Está nas primeiras páginas da Constituição da República Portuguesa: “O povo exerce o poder político através do sufrágio universal, igual, direto, secreto e periódico, do referendo e das demais formas previstas na Constituição”. Nem sempre foi assim: a primeira vez que as mulheres foram às urnas em Portugal foi há 40 anos, nas eleições para a Assembleia Constituinte.

Em 1911, no entanto, uma mulher desafiou o poder político (monopolizado pelos homens na altura) e exigiu votar para a Assembleia Constituinte nas eleições de 28 de maio, conta o Centro de Documentação e Arquivo Feminista. Chamava-se Carolina Beatriz Ângelo, era ginecologista, tinha nascido na Guarda e estudado da Universidade de Lisboa. A República tinha sido implantada há menos de um ano e a lei abria essa possibilidade. Nela podia ler-se que podiam votar os “cidadãos portugueses com mais de 21 anos, que soubessem ler e escrever e fossem chefes de família”.

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Carolina Beatriz Ângelo (1878 – 1911), que havia casado com um primo republicano, estava viúva nas eleições da Assembleia Constituinte. Apresentou-se como chefe de família. Sendo também letrada, preenchia todos os requisitos para ir às urnas. O facto de ter votado em maio de 1911 mereceu cobertura jornalística um pouco por toda a Europa.

Apesar de António José de Almeida, ministro do Interior de Portugal desde a Implantação da República até setembro de 1911, ter tentado impedir Carolina Ângelo de votar, como conta o arquivo histórico da Universidade Nova de Lisboa, a médica seguiu com a sua luta política e conseguir fazer valor o seu voto: apresentou queixa no tribunal e o juiz deu-lhe razão dizendo que “é simplesmente absurdo e iníquo e em oposição com as próprias ideias da democracia e justiça proclamadas pelo partido republicano” proibir uma mulher de votar.

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No entanto, as mulheres tiveram de esperar 64 anos até voltar a exercer o direito ao voto: em 1913 o Governo reescreveu a lei de modo a limitar o direito ao voto às mulheres, segundo este documento da Biblioteca Nacional. A 3 de julho de 1913, a Lei nº 3 de Portugal dizia: “São eleitores dos cargos políticos e administrativos todos os cidadãos portugueses do sexo masculino, maiores de 21 anos, ou que completem essa idade até ao termo das operações de recenseamento, que estejam no gozo dos seus direitos civis e políticos, saibam ler e escrever português e residam no território da República Portuguesa”.

Nesta altura, já muitos movimentos sufragistas comandados por mulheres lutavam pelos direitos ao sufrágio universal em todo o mundo. Na Nova Zelândia, o primeiro país a garantir o sufrágio feminino, as mulheres já podiam votar desde 1893, graças à luta travada pela feminista Kate Sheppard, conta o portal New Zealand History.

Pouco depois surgiu o movimento sufragista britânico, que foi recentemente retratado no filme “Sufragistas”. A criação da União Nacional pelo Sufrágio Feminino em 1897 no Reino Unido, pelas mãos de Millicent Fawcett, marcou o início da luta pelo direito de voto das mulheres no país, explica o site do Parlamento do Reino Unido.

Essa luta só terminou em 1918, quando foi aprovado o “Representation of the People Act“. Mas não antes de centenas de mulheres terem sido presas, torturadas, mortas e terem entrado em greve de fome. Um dos casos mais marcantes da luta pelo sufrágio no Reino Unido foi o de Emily Wilding Davison: em 1913, a sufragista de 41 anos colocou-se à frente do cavalo do rei da Inglaterra durante o Derby, um evento social que merecia a atenção de um público muito vasto e da imprensa. Foi a primeira morte do movimento sufragista britânico.

Enquanto as mulheres se revoltavam e aderiam aos movimentos a favor do direito ao voto pelas cidadãs, outras instituições lutavam no sentido oposto. Um deles foi a “Liga Nacional para a Oposição ao Sugráfio das Mulheres“, fundado em Londres em 1910 e composto por sete homens (Lord Cromer era o presidente) e por sete mulheres. Esta instituição foi uma das responsáveis pela criação de vários produtos de propaganda que persuadia a população a não aderir aos movimentos sufragistas das mulheres.

Pode encontrar alguns desses cartazes na fotogaleria.