Os dois afastaram-se da corrida presidencial face ao avanço de Marcelo Rebelo de Sousa. Mas agora, mesmo com o professor já em campo e com hipóteses de arrebatar as eleições à primeira volta – assim apontam as sondagens -, Rui Rio e Pedro Santana Lopes voltam a ser equacionados como possíveis candidatos à direita. Confuso? Nem por isso. É que PSD e CDS querem alguém em Belém que mantenha em aberto a hipótese de convocar eleições antecipadas – coisa que Marcelo parece ter afastado.

No final de outubro, em visita a Coimbra, Marcelo Rebelo de Sousa deixou clara a sua posição: o país não precisa “de governos de seis meses, oito meses ou de um ano” nem “de eleições a cada seis meses, oito meses ou a cada ano”. Duas semanas mais tarde, depois de ter reunido com os representantes da UGT, o professor veio deixar outra ideia: era preciso “esperar para ver” se um eventual Governo socialista apoiado por Bloco e PCP tinha consistência e condições de durabilidade.

Ora isso pode não ser suficiente para a direita: PSD e CDS querem eleições o mais rápido possível. Foi o próprio primeiro-ministro em funções a dar voz a esse desejo: na sexta-feira, Pedro Passos Coelho defendeu uma revisão constitucional extraordinária para permitir a dissolução da Assembleia da República e a convocação de eleições já – de acordo com a Lei Fundamental, o Parlamento não pode ser dissolvido nos primeiros seis meses da legislatura e/ou nos últimos seis do mandato do Presidente da República. Do outro lado, António Costa arrumou essa questão na gaveta: “Não podemos andar de eleições de seis em seis meses”.

Com Cavaco Silva impedido de dissolver o Parlamento e com o PS indisponível para avançar para a revisão da Constituição, sobra, para Passos e Portas, uma outra hipótese: que o próximo Presidente da República convoque eleições assim que possível, de preferência logo em abril, quando a Assembleia completa os primeiros seis meses de funcionamento. 

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E é aqui que entram Rui Rio e Santana Lopes (e cai Marcelo). O ex-presidente da Câmara do Porto – supostamente o favorito de Passos para Belém – afastou-se da corrida depois de meses de especulação, reconhecendo que, se se candidatasse, o seu avanço “seria facilmente interpretado como divisionista, senão mesmo, como desestabilizador”. No entanto, já na altura, o portuense adivinhava que no “quadro parlamentar instável” que o país vive, a sua candidatura “poderia ser a que melhores condições tinha de, no quadro do espaço ideológico moderado, conseguir garantir a indispensável estabilidade e sobriedade na política nacional”.

Ora, com Marcelo aparentemente mais disposto a jogar as suas fichas ao centro e ao centro-esquerda do que a vestir as cores de PSD e CDS, há, no centrão, quem se sinta “órfão de candidato a Belém”, como provam as duas páginas de apoio a Rui Rio criadas esta quarta-feira.

Lá, de acordo com a Visão – as duas páginas, o site e o Facebook, ainda não estão disponíveis, mas a revista já teve acesso ao seu conteúdo -, estão explicadas as razões deste movimento:

“Portugal vive momentos incertos. As eleições constituem sempre uma oportunidade de reflexão e de intervenção nos destinos do país. Da política à economia, passando pelas questões sociais, o nosso futuro coletivo exige responsabilidade, dedicação e experiência. É neste quadro de exigência que a candidatura do Dr. Rui Rio à Presidência da República faz sentido”, escrevem os apoiantes de Rio.

Na pista de fora, parece correr também Santana Lopes. O ex-presidente da Câmara de Lisboa desistiu da candidatura depois de considerar que “os deveres [que mantém] enquanto Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa” e as suas “responsabilidades profissionais” eram mais urgentes que uma candidatura a Belém.

Num artigo de opinião publicado no Jornal de Negócios, o ex-primeiro-ministro deixava várias interrogações, mas todas apontavam num único sentido: Cavaco Silva tem legitimidade para não dar posse a António Costa? “Cavaco Silva tem uma legitimidade exatamente igual à dos Presidentes que o antecederam e não é por não poder dissolver a Assembleia nos primeiros seis meses do mandato do Parlamento que deixou de ser um chefe do Estado dotado de legitimidade democrática”, respondia. “Nenhum ser humano se deve trair a si próprio, nem aos seus, e especialmente quem seja Presidente ou queira ser”.

Ora, de acordo com o Expresso, o social-democrata já foi sondado para voltar à corrida e, perante um Marcelo que não diz o que a direita quer ouvir, Santana pode estar disponível para disputar o eleitorado à direita e, no limite, obrigar o professor a ir a uma eventual segunda volta. 

No início de novembro, já havia, entre as fileiras sociais-democratas, quem estivesse descontente com Marcelo. Ao Observador, um dirigente do PSD queixou-se de que “Marcelo acha que já tem o eleitorado de direita e que agora quer é falar para os outros e conquistar a esquerda” e confessou-se “possesso” com as declarações de Marcelo – em resposta às críticas de alguns dirigentes sociais-democratas, Marcelo disse na altura que não era “candidato à liderança de um partido, nem de uma coligação, nem de uma fação”. 

Com uma parte do PSD insatisfeita com Marcelo, foi José Ribeiro e Castro, ex-líder do CDS, a verbalizar a vontade de ver a direita com outro candidato que defendesse com a clareza a convocação de eleições antecipadas. “É indispensável um tira-teimas eleitoral”, dizia o centrista em entrevista à TSF.

No acordo de coligação celebrado depois das legislativas, sociais-democratas e centristas deixaram no papel o compromisso de estudarem em conjunto o nome do candidato presidencial da direita. Marcelo nunca foi o favorito de Passos, mas Paulo Portas (e as sondagens) deram força à candidatura do professor. E se é verdade que ainda não existe um candidato apoiado pela direita, também é verdade que o calendário está-se a fechar: com as eleições marcadas para janeiro de 2016, os candidatos têm até meados de dezembro para se apresentarem às presidenciais (30 dias antes). 

Não é de estranhar, por isso, que as presidenciais tenham sido um dos temas em cima da mesa na reunião entre Passos e os líderes distritais. De acordo com o Público, entre os dirigentes distritais do PSD restam poucas dúvidas de que Marcelo vai mesmo ser o candidato apoiado pelos sociais-democratas nas presidenciais. No entanto, Passos continua sem abrir o jogo e há mesmo quem defendesse, nessa reunião, que o candidato presidencial devia ter uma posição mais clara sobre a atual situação. O mesmo jornal escreve ainda que está já agendado um Conselho Nacional do PS para dezembro para definir a posição sobre o apoio a um candidato – uma decisão que deverá ser concertada com o CDS.

No início de 2014, na moção de estratégia global apresentada aos sociais-democratas, o líder do PSD sublinhou que o partido não precisava de um “cata-vento de opiniões erráticas em função da mera mediatização gerada em torno do fenómeno político”. Na altura, Marcelo acusou o toque e afastou a candidatura a Belém. “Se o líder do partido fundamental da área diz que é indesejável” a sua candidatura, “uma pessoa de bom senso, a menos que queira fazer um exercício de vingança ou um exercício lúdico, não vai dividir o eleitorado pondo a vitória mais fácil ao candidato do outro lado”, disse o professor.

Daí para cá, muita coisa mudou e Marcelo é, até ver, o único candidato do centro-direita. Mas sociais-democratas e centristas continuam à espera que Marcelo Rebelo de Sousa diga aquilo que a direita quer ouvir: António Costa liderou um assalto ao poder e, com os acordos que desenhou com Bloco e PCP, não tem condições para ser indigitado primeiro-ministro.