A ordem terá chegado por Skype: “Tragam-me a cabeça desse cão”, terá dito Saud al-Qahtani, um elemento destacado do núcleo mais próximo do príncipe herdeiro saudita Mohammed bin Salman, a um dos homens que mantinham o jornalista Jamal Khashoggi detido no consulado saudita em Istambul, Turquia, a 2 de outubro. De imediato, o grupo de 15 homens suspeitos pela morte cumpriu a ordem, segundo uma fonte árabe com relações aos serviços de informações e à família real saudita, citada pela Reuters.

Os últimos segundos de vida de Khashoggi terão sido passados numa troca de insultos entre o jornalista e o aliado do príncipe Salman. Um dos 15 homens alegadamente enviados por Riade para uma missão relâmpago na Turquia segurava um telefone com o ecrã de frente para Khashoggi. Do outro lado, numa conversação via Skype, estaria Qahtani.

Não era a primeira vez que Qahtani procurava Khashoggi e que ambos mantinham uma conversa tensa. Foi, aliás, um telefonema do aliado do príncipe saudita que levou o jornalista a perceber que estava na hora de tomar uma decisão. “Foi um telefonema muito educado em que ele me disse que tinha instruções para me proibir de continuar a escrever a minha coluna de opinião”, contou Khashoggi ao Observador em dezembro do ano passado. Foi, como o Observador assinalou na altura, o princípio do fim para aquele que era, à data, diretor do canal de televisão Al Arab.

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Os dois voltaram a comunicar no dia 2 de outubro, num tom ainda mais duro. Depois da troca mútua de insultos, terá sido dada a ordem para que os 15 suspeitos sauditas matassem o jornalista emigrado nos EUA, de acordo com uma fonte turca ligada aos serviços de informações, também citada pela mesma agência de informação. E foi então que se seguiu aquilo a que a mesma fonte se refere como uma “operação atabalhoada e informal”, não sendo claro se, durante os sete em que o corpo de Khashoggi foi desmembrado e as várias partes dividas por diferentes malas, Qahtani se manteve ao telefone para assistir a todo o processo.

O jornalista tinha entrado no consulado saudita na capital turca por volta da uma da tarde de dia 2 de outubro. Lá dentro já estavam à sua espera os 15 homens, entre os quais havia elementos destacados dos serviços de segurança e de informações com ligações diretas à coroa saudita. Tinham aterrado em Istambul duas horas antes.

Qahtani seguiu os desenvolvimentos à distância, mas acabou por tornar-se no principal bode expiatório de Riade a partir do momento em que, no último sábado, o rei enviou sinais públicos de que o conselheiro do seu filho e outros oficiais tinham sido afastados do núcleo mais próximo de Mohammed bin Salman. Foi a forma encontrada pela Arábia Saudita para aliviar a pressão internacional sobre o país, mas pode não ter passado de uma nova encenação.

À Reuters, fontes da coroa saudita admitiam que Qahtani poderia ter sido detido no cumprimento de um decreto real. Mas a conta do ex-conselheiro do príncipe herdeiro, onde Qhatani soma mais de um milhão de seguidores, continuou tão ativa como antes, o que levou gerou descrédito relativamente à tese de que se mantinha detido pelas autoridades sauditas.