O que aconteceu em 2016 tem poucos paralelos na história, se alguns, o que dificulta qualquer previsão para 2017. Mas como as sementes do futuro estão no presente, os extraordinários eventos deste ano permitem-nos discernir algumas tendências, que valha a verdade, são pouco animadoras.
Protecionismo
A tendência mais visível deste ano é o ressurgimento do protecionismo, em primeiro lugar cultural, humano e social, em que o medo do confronto com outras culturas se sobrepõe à compreensão da nossa humanidade comum. A face mais visível deste protecionismo é a reação à chegada massiva de refugiados às fronteiras da Europa. Mas não só.A União Europeia acordou no dia 25 de junho com o choque da saída do Reino Unido, motivada entre uma parte significativa do eleitorado, pela vontade de deixar de estar dependente de decisões da UE e pelo desejo de fechar a fronteira a muitos imigrantes vindos da União Europeia mas também do resto do mundo. Existem é certo, exceções notáveis, como é o caso da Chanceler Merkel. No entanto, esta dicotomia entre acolhimento e rejeição alertou para um problema sério: que o sucesso da União Europeia a preservar a paz e um modelo social único no mundo durante meio século poderá ter resultado menos das políticas da própria União do que da ausência de choques externos significativos até 2008.
Aliado a este medo do estranho revelou-se com a eleição nos Estados Unidos, o desejo de um maior protecionismo económico. A parte do eleitorado americano que foi o principal perdedor da globalização escolheu um novo Presidente que prometeu acabar com os acordos de comércio livre existentes e os que estavam a ser negociados e a reforçar as fronteiras com o México (na realidade prometeu construir um muro quando já existe ao longo da fronteira uma vedação). As decisões que já conhecemos do Presidente eleito sobre a sua equipa mais próxima, por exemplo um economista que defende uma política económica agressiva com a China para chefe de um Conselho de Comércio internacional na Casa Branca, mostram que as suas ideias pré eleição não foram meras bandeiras de campanha.
Populismo
O populismo não é uma ideologia, porque atravessa todo o espectro político, da direita à esquerda. É uma retórica e uma técnica de comunicação que necessita de um líder carismático, com uma visão anti-elitista, anti-intelectual e anti-factual, que apresenta soluções simplistas para problemas que não o são. Para os populistas os opositores políticos democráticos são mais do que isso, são inimigos que é preciso combater, supostamente em nome do povo, ignorando que foi esse mesmo povo que os elegeu.
A subida do populismo está também associada a, mais do que uma despreocupação, um ataque aos factos reais. Por isso é especialmente perigosa, porque sem o conhecimento dos factos não é possível prever ou estimar as consequências dos atos.
Na Europa, os populistas têm por objeto predileto o seu ataque às instituições Europeias. E, sinal das dificuldades que a democracia tem em gerir os populismos, é que esses ataques, que não são críticas construtivas, mas simplesmente uma retórica de “nós contra eles”, vêm de dentro das próprias instituições democráticas europeias, como é o caso do Parlamento Europeu, onde os populistas têm assento. É significativo até que os movimentos e partidos populistas de esquerda e de direita se unam para celebrar vitórias populistas contra as instituições Europeias.
Em 2016, a tendência para o crescimento dos populismos nos últimos anos teve uma especial expressão, na subida de Marine Le Pen nas sondagens em França, a subida do Movimento Cinco Estrelas em Itália, a quase vitória do candidato de extrema direita Norbert Hofer na Áustria, na vitória da campanha de Nigel Farage para a saída do Reino Unido da União Europeia.
Nova ordem mundial
A subida do populismo está assente numa nova ordem mundial em que a Rússia parece estar a procurar tomar um papel de relevo. Sabemos hoje que vários partidos populistas têm relações com Moscovo. A imprensa relata esta a semana que o Partido da Liberdade da extrema direita Austríaca cujo candidato Hofer perdeu as eleições para a Presidência assinou um acordo com o partido de Vladimir Putin Rússia Unida.
Nos Estados Unidos, o Presidente Trump parece querer reaproximar-se da Rússia, que alegadamente terá tentado influenciar as eleições americanas, ao mesmo tempo que ameaça reduzir o papel dos Estados Unidos na Nato.
É difícil perceber neste momento quais serão as possíveis consequências desta mudança que aparenta ser a primeira significante alteração à ordem mundial desde o final da guerra fria.
Os economistas, que fazem previsões com base na experiência do passado, encontram-se “fora dos dados”, por não haver aparentemente comparações fáceis com eventos históricos. Os paralelos possíveis remetem-nos para tempos difíceis na Europa e no Mundo. Resta-nos por isso esperar que não se concretizem estas tendências nos mesmos moldes do que no passado.