Há três semanas atrás foi anunciado que um novo imposto sobre o património, a aplicar a partir de 2017, deverá incidir sobre o valor tributário total dos imóveis dos contribuintes, enquanto o IMI (imposto municipal de imóveis) se aplica ao valor de cada prédio; segundo a informação inicial, avançada pelo Bloco de Esquerda, o limite mínimo para cobrar o imposto ascende a 500 mil euros de valor patrimonial e a sua aplicação será progressiva.
Pouco depois, uma figura pública, conhecida pelos seus vigorosos ataques ao capitalismo selvagem em que vivemos, fez uma declaração:
“A retenção das riquezas por um pequeno número ao lado da indigência da grande maioria, a maior consciência do seu valor por parte dos operários e a sua união cada dia mais forte […] estão a originar uma verdadeira guerra.”
E o referido alto dirigente passou a enquadrar de imediato esta medida, proposta pelo governo, nos seguintes termos:
“O operário, ao colocar ao serviço de outrem as suas forças e a sua indústria fá-lo com o intuito de angariar o necessário para viver e poder prover à sua sustentação, e assim, mediante o seu trabalho, adquire um direito sem limites, não só para exigir o seu salário, como também para usar dele como melhor entender.”
Acrescentou a seguir:
“Portanto, se o trabalhador à força de poupar parte do seu salário e para maior segurança dessas economias as emprega na compra de um terreno, torna-se evidente que esse terreno mais não é do que um salário transformado: o terreno assim adquirido pelo operário é tão seu como o salário ganho com o seu trabalho.”
Quase sem pausa, o mesmo líder começou a desferir um contundente ataque a política tributária e redistributiva da geringonça, abrindo assim uma divisão ideológica insanável entre as forças que combatem a “cobiça de uma concorrência desenfreada”:
“E é nisto que consiste precisamente, como não é difícil de ver, o direito à propriedade mobiliária e imobiliária. Assim, o empenho dos socialistas em converter a propriedade particular em propriedade coletiva mais não faz do que empiorar a situação dos operários, já que ao privá-los da liberdade de usarem a seu bel-prazer o salário, roubam-lhes a esperança e quaisquer possibilidades de aumentarem o seu património e procurarem maiores benefícios.”
Só se pode lamentar que o autor destas palavras já não consiga distinguir entre socialistas e bloquistas mas, hoje em dia, quem ainda o consegue? O autor destas declarações pode, no entanto, contar com a benevolência de todos. Tanto mais quanto o lutador pro-operário antiliberal que fez estes comentários, não só foi contundente, foi também presciente. Leão XIII (1810-1903) fê-los, há 125 anos, na Rerum Novarum.
Professor de Finanças, AESE Business School