Dois atos eleitorais em cerca de uma semana – as eleições legislativas em França e as eleições gerais no Reino Unido – tiveram resultados completamente diferentes. Mas vistas em conjunto são muito informativas relativamente às novas tendências políticas europeias.
O En Marche! e os aliados de coligação pré-eleitoral ganhou as legislativas com uma confortável maioria absoluta. Emmanuel Macron – a quem a imprensa já vai chamando “Rei Sol” – tem agora mão livre para governar, e para seguir o seu caminho da reforma da economia francesa e do fortalecimento da União Europeia. Quando ganhou as eleições presidenciais, no início de maio, a maioria dos analistas vaticinaram que isso não seria possível. O movimento que o apoiava era recente e fraco, cheio de caras desconhecidas. Mas isso não o deteve; reforçou a sua promessa de renovação quer legislativa, quer executiva.
Do outro lado do Canal da Mancha, Theresa May ganhou as eleições, mas perdeu em toda a linha nos seus objetivos políticos. A ideia não era má: os conservadores precisavam de um mandato robusto para negociar o Brexit. À senhora May faltava a legitimidade das urnas, e as sondagens indicavam que a vitória seria segura (quando a campanha começou dispunha de uma vantagem de 24 por cento relativamente ao candidato mais próximo).
Contudo, a líder do governo britânico cometeu dois erros que lhe valeram a queda abrupta: associou-se ao manifesto conservador, que irritou os britânicos devido aos anunciados cortes no sistema de apoio social, que já não é famoso na Grã-Bretanha, e cedeu à tentação da polarização populista, introduzida por Jeremy Corbyn, que partiu para as eleições como o derrotado anunciado, mas conseguiu um resultado muito além das expectativas.
Corbyn saiu da sombra da ala minoritária e mais à esquerda dos trabalhistas, afastou-se das políticas económicas do New Labour (iniciadas por Tony Blair), poliu as credenciais da social democracia e enfatizou defesa dos interesses dos trabalhadores e dos britânicos comuns contra os conservadores – o “partido dos ricos e privilegiados”. May escolheu responder da mesma moeda, num dogmatismo mais contido, mas não menos populista: apresentou-se como representante da vontade do povo, mesmo ainda sem saber se o povo a elegeria. Corbyn não ganhou as eleições, mas por pouco. E dizimou as intenções dos conservadores.
Estes dois atos eleitorais com resultados tão diferentes têm três elementos em comum. Primeiro, Macron e Corbyn são políticos atípicos no panorama europeu. Macron reinventou o conceito de “centro” (uma espécie de melhor da direita e da esquerda) e, mais importante, vestiu a pele de independente (moderado), quase sem passado político. Corbyn rasgou o manual do New Labour, e apresentou-se como um candidato social democrata, meio do sistema, meio de protesto, ao estilo de Barnie Sanders (que aliás o felicitou a seguir ao escrutínio). O seu inesperado resultado eleitoral deve-se mais ao movimento social juvenil que se gerou à sua volta do que ao apoio do seu próprio partido.
O que nos leva ao segundo ponto: Macron e Corbyn tiveram o resultado eleitoral que tiveram porque conseguiram entusiasmar a camada mais jovem dos seus países. Os eleitores dos 18 aos 24 anos mostram-se cada vez mais recetivos a estes candidatos que, de uma forma ou de outra, abanam o sistema sem o desdenhar completamente. Mais a mais, são estes mesmos jovens os maiores apoiantes da Europa (do Bremain), que premiaram Macron e castigaram May.
Finalmente, estes dois atos eleitorais com dias de diferença mostram uma nova realidade. A Europa, nos últimos anos, transformou-se. Os eleitores favorecem cada vez mais um tipo de candidatos que não pertencem bem ao sistema político tradicional, mas que também não estão completamente fora dele. Ao mesmo tempo que os partidos e ideias tradicionais vão mirrando, e os extremismos vão crescendo.
Por enquanto, o equilíbrio vai-se mantendo, e a Europa respira de alívio de ato eleitoral em ato eleitoral. Mas entrámos num impasse: se o extremismo (ainda) não compensa, os políticos tradicionais também já vão tendo dificuldades em convencer os cidadãos. E ignorar os impasses – mostra-nos a história Europeia recente – só tem trazido problemas.