Trocar o c de cedilha por um c sem cedilha, trocar o a com h pelo a sem h, ou sinais de pontuação fora do sítio foram alguns dos erros mais cometidos pelos 2490 professores que em dezembro realizaram a componente comum da Prova de Avaliação de Conhecimentos e Capacidades (PACC) e cujos resultados foram divulgados esta semana. A ortografia deixou nódoas em muitas das provas, mas foi nas perguntas de raciocínio lógico que os professores mais encalharam. No total, chumbaram 854 candidatos (34,3%), que ficam assim impedidos de lecionar no próximo ano.

A prova, que era composta por 32 questões de escolha múltipla e por uma pergunta de resposta aberta, que implicava a redação de um pequeno texto de opinião, destinava-se a todos aqueles que têm qualificação académica para a docência e que, por não serem dos quadros e não terem mais de cinco anos de serviço, pretendam concorrer no concurso geral de professores. Entre 2490 candidatos, 1636 passaram e 854 chumbaram.

Eis as três perguntas onde houve maior número de respostas erradas:

“O selecionador nacional convocou 17 jogadores para o próximo jogo de futebol. Destes 17 jogadores, 6 ficarão no banco como suplentes. Supondo que o selecionador pode escolher os seis suplentes sem qualquer critério que restrinja a sua escolha, poderemos afirmar:

a) que o número de grupos diferentes de jogadores suplentes é inferior ao número de grupos diferentes de jogadores efetivos;

b) superior ao número de grupos diferentes de jogadores efetivos;

c) igual ao número de grupos diferentes de jogadores efetivos;

d) não se relaciona com o número de grupos diferentes de jogadores efetivos.

A resposta certa era a c) “igual ao número de grupos diferentes de jogadores efetivos” (a qualquer grupo de jogadores efetivos corresponde um e só um grupo de jogadores suplentes: aqueles que sobram), mas 79% dos candidatos não souberam responder.

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A segunda pergunta em que os professores mais erraram (74% dos docentes falharam) implicava a leitura de um gráfico adaptado de um relatório de 2013 sobre os resultados da avaliação externa dos ensinos básico e secundário, no ano anterior, e respetiva evolução face aos resultados de 2009. Além das médias nacionais de provas e exames das diferentes disciplinas, o relatório apresenta também médias regionais indexadas à média nacional: um valor-índice igual a 100 representa uma média regional igual à média nacional; valores-índice inferiores e superiores a 100 representam, respetivamente, médias regionais inferiores e superiores à média nacional, em várias regiões.

PACC

A questão era: Em 2012, os alunos da região Oeste obtiveram uma média de 96, em valor-índice. Qual foi a média obtida por estes alunos no exame nacional de Português de 2009, em valor-índice?

a) 101

b) 0

c) 91

d)-5

A resposta certa seria 101.

 

Por último, houve uma terceira pergunta em que só menos de um terço dos docentes (29,5%) acertou. Neste caso era precedida de um texto de Douglas C. McMurtie:

“Em muitos livros, a beleza é por si só um objetivo que deve procurar algo acima da estrita adaptação
à finalidade deles. Esta afirmação implica que há alguns livros em que a beleza é um desiderato, e que
há outros em que o encanto não é fator de importância material. Quando tentamos uma classificação, a
distinção parece assentar entre uma obra útil e uma obra de arte literária. Até o tipógrafo mais animado
dificilmente podia concentrar muito entusiasmo no embelezamento de um dicionário, numa lista telefónica
ou num código de cabo submarino, embora estivesse sinceramente interessado no seu bom aspeto
tipográfico.”

Eis agora a pergunta: Com o objetivo de definir a classificação proposta no segundo parágrafo, o autor recorre ao exemplo do «tipógrafo» (linha 13) para ilustrar:

a) o primeiro termo de uma distinção.
b) o segundo termo de uma distinção.
c) os dois termos de uma distinção.
d) um termo não integrado numa distinção

A resposta certa seria a a) “o primeiro termo de uma distinção”.

A com h e c com cedilha

Outra das mais problemáticas foi a pergunta de resposta aberta. Depois de lerem um excerto de um texto de José Manuel Fernandes, publisher do Observador, sobre as vantagens e desvantagens da internet e das redes sociais, os professores tinham de escrever um pequeno texto de opinião sobre o tema – com 250 a 350 palavras.

A maior parte (40,4%) dos docentes teve entre 10 e 14,9 pontos, numa escala de zero a 20. E quase 30% dos professores deu entre um e dois erros ortográficos na redação do texto, sendo que 20%, o correspondente a 498 professores, deu cinco erros ou mais. 34,7% não apresentaram quaisquer erros na resposta. 

No que se refere à pontuação, 28,7% cometeram um ou dois erros e 16% tiveram 5 ou mais erros. A percentagem de respostas nas quais não se observam erros corresponde a 36,4%.

Presidente do IAVE e ministro criticam erros

De acordo com o Diário de Notícias, que cita o presidente do Instituto de Avaliação Educacional, Hélder de Sousa, alguns dos erros mais cometidos estavam associados a “erros cristalizados em regras básicas” de ortografia, “como a questão do a com ou sem h, ou do c com ou sem cedilha”. “São erros que se perpetuam para os alunos”, disse Hélder Amaral, que no entanto não se surpreendeu com a percentagem elevada de chumbos, por ser confrontado ao longo do ano com vários documentos enviados por docentes para o IAVE com “falhas gravíssimas, até do ponto de vista científico”.

Na terça-feira, já Nuno Crato tinha criticado a forte incidência em erros ortográficos e defendido a realização da prova para fazer uma primeira triagem das capacidades e competências dos professores que serão escolhidos para ocupar as vagas nas escolas públicas. “Temos um número de candidatos muito superior ao número de lugares. Há algo de errado em pensar do ponto de vista dos alunos e querer os melhores professores?”, questionou o ministro da Educação aos deputados na Assembleia da República.

A prova, no entanto, está longe de ser consensual e bem recebida junto de professores, sindicatos e grupos parlamentares da oposição. A FENPROF emitiu ontem um comunicado onde remete para o parecer do Conselho Consultivo do IAVE, constituído maioritariamente por associações de professores, que aponta o dedo ao exame, dizendo que carece de “validade e autenticidade” e que “não avalia aquilo que é essencial: a competência dos professores para esta função”. No Parlamento, tanto o PCP como o grupo parlamentar dos Verdes já apresentaram propostas contra a realização da PACC, que serão discutidas em plenário esta quinta-feira – e votadas na sexta.

Depois desta primeira prova de componente comum segue-se, já em fevereiro, a prova de componente específica, que incide sobre as áreas a que os professores se querem candidatar a dar aulas. Esta já só será feita pelos professores que passaram nesta primeira fase.