A primeira pergunta do jornalista francês do Canal+ a Michel Houellebecq, sobre se ele também era Charlie, foi prontamente respondida. “Sim”, disse o escritor, que no dia do atentado estava na capa do semanário que foi atacado pelos irmãos Kouachi. Muito emocionado, Houellebecq chorou ao falar do amigo Bernard Maris, um dos fundadores do Charlie Hebdo e que morreu no ataque.
“É a primeira vez na minha vida que alguém que conheço é assassinado”, disse, lembrando que ele e Bernard Maris tinham agendada uma participação conjunta no final de março, a propósito de um novo livro que o escritor e economista ia publicar.
Sobre Soumission, livro polémico sobre uma França presidida por um muçulmano e submetida à lei islâmica, Houellebecq não quis falar. O autor suspendeu mesmo a promoção do livro, que lhe valeu elogios e acusações de islamofobia. O primeiro-ministro francês Manuel Valls, por exemplo, disse que “a França não é Michel Houellebecq, não é a intolerância, o ódio e o medo”. Na entrevista, o escritor respondeu. “É o julgamento dos meus pares que me importa e não o que disse Manuel Valls”.
A entrevista de 11 minutos foi gravada a 8 de janeiro, um dia depois do ataque que fez 12 mortos, e deveria ter sido exibida pelo francês Canal+ na sexta-feira passada. Mas o canal de televisão decidiu adiar a transmissão devido ao sequestro no supermercado judeu nos arredores de Paris, que resultou em quatro mortos.
Em defesa da liberdade de expressão, Houellebecq disse que não há limites. “Não quero que me digam ‘você é livre’ e que depois me falem de responsabilidade. Não há limites à liberdade de expressão”, disse.
França submetida à lei islâmica no ano de 2022
Soumission passa-se em 2022. François Hollande cumpriu o segundo mandato como presidente da França e recandidata-se a um terceiro. Na primeira volta das eleições é derrotado pelo candidato da Frente Nacional e… por Mohammed Ben Abbes, candidato da Fraternidade Muçulmana, um partido islâmico francês (e imaginário). Para impedir a vitória da Frente Nacional, tanto os socialistas como a UMP, partido de centro-direita de Sarkozy, dão apoio à Fraternidade Muçulmana. E é assim que o muçulmano Mohamed Ben Abbes é eleito para o Eliseu, impondo a Sharia – lei islâmica – em França.
Em resposta às críticas que o acusavam mais uma vez de querer acicatar a opinião pública, Houellebecq defendeu que Soumission não é uma provocação. Não quando, na sua forma de ver a realidade, os eventos descritos são verosímeis. O autor prefere, então, falar de uma antecipação. “Eu estou a acelerar a história. Não posso dizer que o livro é uma provocação, se isso significar dizer coisas que considero falsas só para chatear as pessoas”, disse o autor numa entrevista. E sublinhou o fator de antecipação: “Neste livro condensei uma evolução que, na minha opinião, é realista”.
A editora Alfaguara já anunciou que o livro vai chegar a Portugal até junho, com o título “Submissão”.