O gabinete do antigo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (SEAF), Paulo Núncio, demorou mais de um ano e meio a devolver à Autoridade Tributária (AT) a resposta sobre a divulgação das transferências de verbas para paraísos fiscais. De acordo com a edição deste sábado do Diário de Notícias, Paulo Núncio demorou um mês a tomar posição sobre o assunto e, depois disso, haveria de passar um ano e meio até que se decidisse a remeter a resposta à AT.

A consequência desse período de suspensão é agora conhecida em toda a sua dimensão: entre 2011 e 2014 não foram divulgadas as transferências de dinheiro para as chamadas offshores com origem em Portugal.

O DN reconstitui as razões para esse vazio de informação durante a anterior legislatura. A 9 de novembro de 2012, Paulo Núncio recebeu um pedido de parecer da Autoridade Tributária. Nele, os serviços punham “à consideração” a divulgação dos dados relativos a transferências para paraísos fiscais feitas em 2010 e 2011. Um mês depois, a 30 de dezembro de 2012, o secretário de Estado respondia com um simples “visto”. Mas só passados 18 meses dessa assinatura (em junho de 2014) o documento sai do gabinete do secretário de Estado dos Assuntos Fiscais em direção à AT. Aquele organismo nunca teve indicações sobre o que fazer: publicar ou não as informações em causa.

Ao mesmo jornal, Núncio já tinha feito saber a sua posição quanto a esse despacho: “Essa divulgação [dos dados das transferências para offshores] não estava […] dependente de uma aprovação expressa posterior do secretário de Estado dos Assuntos Fiscais. Assim, o despacho de visto não é uma oposição à respetiva divulgação, uma vez que a AT já estava obrigada a publicar a estatística com base no despacho do meu antecessor”.

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Para o então diretor da AT, Azevedo Pereira, a indicação dada pelo ex-SEAF era insuficiente para que aquele organismo pudesse tomar uma das duas posições possíveis. Mais: o anterior responsável da AT — que na próxima quarta-feira vai estar no Parlamento para prestar esclarecimentos sobre o assunto — garante que houve três pedidos de parecer da AT sobre a publicação dos dados. Sempre sem resposta atempada.

Em causa em todo este processo estão as informações sobre remessas para paraísos fiscais feitas entre 2011 e 2014, portanto, durante a anterior legislatura. Esta semana, o jornal Público escrevia que foram transferidos 10 mil milhões de euros que não passaram pelo crivo do Fisco, porque os dossiês estavam incompletos.

Fisco não controlou saída de dez mil milhões de euros para offshores

Na edição deste sábado, o Público noticia que a informação se perdeu dentro da própria Autoridade Tributária. Os processos terão sido enviados pelos bancos — a quem compete reportar essas transferências — à Autoridade Tributária contendo toda a informação. Mas, quando já se encontravam nas mãos dos funcionários daquele organismo, ter-se-ão perdido alguns dos dados em causa.

Esse desaparecimento terá ocorrido entre a entrada dos processos na AT e o seu envio para os serviços de inspeção e estatística. É esse desaparecimento que explica, segundo o diário, a discrepância de cerca de 10 mil milhões de euros entre as verbas transferidas para paraísos fiscais que foram sujeitas a uma análise do Fisco e as que nunca passaram pelo controlo dos inspetores e dos responsáveis de estatísticas.