Como é sabido, em política externa não há amigos, mas interesses concretos, tanto mais quando se trata de superpotências como os Estados Unidos.
Andrei Ilarionov, antigo conselheiro do Presidente russo Vladimir Putin, avança uma tese com a qual não posso deixar de concordar. Para receber o apoio da Rússia nos casos do Irão e da Síria, os EUA estão dispostos a entregar a Ucrânia a Moscovo.
O Presidente da Ucrânia, Petro Poroshenko, tinha feito a proposta de uma nova Constituição que previa a descentralização de poderes, mas sem qualquer concessão de “estatutos especiais” às chamadas repúblicas populares de Donetsk e Lugansk. Porém, agora, foi publicado o mesmo documento, mas que concede estatutos especiais aos territórios controlados por separatistas pró-russos. Esta mudança foi feita sob pressão dos Estados Unidos, na pessoa da Sra. Victoria Nuland, figura influente na política externa de Barack Obama. Hoje, 16-07-2015, ela e representantes da União Europeia estiveram presentes na sessão do Parlamento ucraniano, mas a maioria dos deputados não apoiou a decisão de Poroshenko e decidiu enviar para o Tribunal Constitucional as alterações por ele propostas.
Se às regiões separatistas pró-russas for concedido “estatuto especial”, o Kremlin ficará com uma alavanca decisiva sobre a política interna e externa do governo de Kiev. Caso este dê um passo que não agrade Moscovo, os separatistas lá estarão para o neutralizar. No fundo, deverá significar o fim da Ucrânia como Estado e a sua desagregação.
Em troca, a Rússia fez sérias cedências no dossier nuclear iraniano. Se o acordo que foi assinado em Viena for avante, Moscovo pouco irá ganhar. Pelo contrário, quando as sanções internacionais forem levantadas, o petróleo iraniano irá entrar no mercado internacional e provocar a queda do preço desse combustível (o que já está a acontecer ainda sem o fim das sanções). Ora, isto é extremamente prejudicial para a economia russa, que se mergulha numa crise cada vez maior.
Além disso, Moscovo não viu aprovada a exigência do Irão de levantamento das sanções à venda de armas num prazo de seis meses. O Kremlin terá de esperar alguns anos antes de poder vender armas a Teerão.
Quanto à Síria, Moscovo parece disposto a deixar cair o regime do Presidente Assad ou a reservar para este um papel insignificante no futuro daquele país do Médio Oriente.
Esperemos que o problema da autoria do derrube do Boeing 777 malásio não seja incluído neste “pacote de acordos” e que a sua revelação não seja mais uma vez adiada. Os Estados Unidos podem possuir dados precisos sobre os autores da tragédia e utilizá-los nos seus interesses próprios. Ou vice-versa.
Enquanto isso, a União Europeia continua afogada no “problema grego”, revelando uma incapacidade total de resolver os seus problemas internos. Pelos vistos, o problema da Grécia não será resolvido antes de uma intervenção séria dos Estados Unidos, o que constituirá mais uma vergonha para a UE.