Nas eleições legislativas de 10 de Março, PS e PSD conseguiram fazer eleger o mesmo número de deputados (78 mandatos para cada um dos dois partidos). Considerando adicionalmente que a vantagem da AD sobre o PS foi inferior a 55.000 votos e que o CDS teve nas legislativas de 2022 mais de 89.000 votos numas eleições com participação substancialmente menor (acréscimo de 5.563.497 votantes em 2022 para 6.473.789 votantes em 2024), não é de excluir que o PS possa ter captado mais votos do que o PSD. Esta aritmética fica mais complicada se considerarmos que o ADN aumentou a sua votação mais de 90.000 votos face ao que tinha conseguido em 2022 e que é provável que uma parte considerável desse acréscimo se tenha devido à confusão entre ADN e AD por parte de eleitores do PSD. Ainda assim, é significativo — e deveria merecer maior reflexão — que, perante um PS extraordinariamente desgastado e radicalizado, o PSD não tenha ido além de um empate.

De facto, contra um PS desgastado e enfraquecido, PSD e CDS tiveram a 10 de Março um dos seus piores resultados de sempre. Em 2022, conjugando o resultado desastroso do CDS com o resultado conseguido pelo mal amado Rui Rio, PSD e CDS captaram 30,69% dos votos. Em 2024, apesar da vitória da AD, esse valor baixou para 28,84%. É certo, apontarão alguns justamente, que não devemos ignorar nesta análise do fraco desempenho da AD o aparecimento e crescimento da IL e – em especial – do CH. Mas também relativamente a esses fenómenos importa salientar que, pela primeira vez na democracia portuguesa, há um milhão e meio de eleitores à direita do PS que não querem PSD nem CDS. E tudo isto com a estratégia do “não é não”, que poucos reconhecem ter fracassado não obstante as evidências. É caso para questionar: se a estratégia do “não é não” (que culminou num dos piores resultados de sempre do PSD e CDS e em 23% dos eleitores a preferirem CH e IL) está a ser um sucesso, a quanto acreditam que teria a AD ficado reduzida sem ela?

Ao empate entre PS e PSD soma-se outra constatação de aritmética parlamentar com alguma relevância: se o CH se abstiver, o PS consegue fazer aprovar legislação com BE, PCP e L, mas o PSD não consegue fazer aprovar legislação com CDS e IL contra a esquerda nem mesmo com a abstenção do CH. Na realidade, o PSD só “venceu” porque Pedro Nuno Santos desistiu, como aliás ficou bem patente logo na noite eleitoral. E Pedro Nuno Santos só desistiu porque os votos dos portugueses no dia 10 de Março proporcionaram uma ampla maioria de direita com o CH. Rui Ramos resumiu exemplarmente a situação no seu artigo “A grande estupidez do regime”:

“Talvez a direcção do PSD soubesse que era demasiado fraca para sobreviver às eleições sem esse truque: ou votam em nós, ou, porque “não é não”, deixamos o PS no poder. Desse ponto de vista, o resultado é patético. Mesmo com a chantagem do “voto útil”, o PSD só governará porque há uma maioria de direita, isto é, graças ao Chega. Sem isso, nunca a esquerda o deixaria governar.”

Nas eleições de 10 de Março, o país evidenciou claramente a sua insatisfação com a governação socialista e virou à direita mas essa viragem concretizou-se através do extraordinário crescimento do Chega. O sistema partidário português mudou, aliás no sentido do que já vem acontecendo em outros países europeus com uma maior fragmentação e uma reconfiguração da direita. Enfiar a cabeça na areia perante essas mudanças dificilmente será uma boa solução para o que quer que seja. 

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR