Mário Centeno voltou à arena, desta vez no comício do PS em Setúbal, e voltou a fazer um número dirigido ao PSD. António Costa viria depois para carregar num apelo ao voto cada vez mais dramático. Mas a abertura do comício que começou com um minuto de silêncio por Freitas do Amaral ficou para o seu ministro que se dirigiu mesmo à câmara no fundo da Praça do Bocage para falar diretamente para Rui Rio: “Onde é que é a câmara? Olá Dr. Rui Rio, muito boa noite“.

Centeno olhava direto para a objetiva da câmara lá atrás, que transmitia o comício, e enviou uma mensagem ao adversário social-democrata. “Eu sei que está sempre muito atento ao que eu digo, estou agora também a falar para si. A sua magia não é nada de especial, funciona, na verdade, como aqueles comerciantes, com poucos escrúpulos que aumentam o preço antes da época dos saldos. A isso os portugueses chamam aldrabice“.

O recado estava dado, mas o candidato do PS por Lisboa e atual ministro das Finanças não estava satisfeito e prosseguiu a atuação que tinha preparada para chegar à imagem de Rio a vender “o mesmo carro velho, mas agora sem o motor e com um a pintura novinha em folha”.

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Na luta  de Centenos que começou no último frente-a-frente entre Costa e Rio, tem sido o ministro que tem respondido ao líder do PSD. Esta semana fez uma conferência de imprensa na sede do PS para explicar o cenário macroeconómico do PSD e recusar debater com Joaquim Sarmento, o porta-voz de Rio para a área das Finanças, por este não ser candidato nestas legislativas. Agora volta a carregar nessa luta, com o discurso de Setúbal onde acusou o social-democrata de prever uma “receita fiscal totalmente inventada” e depois dizer que “vai baixar” impostos. “Mas vai baixar o quê? A receita de impostos que inventou. Elimina o que não existe, uma pura ilusão”, argumentou Centeno que alertou ainda para “as letras pequeninas do prospeto de Rio: aumento de IRS para as famílias mais pobres e mais IRC para 300 mil pequenas e médias empresas”.

Costa desvia rota de Sócrates e Tancos com furacão dos Açores

Rio, disse ainda sem travar na série de ataques, “tentou um truque baratucho que normalmente acaba em liquidação total”. Esta é uma acusação que tem atravessado muitos dos discursos que sobem ao púlpito dos comício do PS nesta campanha: a diabolização de um novo Governo de direita. Se o ataque do comício da abertura oficial da campanha do PS, em Lisboa, já foi duro, neste penúltimo comício de campanha ainda agravou. Centeno acusou Rio além do cenário macroeconómico e apontou mesmo a sua falta de gosto em ser deputado, para logo a seguir voltar à sua praia e dizer que o social-democrata “começou com o cenário do Conselho de Finanças Públicas mas acabou com o cenário do professor Pardal. Uma invenção sem nexo nenhum”.

Uma bicada à esquerda que ficou enterrada na rajada a Rio

E quando arrancou a intervenção, Centeno até parecia mais apostado num ataque à “irresponsabilidade” — assim lhe chama o PS — dos parceiros de esquerda. Disse “que também não é solução entregar o país a quem quer pôr em causa a sua credibilidade, propondo sair do euro e não pagar a dívida pública” e muito diretamente dirigiu o ataque, não fosse alguém não ter percebido de quem estava a falar: “É isto que defendem Bloco e PCP”.

Mas este reparo acabou afundado em tudo o resto que disse sobre Rui Rio, ainda que tenha concluindo juntando todos na mesma mesa: “Da esquerda à direita todos se deliciam com o banquete pago com o resultado das contas certas de António Costa”.

Antes de entrar Centeno, o teatral, tinha passado pelo palco Centeno, o poeta das rimas fáceis, como “no dia 6 de outubro, a escolha que Portugal merece é o voto no PS”. Ou ainda Centeno, o filósofo, que dita que “eles não sabem nem sonham que é a confiança com estabilidade que comanda a vida”.

Depois foi atirar à direita e deixar o palco para Ana Catarina Mendes que falou no antigo “diabo” do PSD. “Onde está Passos Coelho?”, perguntou. “Não está, por uma razão. Porque não é um homem de palavra. Disse aos portugueses que se os resultados da nossa governação fossem positivos, votaria no Partido Socialista. Por isso, se for um homem de palavra, votará no PS”. A secretária-geral adjunta do PS e cabeça de lista do partido nas legislativas falava de uma declaração do ex-líder do PSD, em 2016, sobre a estratégia do PS.

Quanto a Rui Rio, disse que “o que está a dizer aos portugueses é uma mentira, um embuste porque o que quer é voltar à austeridade”. Como medida mais “emblemática” do Governo colocou o passe único, que foi também referida por Pedro Marques, o eurodeputado do PS que voltou esta quinta-feira aos comícios socialistas, depois das Europeias que disputou como cabeça de lista do partido.

Costa carrega nas tintas: ou ele “no horizonte de uma legislatura” ou o caos

Para Costa ficou a intervenção final e voltou a carregar nas tintas sobre o day after. “Não se queiram deitar domingo com a tranquilidade de que vão continuar a ter esperança e confiança no dia seguinte. E acordem na segunda-feira com uma enorme desilusão, uma enorme angústia” sobre o futuro, disse repetindo uma ideia do discurso de Aveiro, há dois dias.

Garante que não ouve só os que lhe agradecem, até porque não quer um “voto de gratidão, mas um voto que dê força para poder cumprir e fazer ainda mais e melhor, com mais quatro anos de estabilidade política com um Governo do PS”. E depois desse “horizonte da legislatura” — uma expressão muito parecida com aquela que foi a única que o PCP aceitou colocar na posição conjunta assinada com o PS para garantir a estabilidade do Governo PS — Costa quer voltar para “estar aqui da mesma forma (…) de cabeça erguida. E poder dizer a todos que cumpri e é por isso que tenho coragem para estar aqui [hoje] a pedir mais confiança para mais quatro anos de governação”. Mas até lá, o caminho é longo, por isso deixa um apelo direto já a quem vai votar no próximo dia 6:

Quem quer um governo de que eu seja primeiro-ministro tem mesmo de votar no PS no próximo domingo para termos um horizonte da próxima legislatura”.

Reclama que o seu caminho já é conhecido — “já sabem como é, são estes quatro anos podendo fazer agora mais e melhor” –, mas para isso a escolha “tem de ser clara: ou um Governo com o PS ou um Governo sem o PS”. Costa apela a que não o deixem numa posição em que não lidere de forma clara a próxima solução governativa, sobretudo agora que as sondagens não estão de feição e o dia do tudo ou nada está logo ali ao virar dos próximos dois dias.