Talvez a solução fosse pôr tudo numa app de encontros.
O Chega, claro, seria o primeiro a instalar, com aquela vontade de levar tudo à frente. Muitas fotos, pouco texto: no ginásio, no descapotável, de gel e camisa justa em modo rei da pista. Afirma-se católico, conservador, com interesse em touros e caça. Para chegar ao altar, declara-se disponível para tudo: privatizar, nacionalizar, viabilizar, inviabilizar, cortar a direito ou gastar à tripa-forra – e, acima de tudo, para se coligar com todos (o que parece não interferir com a sua proclamada moral cristã).
Depois, o PSD. Demorou a aderir, mas lá avançou. Tem fotos em bons fatos e roupa de domingo, no escritório e a jogar padel, a olhar o horizonte e rodeado da família. Fala de ambições, foco no futuro e em vontade de ser pai. Diz que procura relacionamento sério, mas não lhe basta um parceiro: pisca o olho à ex e à nova no pedaço, ao brasonado e ao sofisticado (afinal, diz, tudo começa com uma amizade).
A IL é um perfil novo. Moderna, viajada. Tem fotos com amigos de esquerda e de direita, daquela vez em que foi ao Avante e junto ao touro de Wall Street – e a melhor lista de Spotify da direita, o que não é dizer pouco. Afirma-se, obviamente, liberal – na política, na religião, nos costumes – mas que só está ali para conhecer pessoas. Casual ou relacionamento, só depois de Março. Que isto liberal não é à vontadinha.
E, por fim, o CDS. Aquele senhor de meia-idade e boas famílias que ainda não se sente particularmente à vontade com estas novas linguagens. Então, não era ao balcão do Stones que se conhecia as pessoas? Na pista do Coconuts? Aconselhado pelos sobrinhos, lá instalou a aplicação, mas não é fácil isto de tentar voltar ao mercado querendo convencer-se de que nunca se saiu. Tem fotos dos dias de ouro – na AD, n’O Independente, no Forte de São Julião da Barra e no Palácio das Necessidades – mas, quando lhe pedem fotografias mais recentes, publica tudo ao longe ou de óculos escuros. Diz-se sério e com experiência. Garante estar cheio de pretendentes e com mais força do que nunca. Mas talvez – talvez – se esteja a esforçar de mais.
Tudo depende, é claro, do que se procura. Ao registarem-se, a app perguntaria se desejam ver potenciais parceiros de direita, esquerda ou tanto faz. A que distância e com que diferença de idades.
Do outro lado do espectro, teríamos o PS de um Pedro Nuno, parecendo o oposto do Chega, mas com a mesmíssima atitude: disponível para se coligar com tudo o que mexa – desde que mexa, claro, para a esquerda. Porém, ao mesmo tempo e talvez tendo ouvido dizer que nada diz caso tórrido num hotel na CRIL como uma aliança no dedo, afirmando-se um social-democrata que até tem amigos que são.
A seguir, o PS de José Luís Carneiro, mais apostado no parlapiê do que no primeiro impacto. Que prefere ver o país casado com o PSD do que entregue ao Chega. Que se apresenta como moderado, mas que os rivais diriam que dá para os dois lados. Sempre a tentar marcar cafés com Pedro Nuno – mas o outro com medo de estragar tudo.
E por aí adiante, com Livre e Bloco, por experiência e espírito mais disponíveis para encontros, o PAN para quem o adoptar e o PCP ainda a tentar instalar a app no velho leitor de cassetes.
Na prática, o Chega faria swipe ao PSD e ao CDS, que fariam swipe à IL, que não faria swipe a ninguém. Ferido no ego, o PSD, faria ghosting ao match com o CDS, enquanto o Chega, despeitado com as tampas, bloquearia todos. [Eu sei, eu sei que faço guerra aos anglicismos. Mas esta parte não teria a mesma graça doutra maneira.] Então, o PS talvez continuasse a governar. Um PS cada vez mais magro, onde é cada vez mais difícil encontrar candidatos a ministros e secretários de Estado sem problemas com a justiça, unido nas suas duas partes, reconciliadas num casamento de conveniência, em que todos saberiam que um se continua a encontrar com a direita e o outro com a esquerda, mas onde ninguém falaria sobre o assunto.
Entretanto, no mundo real, o país continua à espera. Sempre a sonhar com um amor qualquer, mas cada vez mais descrente no futuro destas relações.