1 Portugal e o TIMSS
Recordo que, quando era Diretor-Geral do Planeamento da Educação na década de 90, e surgiu a oportunidade de Portugal passar a participar nos estudos internacionais de avaliação dos resultados educativos, através dos projetos PISA e da IEA, que viria a lançar o TIMSS, a proposta de adesão foi muito criticada, surgindo, paradoxalmente, dois argumentos contraditórios: quem sabe da nossa Educação somos nós, pelo que não se justificam estas modernices ou, então, a participação implica o risco de, afinal, não estarmos assim tão bem e então virá mais um problema… Felizmente, conseguimos a participação de Portugal e, desde então, passámos a ter análises comparativas objetivas e fundamentadas, por muito que custe aos governantes menos esclarecidos. Ora, o estudo TIMSS baseia-se num dos mais prestigiados centros de estudos internacionais em Educação e foram agora publicados os resultados obtidos em 2019 para o desempenho dos alunos em Matemática e Ciências no 4º e 8º anos, pelo que nesta breve nota vou apenas partilhar as ilações que julgo mais importantes para o caso da Matemática no 4º ano.
2 As grandes lições do TIMSS
Ao acompanhar os sucessivos estudos do TIMSS são bem numerosas as lições que nos ensina, mas talvez as mais importantes sejam três :
- Ao contrário do que por vezes se pretende supor, os resultados dos nossos alunos são muito sensíveis a quaisquer melhorias ou piorias das políticas educativas, fazendo-se sentir os seus efeitos quase imediatamente. No caso atual, bastou a soma de alguns erros dos últimos anos para se regredir mais de 12 anos!
- Ninguém ignora a influência do contexto sócio-económico dos alunos no seu desempenho, mas a boa notícia é que o entusiasmo, a competência e o acréscimo de motivação de alunos, professores e pais permitem obter grandes melhorias, tal como, aliás, se demonstrou em estudo realizado para a SEDES em coordenação com João Salgueiro.
- Sempre que se pioram resultados, é habitual culpabilizar a falta de recursos, concluindo que tudo seria melhor se houvesse mais meios (professores, auxiliares, etc). Ora, a realidade desmente esta cómoda hipótese que a todos desresponsabiliza, pois temos países dotando a Educação de recursos bem mais generosos e obtendo resultados muito piores do que outros, tal como agora aconteceu: a França surge em último lugar dos pertencentes à UE, enquanto a Irlanda surge nos dois melhores!
3 As boas notícias
As boas notícias é que, embora tenhamos piorado muito em relação a 2015, continuamos na média dos Estados que participaram e pertencem à UE (índice de 525 ), podendo-se mesmo dizer que estamos iguais à Dinamarca, melhores do que a Hungria ou Alemanha e muito melhores do que os resultados desastrosos de Espanha ou França!
4 As más notícias
Portugal melhorou continuadamente desde 1995 (442), atingindo 541 em 2015 e agora piora para 525 .Tal resulta de fatores bem conhecidos: eliminação do exame externo no 4º ano, a desestruturação do currículo efetivamente ensinado, a redução da ênfase no ensino de Matemática, etc., invertendo os passos positivos anteriores. Outro resultado desastroso é Portugal ser um dos Estados em que a diferença de resultados entre géneros é maior, desfavorecendo as alunas.
5 As péssimas notícias
Infelizmente, temos ainda notícias piores e que resultam de ser o Ensino do 1º Ciclo, aquele que no nosso país, foi, ao longo de décadas, o ciclo mais esquecido ao contrário do que aconteceu em muitos outros países europeus, que alargaram o 1º ciclo a 6 anos e enriqueceram o seu currículo, tal como aconteceu em Inglaterra, pelo que não surpreende estar no topo dos resultados europeus. Ora, este ciclo é o mais importante para ultrapassar as condicionantes sócio-económicas de muitos alunos, que neste ciclo podem conquistar motivações e ambições que os ajudem a compensar as suas origens, pelo que assim se ameaça o chamado “elevador social”.
6 Uma geração em risco grave?
Importa recordar que a melhoria do ensino da Matemática no Ensino Básico é geralmente tema obrigatório dos programas de Governo, mas tal não aconteceu no programa do atual XXII Governo. Todavia, é possível avaliar objetivamente a situação e corrigir ainda a rota. Se, pelo contrário, a opção for negar as evidências, bem ao estilo de conhecido presidente americano, manter os erros e continuar a não apetrechar as escolas com os computadores já prometidos em Maio e Novembro, e que continuam no reino da imaginação, estaremos a acentuar o declínio.
Ora, convém não esquecer que, após 2019, surgiu em 2020 a pandemia e o encerramento das escolas, tendo tido de se recorrer ao ensino a distância com impactos negativos acrescidos devidos a alguns erros (45 minutos de duração da aulas, etc.), mas que vitimaram especialmente os mais desfavorecidos sem PCs nem acesso a internet. Consequentemente, se somarmos ao contexto de desastre pandémico, o aprofundamento dos erros anteriores, estaremos a colocar em risco grave toda uma geração, negando assim o lema programático deste Governo: “Apostar na escola pública como elemento de combate às desigualdades.”