Nota: 15

O que mais impressiona no PCP é o silêncio. Jerónimo de Sousa parece ter encarnado o espírito de Buster Keaton num filme mudo. O Governo decide acabar com os tectos salariais na administração da Caixa Geral de Depósitos e os comunistas sussurram; um secretário de Estado recebe um subsídio de alojamento apesar de ter casa na zona de Lisboa e os comunistas murmuram; o Ministério das Finanças anuncia o fim de 2500 postos de trabalho e os comunistas cochicham.

Não é negligência — é inteligência. O que o PCP perde em espalhafato vocal ganha em eficácia política. António Domingues vai ganhar muitos milhares de euros por mês na Caixa? Sim, mas o salário mínimo subiu para 530 euros. Carlos Martins recebe 360 euros por ter declarado como sua residência principal uma casa no Algarve? Sim, mas o ordenado dos funcionários públicos foi reposto. O número de trabalhadores do banco público vai encolher dramaticamente? Sim, mas os transportes de Lisboa e do Porto não foram privatizados.

Não são vitórias de fogo-de-artifício, e os comunistas sabem disso. É muito simples: depois de o salário mínimo subir, já não vai descer; depois de os rendimentos serem repostos, não serão retirados; depois de as privatizações serem adiadas, será preciso muito tempo para voltarem a ser preparadas.

Quando, nas noites eleitorais mais deprimentes, o PCP aparece a dizer que os maus resultados não são verdadeiramente importantes porque a luta política não se esgota no parlamento, muita gente acha que se trata de desculpa ou de bravata. Mas não é uma coisa nem outra. Uma vitória eleitoral dura quatro anos (quando um governo se aguenta até ao fim) ou menos (quando não se aguenta), mas a vitória numa batalha política concreta — como os salários ou a lei laboral — dura décadas. A “geringonça” existe há nove meses, mas, se caísse amanhã, os comunistas já teriam conseguido muitas coisas que, em circunstâncias normais, custariam anos de manifestações e negociações, de avanços e de recuos, de sacrifícios e cedências.

O Bloco de Esquerda, por exemplo, anda há anos (e anos, e anos…) a tentar entrar nos sindicatos. Falhou sempre clamorosamente e, por vezes, parece que os seus dirigentes não entendem porquê. É por causa disto. O PCP não levanta a voz com grandes proclamações sobre o que vai fazer. Não precisa. Quando algumas medidas são aprovadas, quem está nos sindicatos ou nas fábricas sabe como surgiram — e de onde.

Realmente, um partido não chega aos 95 anos com amadorismos.

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