Chamam-lhe a cirurgia das mulheres de meia-idade ou, de uma forma mais crua, “uma mudança de visual para a vagina”. Em 2015 foram realizadas mais de 95 mil labioplastias e mais de 50 mil vaginoplastias a nível mundial. As críticas defendem que a popularidade destas cirurgias reflete uma sociedade que escrutina até a parte mais íntima do corpo de uma mulher e que é impulsionada por uma indústria que se alimenta das inseguranças femininas, como escreve o jornal norte-americano The Dallas Morning News. Mas há um outro lado nesta história, poucas vezes abordado: estas cirurgias são a resposta a muitas condições médicas, incluindo incontinência, reconstrução após partos traumáticos e disfunções sexuais que podem afetar drasticamente a vida das mulheres.

Em Portugal, as cirurgias íntimas são realizadas há vários anos, embora, a nível estético, tenha havido uma maior incidência nos últimos seis. Quem o afirma é Francisco Ibérico Nogueira, cirurgião plástico há mais de 30 anos e fundador da clínica com o mesmo nome, com quem falámos para desmitificar o tabu.

Intervenções estéticas com efeitos psicológicos

Há muitos problemas psicológicos que não se resolvem no psicólogo. E tudo o que envolva a qualidade de vida sexual é um bom exemplo. Teresa* fez uma redução dos pequenos lábios vaginais e uma perineoplastia — cirurgia para reconstruir os músculos da vagina que podem ficar alterados após vários partos, provocando dores e o difícil desencadear do orgasmo — na Clínica Ibérico Nogueira.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Não me sentia confortável na exposição íntima e o ato sexual nem sempre era bom. Algumas das sensações que tinha eram agridoce. Sempre achei que tinha os pequenos lábios vaginais maiores que o normal e ao ter relações sexuais havia algum desconforto.”

Entre os motivos mais comuns que fazem as mulheres recorrer a cirurgias íntimas, Ibérico Nogueira destaca questões ligadas com a disfunção sexual que, na verdade, podem desencadear distúrbios psicológicos graves e, em casos extremos, levar mesmo à abstinência sexual. Mas há outros: excesso de tamanho dos pequenos ou dos grandes lábios vaginais, monte pubiano volumoso, escurecimento da zona vaginal e, por vezes, questões relacionadas com dor durante o ato sexual.

Falamos de muitas razões estéticas, é verdade, mas “estas intervenções têm efeitos sobretudo ao nível psicológico e de auto-estima que acabam por se refletir numa melhoria da vida sexual”, explica o cirurgião.

Ibérico Nogueira afirma ainda que a procura da cirurgia íntima tem sido crescente em Portugal e isso só pode significar uma diminuição dos tabus existentes. Alguns fatores populares como a depilação total, que estimula a atenção da componente estética desta zona do corpo, também têm a sua quota parte de responsabilidade na diminuição do tabu.

Depilação íntima: tirar tudo ou não, eis a questão

Segundo a Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética, o Brasil é recordista mundial em cirurgias íntimas femininas, com números a rondar as 14 mil anuais na modalidade mais popular — a cirurgia aos lábios vaginais. Este número representa um crescimento de 75 por cento relativamente aos últimos anos.

Que tipo de cirurgias íntimas existem?

  • Labioplastia: para reduzir ou redefinir os pequenos ou grandes lábios vaginais. Indicada em casos de flacidez, hipertrofia (volume excessivo) ou problemas de má-formação.
  • Perineoplastia: para reconstruir a musculatura da região, que pode ficar alterada após sucessivos partos naturais ou com a idade. Soluciona também problemas de orgasmo porque quando a vagina se encontra dilatada (por exemplo, após vários partos) a dificuldade de fricção entre o órgão sexual masculino e feminino durante o ato sexual dificulta o desencadear do orgasmo. Por regra, a perineoplastia é realizada após uma ou mais gravidezes (trabalho de parto natural) entre os 30 e os 40 anos.
  • Lipoaspiração: procedimento para eliminar o excesso de gordura na região púbica.
  • Himenoplastia da região púbica (“Monte de Vénus”): a reconstituição do hímen é um procedimento simples em que se usa um retalho extraído da mucosa vaginal da própria paciente para reconstruir o hímen.
  • Aumento dos lábios vaginais: preenchimento dos pequenos e grandes lábios vaginais com ácido hialurónico ou gordura da própria paciente.
  • Plastia de cicatriz: permite corrigir cicatrizes grossas ou largas do parto que podem desencadear dores durante a relação sexual.

É usual realizarem-se vários procedimentos em simultâneo. Por exemplo, durante uma perineoplastia podem reduzir-se os pequenos lábios ao mesmo tempo. Em mulheres mais velhas, é comum haver uma atrofia dos lábios vaginais pelo que, durante uma vaginoplastia, pode-se fazer ao mesmo tempo um preenchimento dos grandes lábios.

Caso não existam contra-indicações, estas intervenções podem ser realizadas a partir dos 17 anos, altura em que já não se irão verificar alterações anatómicas importantes. São procedimentos pouco invasivos com a duração média de 30 a 60 minutos e, regra geral, a recuperação total é em sete a 10 dias. Relações sexuais, esforços físicos e ginásio devem ser evitados durante cerca de três a quatro semanas.

Relativamente a valores, Ibérico Nogueira explica que há uma variação que depende do que se vai fazer: anestesia local ou com sedação, em tratamento cirúrgico (ex: labioplastia) ou ambulatório (ex: clareamento vaginal e preenchimento de lábios). Mas pode contar com algo entre os 400 e os 3.500 euros.

*nome fictício, esta pessoa não quis ser identificada.