Imagine que quer lançar o seu negócio e criar uma empresa de sucesso. O primeiro passo, pensa para si, é inventar um produto inovador e de preferência escolher um setor sem concorrência. Certo? Pois, não é bem assim.

Muitas das grandes empresas de hoje, mesmo as tecnológicas, não foram as inventoras dos setores que lideram e cresceram não obstante concorrentes já bem implantados. Alguns exemplos, para os mais céticos: o Facebook não foi a primeira rede social, a Amazon não foi a primeira livraria online e o Google não foi o primeiro motor de busca na internet. Para leitores mais da minha geração e em Portugal: o Millennium BCP não foi o primeiro banco português e o H3 não foi a primeira cadeia de hambúrgueres.

Então, isto significa que qualquer empresa, em qualquer momento e com uma boa estratégia poderá entrar em qualquer setor e crescer com sucesso.

Ah, poderá contrapor, mas todas essas empresas de sucesso têm capacidade de inovação! Verdade. Mas não é aí que reside a vantagem. Se fosse, Portugal seria origem de muitas grandes empresas multinacionais. O nosso país produz inovação, mesmo no contexto das PMEs, que constituem a grande maioria do nosso tecido empresarial. De acordo com o European Innovation Scoreboard de 2020, a atividade de inovação (I&D) nas PMEs em Portugal foi das mais elevadas na EU (em 2020, a mais elevada). Onde já não somos tão bons é na captação de valor dessa inovação, ou seja, no crescimento do negócio decorrente da inovação (em 2020, estávamos em 16ª posição no contexto dos 27 membros da UE).

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Os fatores que estão na origem desta disparidade são certamente vários. Os mais simples de resolver são os três erros que vejo serem cometidos com maior frequência pelas nossas empresas.

A paixão do “produto” em detrimento do negócio

A grande maioria das empresas assenta a sua atividade em produtos ou serviços que procuram aperfeiçoar obsessivamente de acordo com … (rufar de tambores) … a visão interna do que ‘deve ser’. Isto é ainda mais gritante no contexto de empresas cuja capacidade de inovação tecnológica é elevada.

No entanto, um produto ou uma tecnologia só poderão sustentar uma empresa de sucesso quando encontrarem um modelo de negócio repetível e escalável, que resulte em criação de valor para a empresa e os seus stakeholders. Ou seja, que remunere devidamente todos os recursos necessários à atividade.

Isto significa que antes de lançar o que quer que seja, a empresa deve encontrar o seu mercado e um modelo de negócio. O que me leva ao segundo erro.

Distanciamento face ao cliente

O Steve Blank diz que “a maioria das startups não tem um processo para descobrir o seu mercado, localizar os seus primeiros clientes, de forma a validar as suas hipóteses e fazer crescer o seu negócio” (in Four Steps to the Epiphany, Wiley, 2020). Eu arrisco dizer que este é um problema na maioria das empresas.

Para encontrar o tal ‘modelo de negócio’, a empresa terá que em primeiro lugar encontrar um conjunto de clientes que tenha um problema ou necessidade, que possa ser resolvido pela oferta do seu produto, serviço ou tecnologia. E, quando estamos numa fase inicial do negócio, essa necessidade tem que ser de tal forma marcante que motive estes clientes a experimentar o que está a ser oferecido – que nessa fase terá imensas falhas, mas, sabe que mais? Não importa, porque estes primeiros clientes são os pioneiros, aqueles que adoram experimentar novidades e falar disso aos amigos. Eu gosto de lhes chamar os “clientes ideais”.

Procurar estes clientes implica saber perguntar e saber ouvir. E usar todo o know-how tecnológico e de produto para adaptar o que se quer lançar àquilo que o cliente realmente precisa ou deseja. Para afinar esta ‘capacidade de ouvir’, também será importante perceber o enquadramento do negócio. E aqui chegamos ao terceiro erro comum: uma interpretação errada da concorrência relevante.

Análise (enviesada) do contexto concorrencial

Conhecer bem o contexto em que se movem os seus clientes é fundamental para criar a empatia necessária para encontrar um modelo de negócio que funcione, mas, ainda antes disso, para garantir que a empresa é relevante no seu contexto temporal.

Muitas vezes, em sessões de pitch de startups, ou mesmo dos meus alunos, oiço ‘este negócio é inovador, não tem concorrência’. Não se enganem… A mente do cliente é muito mais fluida nas comparações que faz do que a mente do empresário. Na realidade, cada indivíduo tem os seus hábitos, e tão depressa compara a Uber com a Glovo – sim, faz sentido – como os processos da sua universidade com o funcionamento do Instagram. E a esta última não chegaríamos sozinhos, sem saber ouvir!

Por isso, defendo que é fundamental olhar para a concorrência direta, mas é ainda mais importante aprender com os líderes do momento, mesmo fora do setor, para saber como se podem criar experiências úteis, diferenciadoras e sedutoras, que garantam a lealdade destes clientes cada vez mais irrequietos e exigentes. Aí sim, vale a pena ir buscar todas as competências de inovação possíveis, para encontrar o seu próprio oceano azul que leva ao sucesso. E cria unicórnios.

Em jeito de conclusão, dada a relevância das PMEs no tecido empresarial português, uma renovação destas competências traria certamente um valor acrescentado significativo à nossa economia real.