Continua crítico da influência alemã nas decisões europeias, contesta a obsessão pelas políticas de austeridade, realça o papel decisivo que o “seu” governo grego teve na formação de um governo de esquerda em Portugal e lamenta que Mário Centeno ainda não tenha feito qualquer diferença enquanto presidente do Eurogrupo. Pouco mudou nas críticas de Yanis Varoufakis desde que deixou de ser ministro das Finanças na Grécia, à exceção do tom com que aborda certos temas e dos alvos que tem na mira das suas críticas.
Em entrevista aos jornais Público e i (link ainda indisponível), publicadas esta quinta-feira, o político que criou e lidera o movimento pan-europeu DiEM25, começa por fazer um elogio ao ministro das Finanças português, que diz ser “um homem bom”. O problema, realça, é que “nada mudou” desde que Mário Centeno é presidente do Eurogrupo — e a culpa, aponta, é da Alemanha. “O fantasma de Wolfgang Schäuble ainda dita a política. É uma tragédia para o Eurogrupo.”
O vosso ministro das Finanças é um homem bom, mas no momento que aceitou a presidência do Eurogrupotornou-se um instrumento do Eurogrupo e não o seu contrário. [Olaf] Scholz vem do SPD [Partido Social-Democrata alemão] mas teve de jurar aliança ao programa de Schäuble. Talvez acredite nele, talvez não. Mas vai cumpri-lo.”
Varoufakis recorda mesmo um recente diferendo com Mário Centeno a propósito do crescimento económico da Grécia. O (já então) presidente do Eurogrupo, satisfeito com o crescimento grego, defendeu que a Grécia deveria “fazer mais em termos de implementação do pacote do memorando para fazer este crescimento continuar. Isto é, de um modo fascinante e preciso, errado”, conta. Para começar, porque “não há crescimento. Todos os anos na Grécia se celebra o crescimento e há estatísticas que o mostram, e depois em abril do ano seguinte surge a correção da estatística e vê-se que não houve crescimento. Não há”, destaca. Por isso, quando Centeno “celebra um crescimento que não existiu é tornar a situação ainda pior”.
Quando há um doente a ficar pior e se diz ‘oh, que bom estás a ficar melhor’, isto é má educação. Especialmente vindo de um ministro das Finanças que nunca seria ministro das Finanças se o povo da Grécia não tivesse lutado contra aquelas chamadas reformas na primavera de 2015.”
O controverso antigo ministro das Finanças do governo então liderado por Alexis Tsipras reclama mesmo uma dívida de gratidão a Portugal. “A única razão porque este Governo foi permitido foi porque a Alemanha já tinha sofrido uma perda significativa de capital político. Por isso o Governo de esquerda – ainda bem que o têm –tem uma dívida de gratidão para com aqueles que, como nós, lutámos contra as chamadas reformas que o vosso ministro das Finanças nos está a pedir para engolir.” Uma vitória de esquerda que Varoufakis justifica com a “luta” dos gregos e que, reforça, é “bom. Nós queremos colaborar – impedir nova austeridade, que foi tudo aquilo porque eu lutei, e não consegui, e a austeridade continuou, e a recessão continuou.”
Combater as políticas de austeridade com origem em Bruxelas continua a ser um dos lemas do combate político de Varoufakis que, juntamente com outros partidos, como o português Livre, se prepara para concorrer ao Parlamento Europeu no próximo ano com uma lista transnacional. E, em jeito de aviso, Varoufakis recorda que negar os problemas pode condenar a própria Europa. “Não se acredita quantos na esquerda dizem: ‘o capitalismo está em crise, deixem-no destruir-se, deixem a União Europeia destruir-se, e algo melhor virá a seguir.”‘ Não”, diz Varoufakis. “Porque a última vez que isto aconteceu foi nos anos 1930 e surgiu o nazismo. As únicas forças que estão a ganhar significativamente são os fascistas. A esquerda tem de aprender a lição”, alerta.