São as marcas de cosmética que decidem as tendências que se vão ver nos desfiles ou são as tendências que influenciam a criação dos produtos que, depois, chegam às lojas? Aqui está a questão “o ovo ou a galinha?” da maquilhagem. Com uma particularidade: grande parte das tendências nasce nas ruas e, mesmo sem o saber, somos nós, consumidores, que as ditamos.

Mas porque até ao momento em que uma modelo sobe à passerelle há muito trabalho envolvido, sentámo-nos com Maite Tuset, senior artist da MAC Ibéria — de momento em Portugal para a criação da maquilhagem do Portugal Fashion que arranca esta quarta-feira –, para falar sobre tudo o que antecede a festa. Aproveitámos o teste de imagem para o desfile de Fátima Lopes (no próximo sábado) e desbobinámos as nossas perguntas. Quem decide a maquilhagem: o maquilhador ou o criador? De quem é a visão? E de onde vem a inspiração?

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Maite Tuset e Fátima Lopes estudam a maquilhagem feita no teste. (Foto: Helena Magalhães/Observador)

“Neste momento, a informação é tão rápida que a própria maquilhagem de moda mudou e teve de se adaptar a esta nova globalidade. Agora os maquilhadores atrevem-se mais, há mais brilho, mais glitter, mais linhas geométricas. Os próprios criadores estão muito mais abertos e são cada vez mais arrojados e atrevidos porque a maquilhagem acaba por transmitir o que querem passar com as suas coleções”, diz Maite Tuset. Se antigamente havia muita tradicionalidade na maquilhagem, hoje em dia os maquilhadores, e acima de tudo os designers de moda, aceitam muito mais a pele e as características pessoais dos modelos, adaptando a sua visão à tela que têm à frente. Há uma celebração do real na moda, ao invés de uma caracterização.

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Como se decide a maquilhagem de um desfile?

Se achava que eram os maquilhadores que se sentavam de pincéis na mão e criavam a maquilhagem dos desfiles, não é bem assim. Uma maquilhagem é um diálogo entre o criador de moda e o maquilhador. Maite explica que há uma reunião prévia (como aquela a que assistimos, com Fátima Lopes) para que a equipa criativa consiga entender qual é a inspiração de cada coleção. Mas a decisão final é sempre do designer. “Por vezes eles não sabem o que querem. Têm a inspiração da coleção na cabeça mas não conseguem explicar aquilo que imaginam e, nessas alturas, cabe à equipa criativa passar a sua visão profissional sem se afastar da essência dos criadores.”

Algumas curiosidades

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  • Nas principais semanas da moda, em que cada desfile tem uma localização própria, a equipa de maquilhadores tem de estar no local cinco horas antes.
  • Nos desfiles de cada estação, são já usados os produtos que irão estar à venda nessa estação. O que vê nas fotografias já são os produtos MAC do próximo verão.
  • Em cada desfile, o senior artist (no Portugal Fashion será Maite Tuset) faz uma maquilhagem base que será depois replicada pela equipa nas restantes modelos.

Por exemplo, com a dupla Storytailors, cujo desfile abre o calendário em Lisboa, o teste de maquilhagem demorou cerca de duas horas porque foram experimentadas várias propostas até se chegar ao look final. Mas o teste de Alves Gonçalves ou de Fátima Lopes durou pouco mais de meia hora porque houve logo um acordo entre Maite e os criadores.

As tendências e o que se vende ao público

Esta é a pergunta do ovo e da galinha: quem influencia afinal de contas o que nós, consumidores, vamos depois comprar nas lojas? Maite explica que é um ciclo e que há bastantes estudos antes de se criar um único batom. Todas a coleções da MAC, por exemplo, são criadas dois anos antes de chegarem ao público. E quando chegamos a um desfile, os próprios criadores também trazem aquilo que estudaram, as tendências que seguiram, e também têm equipas criativas que se basearam nas paletas monocromáticas — ou seja, acaba por haver bastante harmonia entre a roupa e a maquilhagem porque ambas as equipas passaram muitos meses nos preparativos.

Esta estação vão usar-se os batons escuros, o que nos leva à questão: houve pressão para que, nos desfiles de inverno (realizados em fevereiro e março de 2016) se vissem lábios escuros nas passerelles das principais semanas da moda, em detrimento de outras tendências?”. Maite Tuset responde: “A MAC acaba por ser uma das principais marcas criadoras de tendências de maquilhagem e, por vezes, somos mesmo nós que trazemos estas novas ideias para os desfiles de Paris, Milão ou Londres. Mas, em geral, tal como os criadores, também nós tendemos a seguir para onde se inclinam os novos gostos e as novas modas.”

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Fátima Lopes quis seguir uma outra versão do seu desfile de Paris (que tinha linhas retas abaixo dos olhos) e por isso vai optar por linhas superiores, para dar mais força ao olhar. (Foto: Helena Magalhães/Observador)

“O povo é quem mais ordena”, já cantava Zeca Afonso. E ordena bastante na moda e na beleza. Todos nós contribuímos para inspirar e ajudamos as equipas criativas que diariamente estudam as tendências mundiais. No final de contas, aquilo que vamos comprar foi aquilo que desejámos — mesmo que não nos tenhamos apercebido. “Designers, empresas de cosméticos, as ruas, a música, a televisão, as semanas da moda, as celebridades, os novos influenciadores digitais… Todos contribuem para criar tendências. As redes sociais são cada vez mais influentes nos dias de hoje e ajudam os criadores e os maquilhadores a absorver informação para a criação de novas tendências”, conclui Maite.