Havia um impasse que durava nos EUA desde fevereiro. Nesse mês morreu Antonin Scala, um dos nove juízes que pertenciam ao Supremo Tribunal de Justiça do país. Era necessário ocupar a vaga, só que as semanas iam passando. Poderiam ter passado mais, já que o Senado, órgão que é dominado por republicanos, pressionou o presidente Barack Obama, democrata, para não nomear um substituto antes de novembro — ou seja, até às eleições que levarão a votos os dois candidatos a sucedê-lo no cargo. Mas o presidente não quis esperar e aqui entra Merrick Garland.
Tem 63 anos, é casado e pai de duas filhas. Mas há muito mais para lá da informação que consta no bilhete de identidade do norte-americano nascido em Chicago, no estado de Illinois. Como a noite em que se teve de despedir à pressa da família, enquanto fazia as malas para, durante dois anos, investigar o que aconteceu em Oklahoma, a 19 de abril de 1995.
Nesse dia, dois homens detonaram explosivos perto de um edifício federal, no centro da cidade. O ataque causou a morte a 168 pessoas, feriu mais de 600 e danificou centenas de prédios e infraestruturas próximas do local. Na altura, Merrick Garland era o vice-Procurador-Geral Adjunto do Departamento de Justiça norte-americano e foi encarregue de supervisionar o caso. O processo duraria até 1997, ano em que Timothy McVeigh e Terry Nichols, responsáveis pelo ataque, foram julgados e condenados — o primeiro a pena de morte por injeção letal, o segundo a prisão perpétua.
Today, I'm proud to nominate Chief Judge Merrick Garland to the Supreme Court. No one is more qualified to serve our...
Posted by President Obama on Wednesday, 16 March 2016
Além deste caso, Merrick Garland foi responsável pelo julgamento de Ted Kaczynski, homem que ficou conhecido por Unabomber, ao ser o autor de uma série de ataques bombistas (entre 1978 e 1995) que mataram três pessoas e feriram 23. Ou seja, o juiz ocupou-se de dois dos maiores casos de ataques terroristas internos que os EUA enfrentaram no final do século XX. A forma como lidou, conduziu e aplicou as penas nestes e outros casos — Kaczynski foi condenado a uma pena de prisão perpétua — fez com que, em 1997, Garland fosse nomeado pelo então presidente, Bill Clinton, para o tribunal de apelo de Washington.
Na altura, os membros do Senado aprovaram a sua nomeação com 76 votos a favor e 23 contra. Todos os votos desfavoráveis foram de senadores republicanos. A BBC escreve que, ao longo dos anos, Merrick Garland foi assimilando uma reputação de “ser inflexível” na área da justiça criminal. “Raramente vota favoravelmente quando arguidos apelam contra as suas sentenças”, lê-se no perfil do juiz, presente no SCOTUS, um blogue dedicado aos assuntos do Supremo Tribunal de Justiça dos EUA, citado pela cadeia de televisão britânica.
Garland manteria esse cargo até 2013, quando foi “juiz-chefe” do mesmo tribunal de Washington. “A fidelidade à Constituição e à lei têm sido o pilar da minha vida profissional”, garantiu o juiz, no vídeo divulgado pela Casa Branca e partilhado por Barack Obama no Facebook. “Além de ser reconhecido como uma das mentes judiciais mais afiadas, é também alguém que traz para o seu trabalho um espírito de decência, modéstia, integridade, imparcialidade e excelência. Estas qualidades e o longo comprometimento ao serviço público valeram-lhe o respeito e admiração de líderes de ambos os lados do corredor”, analisou o presidente norte-americano, escreveu o The New York Times.
Hoje, o juiz é visto como moderado, não sendo conotado com qualquer uma das esferas da política dos EUA. Os republicanos, que compõem a maioria do Senado, porém, manifestaram-se contra a decisão de Obama nomear um membro para o Supremo Tribunal antes de abandonar a sala oval da Casa Branca. “Uma maioria no Senado decidiu atuar no seu papel de conselheiro constitucional e abster-se de apoiar qualquer nomeação [para o Supremo] durante um ano de eleição presidencial”, opinou Chuck Grassley, republicano e líder do comité judicial do Senado, citado pelo The Wall Street Journal.
Daí que a escolha de Barack Obama — é a terceira vez em quase oito anos que o presidente nomeia um juiz para o Supremo — possa não ser efetiva, porque Merrick Garland tem de ir a votos no Senado. O norte-americano apenas assumirá o cargo, que tem duração vitalícia, caso o Senado aprove a sua nomeação. E Garland, que se formou em 1977 na Faculdade de Direito da Universidade de Harvard, é o segundo juiz mais velho a ser apontado para o cargo desde a década de 70. A norma, escreve o The New York Times, é os juízes serem nomeados quando estão no início dos seus 50 anos. Garland tem 63.
Garland já havia sido duas vezes nomeado para o Supremo Tribunal, ambas as vezes foi nomeado por Obama. O juiz perderia os lugares para as juízas Sonia Sotomayor e Elena Kagan, segundo a CNN.