qual cada um se dedicará à produção daquilo que, do ponto de vista relativo, melhor sabe fazer. Uma outra razão tem a ver com os ganhos obtidos com as economias de escala. Ganhos que resultam da concentração dos recursos na produção de um conjunto auto-limitado de bens e em quantidades proporcionalmente maiores que o aumento dos recursos, ao invés de se dispersarem os recursos, em menores quantidade, por um conjunto muito diversificado de bens.

Sendo estas as razões fundamentais para o comércio internacional, importa também referir que o sucesso das empresas no mercado internacional (nas palavras de Krugman, “são as empresas que competem no mercado internacional e não os países”) depende, em grande medida, da produtividade dos fatores produtivos, em particular, do fator trabalho. Porém, mais importante do que analisar a produtividade do trabalho em termos absolutos, importa avaliar esta variável numa perspetiva relativa.

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Para ilustrar esta diferença de enfoque, considere-se um bem Z que é produzido por duas empresas em dois países distintos (A e B), sendo que, por simplificação, as respetivas funções de produção utilizam apenas o fator trabalho. Assim, se o custo do trabalho for igual nos dois países, mas no país A a produtividade do trabalho for o dobro da observada no país B, então facilmente se conclui que o preço do bem Z no país A será metade do observado no país B. Isto significa, abstraindo do custos de transporte e da existência de restrições ao comércio internacional, que a empresa do país A vai dominar totalmente o mercado, enquanto a quota de mercado da empresa do país B cairá para zero.

Obviamente que a realidade não é tão simples como o exemplo apresentado. No entanto, este exemplo serve, perfeitamente, para ilustrar a “mecânica” do fenómeno e para reforçar a ideia de que a produtividade do trabalho, quando comparada com a dos concorrentes, é essencial para o sucesso competitivo das empresas.

E, nesta matéria, como se posiciona Portugal no quadro europeu?

Em primeiro lugar, a produtividade do trabalho por hora em Portugal correspondia em 2017 a apenas 66% da média da União Europeia (UE), o valor mais baixo desde 2004 (65,8%), colocando Portugal no 20º lugar em 28 países.

Por outro lado, quando se compara, do ponto de vista relativo, a produtividade do trabalho em Portugal com a observada em cada um dos nossos 27 parceiros europeus, constata-se que em 2017 éramos menos produtivos do que 19 deles (apenas mais produtivos em 8 casos).

De igual forma, constata-se que no período 2000-2017 a evolução da produtividade do trabalho em Portugal foi menos favorável do que a observada em 15 dos países europeus (evolução mais favorável quando comparada com 12 países) sendo, o sub-período 2015-2017 o mais negativo nessa evolução, tendo a produtividade do trabalho em Portugal piorado face a todos os parceiros da UE.

Gráfico – Evolução da Produtividade do Trabalho em Portugal face aos Restantes Países da UE

Fonte: Pordata e cálculos próprios

Por fim, saliente-se que a evolução da produtividade do trabalho em Portugal, quando comparada com alguns dos países da UE com estruturas de produção semelhantes (países do Visegrado – Hungria, Polónia, República Checa e República Eslovaca), é particularmente negativa, com estas economias a terem ganhos de produtividade face a Portugal entre 20 e 40%, no período iniciado em 2000.

Gráfico – Evolução da Produtividade do Trabalho em Portugal e nos países do Visegrado face à Média da União Europeia

Fonte: Pordata e cálculos próprios

A menor produtividade do trabalho em Portugal face aos seus congéneres europeus poderá ter duas origens.

Por um lado, com a mesma quantidade de trabalho fazemos menos quantidade de produto do que a generalidade dos nossos concorrentes (por exemplo, com uma hora de trabalho fabricamos menos rolhas do que os nossos concorrentes) – problema de eficiência.

Por outro lado, com a mesma quantidade de trabalho produzimos produtos de menor valor acrescentado quando comparados com os produzidos pelos nossos concorrentes (por exemplo, enquanto nos dedicamos à montagem de telemóveis, os nossos concorrentes orientam os seus esforços no desenvolvimento tecnológico dos telemóveis) – problema de posicionamento na cadeia de valor.

Como resolver estes dois problemas de natureza distinta?

Se a fraca produtividade tiver a ver com questões de eficiência, importa perceber como é que produzindo exatamente o que os concorrentes produzem o podemos fazer com menor utilização de recursos. Se a fraca produtividade tiver a ver com problemas de posicionamento na cadeia de valor, então importa identificar em que posição da cadeia de valor nos devemos concentrar e de que forma podemos reorientar os nossos esforços para atingir esse objetivo.

Independentemente da origem dos problemas de produtividade, a solução passa, inevitavelmente, por alterações ao nível interno das organizações.

Com efeito, para aumentar a produtividade é essencial a melhoria contínua dos processos internos (para Fernando Pessoa “não é o trabalho, mas o saber trabalhar, que é o segredo do êxito no trabalho”).

De igual forma, a valorização do conhecimento e sua partilha dentro das organizações (importa passar de uma lógica de conhecimento individual para uma lógica de conhecimento organizacional) e da capacidade de reconhecer o erro, utilizando-o como elemento incontornável no processo de aprendizagem (“se não receio o erro é porque estou pronto a corrigi-lo”, dizia Bento de Jesus Caraça), são “combustíveis” imprescindíveis na melhoria da produtividade. Por fim, mas não menos importante, o reconhecimento do mérito (“o mundo recompensa com mais frequência as aparências do mérito do que o próprio mérito” afirmava François de La Rochefoucauld).

Obviamente que as variáveis de contexto também poderão ajudar a acelerar este processo. E, nessa matéria, apesar da importante posição do Estado, o sistema bancário pode – e deve – ter um papel da máxima relevância, designadamente, no apoio ao desenho e construção das melhores soluções que permitam, em cada caso, às empresas portuguesas vencerem a batalha da produtividade.

Professor universitário