Sem querer deixar-se condicionar pelo calendário imposto pelo Primeiro-Ministro, Rui Rio já decidiu que não reage este sábado e adiou para domingo à tarde, no Porto, uma declaração sobre a ameaça de crise política.

Ao que o Observador apurou junto de fonte da direção do partido, o líder do PSD passou as últimas horas a ouvir pessoas que lhe são próximas dentro do partido e também outras personalidades fora do PSD. Certo é que Rio quer mostrar que controla o calendário e que não anda a reboque da agenda definida por Costa. Isso mesmo foi, aliás, transmitido aos jornalistas por Paulo Rangel no evento onde Rio era suposto estar, mas cancelou à última hora.

O líder do PSD mantém-se em silêncio desde sexta-feira de manhã, altura em que acusou Costa de estar a fazer um “golpe de teatro” sem consequências. Desde então só Rangel agora e Margarida Mano, deputada do PSD na comissão parlamentar de Educação e Ciência, falaram. Mano disse que Costa “mentiu deliberadamente” quanto ao conteúdo da proposta, mas num debate este sábado à tarde na RTP3 recusou esclarecer se o partido admitia introduzir alterações na sua posição quando o diploma for a votação final global.

Aos mais próximos, o líder do PSD tem dado a entender que não quer ir atrás do “carnaval que foi montado” e tem insistido que a crise institucional aberta por Costa é “artificial”. Este sábado, Rio tinha na sua agenda oficial uma visita ao evento Youth4Europe, na Escola Secundária de Rio Tinto, agendada precisamente para as 17h. A comunicação social iria estava presente e esperava-se que o líder social-democrata fosse falar já hoje sobre a atual e conturbada situação política do país. Porém, por volta das 16h o Partido Social Democrata enviou um comunicado à comunicação social que dava conta do cancelamento da agenda política de Rio para este sábado, colocando assim em stand by a declaração de Rio em reação ao anúncio feito na sexta-feira à tarde por António Costa.

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Acabou por ser o candidato do partido às europeias, Paulo Rangel, a falar em nome do partido para dizer que acha “grave que o Primeiro-Ministro tenha criado uma crise artificial no país”, sobretudo porque há, continuou Rangel, “um duplo padrão”.

O eurodeputado recordou que quando foi o caso dos incêndios de Pedrogão, António Costa “não ligou e até foi de férias”, e que no caso de Tancos, “não deu importância”. Acusa o Primeiro-Ministro de andar a ver demasiadas séries de ficção, nomeadamente “Borgen”, ou “House of Cards” (conhecidas pela intensidade da crise política), e que “quando se brinca com assuntos sérios, é preciso que as reações sejam dadas no tempo certo”.

Rangel justificava assim a demora numa reação de Rui Rio, dizendo que “a Direção Nacional do Partido no momento oportuno falará” e que “não vai andar atrás do calendário político que o Primeiro-Ministro estabeleceu para si mesmo”.

Na manhã deste sábado Rio esteve reunido com a comissão política do PSD para discutir a ameaça de crise política desencadeada pela comunicação feita por António Costa. Depois disso tinha agenda pública e era nessa altura que se esperava uma posição do partido.

Assunção Cristas escreve aos militantes e acusa Governo de vitimização

A líder do CDS, Assunção Cristas, afirmou este sábado que o primeiro-ministro quer “retirar dividendos” da crise política, referindo que a reposição do tempo de serviço dos professores tem de “ter em conta vários critérios” como o crescimento económico.

[O primeiro-ministro] Entendeu que o servia do ponto de vista eleitoral criar uma crise política e estará a procurar retirar dividendos desta crise. Isto não desfoca o CDS de se opor a um primeiro-ministro que gosta de ser muito habilidoso, mas não é certamente um estadista, porque se fosse não criava uma crise política do nada”, afirmou Assunção Cristas em declarações aos jornalistas.

A centrista reforçou que o seu partido votou pela reposição integral do tempo de serviço dos professores, mas dentro de determinados critérios: “O CDS não aceita que haja funcionários tratados de uma forma e outros de outra, que era o caso das carreiras especiais onde estão incluídos os professores. Mas votou também que a reposição tinha de ter em conta vários critérios, à cabeça o crescimento económico”, disse a líder partidária.

Caso esses critérios não estejam reunidos, Assunção Cristas admite recuar. “[Sem crescimento económico] O CDS vai certamente recolocar a questão das nossas condições, como é evidente, porque uma coisa não vale sem a outra. O que ficou aprovado como mínimo denominador comum é um mandato para negociar, que tem de ser concretizado”, adicionou.

Ainda no arranque deste fim de semana, a líder do CDS-PP viu-se obrigada a escrever uma carta aos militantes na sequência do cenário de demissão apresentado pelo Governo na passada sexta-feira. No respetivo documento, ao qual o Observador teve acesso, constam explicações sobre a posição que o partido tomou face ao descongelamento de carreiras dos professores. A carta foi enviada por email e nela Assunção Cristas denuncia as”mentiras que correm”:

É verdade que o CDS aprovou o pagamento aos professores? É mentira. O CDS chumbou as propostas do Bloco e do PCP da garantia do pagamento dos 9 anos 4 meses e 18 dias, nos próximos anos”, lê-se no email citado.

No mesmo texto, a líder do CDS-PP procura esclarecer que a votação de quinta-feira não traz encargos para o atual Orçamento do Estado: “Não resulta de ontem nenhum encargo além do que este Governo já aprovou. Uma coisa é o tempo do congelamento, outra, diferente, é o pagamento”. Nesse mesmo registo, Assunção Cristas assegura que é “mentira” que o partido tenha sido irresponsável — “Não pode agora acusar de irresponsabilidade quem durante um ano e meio escondeu, de todos, os custos da sua própria política” —  e referiu que pediu ao Governo os números alusivos ao impacto financeiro da medida. “Só agora o Governo diz que são 800 milhões de euros sem explicar como.”

Assunção Cristas questiona-se ainda, no mesmo email, sobre se António Costa estará a dizer a verdade: “Depois de quatro anos deste Governo, depois das promessas quebradas, das de um ministro das Finanças que diz uma coisa em Portugal e outra em Bruxelas, acha que esta farsa, desmentida por todos os outros partidos, ainda é credível?”.

Mas Assunção Cristas não se ficou pela carta já citada e noPodcast da Assunção”, que é disponibilizado no Youtube todos os sábados de manhã, procurou “deixar alguns pontos bem claros” tendo em conta a questão dos professores que colocou o país à beira de uma crise política. No postcast referiu-se a um “assunto complexo, tecnicamente muito exigente e que, por isso, também se presta a muita confusão e desinformação”, e acusou o Governo de se vitimizar.

“O que foi aprovado não acrescenta um cêntimo que seja ao Orçamento de Estado”, continuou. “Nós não compreendemos a posição em que o Governo se colocou, de se vitimizar, de criar aqui quase que um golpe, de dizer que há uma interferência na governação, quando não há nenhuma interferência do parlamento da governação.” Cristas acusou o Governo de criar dúvidas e de acusar os partidos, incluindo o CDS, de “irresponsabilidade” e garante que “isso não corresponde à realidade.”

Augusto Santos Silva acusa partidos de “fintarem a lei”

Em declarações aos jornalistas, na tarde de sábado, o ministro dos Negócios Estrangeiros acusou os partidos de fintarem “a norma que impede que a Assembleia da República aprove medidas de despesas adicionais depois de aprovar o próprio do Orçamento”.

Os partidos políticos que aprovaram a proposta na Comissão Parlamentar dizem que é no Orçamento de 2020 — se não for no de 2019 será no de 2020 — que esse pagamento se fará. Mas far-se-á com efeitos retroativos a 1 de janeiro de 2019 e, portanto, é uma maneira de fintar a lei que não fica bem aos partidos políticos, continuou.

A “finta vergonhosa de gato escondido com rabo de fora”, como ilustrou Augusto Santos Silva, vai em contra as condições do país e poder-se-á reproduzir em “aumento de impostos”, em “sacrifícios do investimento público” ou “no aumento de salários para os trabalhadores na administração pública”. “Como o Governo sabe isso e não está disponível para abdicar da sua política económica de crescimento de emprego e de consolidação orçamental, diz com clareza que se a Assembleia da República aprovar uma tal proposta que se demitirá.

Artigo atualizado às 18h36 de sábado, 4 de maio