Esta semana a União Europeia anunciou um plano para mobilizar 300 mil milhões de euros de financiamento comunitário, dos Estados-membros e do setor privado, com o objetivo de investir em projetos de infraestrutura fora das fronteiras da União Europeia.
O projeto, designado Global Gateway, vai recorrer ao Banco Europeu de Investimento, ao Banco Europeu para a Reconstrução e Desenvolvimento, aos tradicionais fundos da UE e ainda a novos instrumentos financeiros no Quadro Comunitário de Apoio até 2027, nomeadamente ao Instrumento de Vizinhança, de Cooperação para o Desenvolvimento e de Cooperação Internacional – Europa Global.
A coordenação externa da política económica da União Europeia tem sido fundamentalmente orientada para a negociação de acordos de comércio e investimento, para o desenvolvimento dos países na fronteira Leste da Europa e o programa de apoio ao desenvolvimento regionais, por exemplo com os países de África, Caraíbas e Pacífico. Em 2020, em resposta à crescente influência económica de Estados estrangeiros na UE, foi também lançado o Mecanismo de Análise dos Investimentos Estrangeiros.
Mas o novo projeto Global Gateway é uma mudança significativa da UE na competição pela influência económica global. O plano atual é mais ambicioso na sua abrangência geográfica e mais focado na tentativa de ganhar influência a apoiar a estabilização dos países vizinhos. O programa Global Europe do anterior Quadro de Financiamento Multilateral tinha um valor orçamentado inferior a 60 mil milhões de euros entre 2014 e 2020. O projeto atual não se limita a usar fundos públicos e deverá servir de apoio e de alavanca para o investimento estrangeiro já existente das empresas e dos Estados Europeus e mobilizar novos investimentos privados. Se tiver sucesso, servirá para reduzir os riscos de conflito nas fronteiras da Europa, estabilizar os fluxos de migrantes e, possivelmente, aumentar a capacidade de fazer frente à crescente influência da China e da Rússia em regiões que são importantes para a Europa.
Mas esta tentativa de resposta europeia não está isenta de dificuldades. A Europa chega oito anos depois do plano Belt and Road anunciado pela China em 2013, que contribuiu para tornar o país um dos principais investidores internacionais nos países emergentes e em desenvolvimento em 2019[1]: o primeiro nos países em desenvolvimento asiáticos e nos países menos desenvolvidos do mundo, por exemplo Moçambique, o quarto em África, tendo ultrapassado os Estados Unidos, e o sexto nos países em transição, incluindo os antigos Estados da URSS. A União Europeia poderá assim encontrar obstáculos ao investimento em países onde a China já está muito envolvida.
Os montantes de financiamento são também bastante diferentes. A Europa prevê um investimento de 300 mil milhões de euros até 2027, enquanto o valor acumulado dos projetos Belt and Road, segundo o World Bank que apresenta uma das estimativas mais conservadoras, era de 575 mil milhões de dólares em 2018. A capacidade de mobilizar para este projeto fundos das empresas é também muito desigual, porque na China o Estado detém ou está diretamente envolvido nas grandes empresas enquanto na Europa é necessário que o setor privado se envolva voluntariamente neste projeto. Por fim, na Europa não existe informação sobre o que acontecerá com este projeto depois de 2027, o que pode ser limitativo quando consideramos que os projetos de infraestruturas têm benefícios sobretudo no longo prazo. O que sabemos é que a emissão de dívida da União Europeia ao abrigo do programa Next Generation EU terminará necessariamente em 2026 e que a UE se comprometeu a reembolsar toda a dívida que emitir no mercado de capitais até 2058, o que poderá limitar a capacidade de financiamento dos investimentos no estrangeiro.
Para além do plano Europeu, também os Estados Unidos anunciaram em Outubro um plano de investimentos apoiado pelos países do G7, Índia, Austrália e Japão, chamado Build Back Better World, embora tenha sido com o Presidente Trump que os Estados Unidos começaram a responder ao plano chinês, com a criação da International Development Finance Corporation.
Apesar das dificuldades, com o Global Gateway a Europa parece finalmente ter assumido que o caminho para a preservação dos valores europeus passa também por investir de forma muito mais significativa do que no passado, coordenando fundos públicos e privados, para reforçar sem complexos a influência económica nos países em desenvolvimento, sobretudo nas suas fronteiras.
[1] Fonte: dados da UNCTAD sobre os fluxos de Investimento Direto Estrangeiro