A história que se segue começou há 40 anos no Egito. Ela tinha apenas 21 anos quando o marido morreu. No ventre a primeira filha. Durante semanas os irmãos procuraram encontrar-lhe um noivo que a aceitasse a ela e à bebé que aí viria. Mas Sisa Gaber Abu Douh rejeitou sempre. Até que descobriu o caminho para a independência.

Olhou-se ao espelho e rapou o cabelo. Colocou um turbante. Trocou as roupas femininas por trajes masculinos que lhe escondiam as formas e abandonou o local onde vivia e onde a podiam reconhecer. Sendo homem podia trabalhar livremente. Aceitou todo o tipo de trabalho na construção, trabalho pesado, de homem. Sempre para conseguir ganhar algum para educar a filha sem precisar de um homem, como a tradição e cultura assim ordenava.

“Eu preferi fazer trabalho pesado como levantar tijolos e sacos de cimento e engraxar sapatos do que pedir esmolas nas ruas – para ganhar um sustento para mim e para minha filha e os filhos dela”, disse à rede de TV Al-Arabiya.

Sisa carregou tijolos, sacos de cimento, engraxou sapatos. E escondeu sempre ser uma mulher.

“Quando uma mulher desiste da feminilidade é difícil. Mas eu faria qualquer coisa pela minha filha. Era a única forma de ganhar dinheiro. O que mais eu poderia fazer? Não sei ler nem escrever, minha família não me mandou para a escola, então este era único jeito”, disse Sisa ao The Guardian.

Mas houve quem não se tivesse enganado e soubesse que, atrás daquelas roupas, estava uma mulher. Ela também não escondeu. Não era um segredo, assume. Mais de 40 anos depois, e com 65 anos de idade, Sisa recebeu o prémio de Melhor Mãe do Egito pelas mãos do presidente Abdel Fattah al-Sisi. A cerimónia ocorreu domingo, dias depois do Dia da Mãe, que naquele país se assinalou na passada semana.

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Com a filha já criada, Sisa – que se tornou um ícone em Luxor – não precisa continuar a vestir-se como um homem. Mas, segundo ela, a decisão de morrer “naquelas roupas” está tomada. Ela foi a vida inteira assim.