Fernanda Cristino e Maria Romão têm 68 e 80 anos, residem numa aldeia do concelho de Castro Marim e aguardam que terminem as obras para levar água às suas casas, pela primeira vez nas suas vidas.

Em pleno século XXI, há meia centena de povoações serranas do concelho de Castro Marim, no Algarve, que ainda não dispõem de água domiciliária tratada e onde o abastecimento é feito através de fontanários públicos ou furos dos próprios habitantes, mas onde nos últimos anos as dificuldades de abastecimento têm sido cada vez maiores, como disseram à agência Lusa as duas moradoras da povoação de Cerro do Enho.

O presidente da Câmara, Francisco Amaral, disse à Lusa que durante muitos anos o município esperou por fundos comunitários que pudessem ajudar a suportar o custo dos trabalhos, mas agora decidiu avançar “per si” com as obras para acabar com uma “injustiça” que tornava os habitantes “de segunda”, sem acesso a água potável.

A intervenção começou neste verão e em alguns locais, como Cerro do Enho, há já casas abastecidas, mas ainda não está prevista a data de conclusão da totalidade da operação, que será gradual e para desenvolver ao longo do mandato.

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“As populações eram abastecidas de fontanários, a água não era tratada, não era potável, e a situação era deveras insustentável. Não dava para aguardar mais tempo por um hipotético financiamento comunitário”, afirmou o autarca, frisando que a autarquia vai fazer a “colocação de água domiciliária, com bombas doseadoras de cloro para tratar a água e torná-la potável”.

Francisco Amaral referiu estarem em causa “cerca de 1.000 pessoas que têm tanto ou mais direito de beber água potável do que as outras todas” e considerou que a situação atual “é quase um atentado, uma discriminação negativa” para os moradores, incluindo muitos idosos sem possibilidade de comprar água engarrafada.

“No fundo, estamos a ser justos e a fazer alguma justiça pelas nossas mãos, porque de facto estavam a ser tratados como castro-marinenses de segunda. Isto é básico, fornecer água à população é básico”, defendeu o autarca, considerando que “é quase desumano obrigar um idoso de 70 ou 80 anos ir buscar um baldinho de água a um fontanário, ainda por cima água não potável”.

Fernanda Cristino explicou à Lusa as dificuldades que tem sentido para conseguir ter água, sobretudo nos últimos anos, em que os fontanários e os furos existentes têm secado mais rápido.

“Sim, porque, pelo menos aqui, a bica não tinha água. Tínhamos que nos governar com um furo, que tenho a meias com as minhas cunhadas, mas que também está mal e tinha pouca água. E temos um depósito aí que vinha carradas de água da Câmara”, respondeu Fernanda, ao ser questionada sobre se a chegada da água potável a casa é positiva.

A moradora espera que a conclusão da obra ajude a melhorar as condições de vida, depois de anos a governar-se “mal”, sobretudo devido aos problemas de saúde sentidos numa das pernas, o que complica ainda mais o transporte de água dos fontanários até casa.

Maria Romão também disse à Lusa que a situação tem “sido difícil”, até porque muitas vezes não podia ir buscar água, já que “a idade não ajuda”.

“Mas agora já estou satisfeita, porque o senhor presidente pôs a água e estamos contentes com o trabalho que ele fez”, afirmou, frisando também que a água é um bem muito necessário.