De saída da presidência da Comissão Europeia, Durão Barroso deixou um aviso a David Cameron relativamente ao plano deste para impor um limite ao número de imigrantes da União Europeia com baixas qualificações que podem imigrar para o Reino Unido. Barroso disse na BBC que esta limitação pode ser incompatível com a legislação comunitária.

Durão Barroso referia-se à notícia avançada pelo Sunday Times que dava conta de que Cameron planeia limitar o número de registos na segurança social atribuídos a imigrantes da União Europeia pouco qualificados. “Em princípio, limitações arbitrárias parecem-me ser contraditórias com as leis comunitárias. Isto é muito claro do meu ponto de vista”. E acrescentou que a não discriminação, bem como o princípio da liberdade de circulação são muito importantes:

“A liberdade de circulação é um princípio muito importante no mercado interno: circulação de bens, capitais, serviços e pessoas. Recordo que o primeiro-ministro Cameron me pediu para assegurar a liberdade de circulação entre Gibraltar e Espanha. Os cidadãos britânicos têm liberdade para circular por toda a Europa. Só em Espanha vivem cerca de 700 mil. Por isso, o princípio da liberdade de circulação é essencial, temos de preservá-lo”.

No início de 2014, antes da abertura total das fronteiras do Reino Unido a trabalhadores romenos e búlgaros, os britânicos anunciaram uma série de alterações que restringiam a entrada de cidadãos da UE. Atualmente, os imigrantes oriundos de outros Estados-membros só podem candidatar-se ao subsídio de desemprego três meses depois de terem chegado ao país. O pagamento dessa prestação social só é feito durante seis meses e, nesse período, os imigrantes têm de provar que estão à procura de trabalho.

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Agora, o Reino Unido quer ir mais longe, impondo restrições às pessoas provenientes de outros Estados membros. Como escreve o Guardian, isto iria implicar uma revisão ao Tratado de Roma, o documento fundador da CEE, que garante a liberdade de circulação. O presidente cessante da Comissão Europeia também pôs uma questão: o que acontecerá aos cidadãos britânicos que vivem noutros países da União Europeia – entre 1,4 e 2 milhões de pessoas – se o Reino Unido impuser estas limitações? “O Reino Unido tem de oferecer aos cidadãos europeus aquilo que a União Europeia oferece aos cidadãos britânicos. É uma questão de justiça”, disse Barroso.

Referindo-se às declarações de Philip Hammond, secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros do Reino Unido, que disse esta semana que os Tories estão a “acender uma fogueira” na União Europeia ao prometerem organizar um referendo à permanência do Reino Unido em 2017. “Estamos a desencadear um processo que os políticos e os Governos não conseguirão travar e que nos vai dar uma importante arma no nosso arsenal”, disse Hammond, citado pelo Telegraph, referindo-se ao referendo como uma forma de o Reino Unido pressionar Bruxelas no sentido de maiores reformas sobre o estatuto do país na comunidade.

Barroso disse que o Reino Unido terá influência “zero” na União Europeia, caso decida sair, e lembrou que atualmente Cameron está a tentar pressionar os líderes europeus a contribuir com mil milhões de euros para a luta contra o ébola. “Qual seria a influência do primeiro-ministro britânico se o Reino Unido não pertencesse à UE? Seria zero. Dentro da UE é possível conseguir mais do que estando fora”, disse o ainda presidente da Comissão. E Durão Barroso foi mais longe, defendendo que o Reino Unido não conseguirá discutir em pé de igualdade com a China ou os EUA se estiver fora da comunidade. “O Reino Unido é um grande país com uma grande história. Mas tem 60 milhões de pessoas. Será que seria capaz de, sozinho, discutir em pé de igualdade com os EUA ou com um gigante como a China? Se o fizer no seio da UE… Temos muito mais influência”.