Manuel Pinho já saiu das instalações do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), em Lisboa, após ser interrogado por mais de seis horas. Quatro anos depois de ter sido constituído arguido pela Polícia Judiciária nos autos do caso EDP, o ex-ministro da Economia de José Sócrates foi interrogado pela primeira vez pelo Ministério Público (MP), mas, segundo o advogado Ricardo Sá Fernandes, a audição não ficou fechada por um lado pela “falta de tempo” e por outro porque a defesa ainda terá de analisar “alguns elementos” que tinha solicitado “há dois anos” e que “só agora foram facultados”.

Questionado pelos jornalista à saída do DCIAP, Manuel Pinho disse que esteve “quatro anos sem saber de que era que suspeito” e sem saber “quais os factos que estavam a ser apurados” num processo “que começou em 2012” e que teve um grande “efeito” na sua vida. “É um caso em que se vai apurar e estou de consciência tranquila”, assegura.

Pinho é suspeito dos crimes de crimes de corrupção passiva para ato ilícito, prevaricação, participação económica em negócio e branqueamento de capitais, sendo que os procuradores Carlos Casimiro e Hugo Neto já indiciaram Pinho por alegadamente ter recebido ‘luvas’ de 4,5 milhões de euros para favorecer a EDP e o Grupo Espírito Santo (GES).

As alegadas ‘luvas’ repartem-se por 3,9 milhões de euros do GES e 620 mil euros da EDP que terão sido recebidas entre 2005 e 2014. Só no caso da EDP, a elétrica terá sido beneficiada em 1,2 mil milhões de euros através de supostas alterações legislativas nos contratos de fornecimento de eletricidade promovidas por Pinho.

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“Manuel Pinho terá causado um prejuízo de 1,2 mil milhões de euros aos portugueses”

O valor do benefício da EDP é, no entender dos procuradores Carlos Casimiro e Hugo Neto, o correspondente ao alegado “produto do crime”, sendo igualmente esse valor (1,2 mil milhões de euros) o valor do alegado “prejuízo” que “o arguido Manuel Pinho (…) terá causado aos cidadãos residentes em Portugal (…), bem como uma distorção da concorrência, nomeadamente ao criar as condições para a EDP manipular as ofertas dos serviços de sistema entre 2009 e 2013”, lê-se no despacho indiciação de Manuel Pinho revelado pelo Observador em 2019, após consulta dos autos do caso EDP.

Questionado pelos jornalistas à entrada do DCIAP, Manuel Pinho disse na altura querer “esclarecer todas as dúvidas” e sublinhou que se tratou de uma “história “construída”, em que o ex-ministro “teria feito um acordo com o chamado compadre, Dr. António Mexia, no sentido de apoiar a sua nomeação e em troca disso teria benefícios próprios para dar aulas ao estrangeiro”.

Estas acusações “não fazem qualquer sentido”, assegura Manuel Pinho, afirmando que a PJ anexou “uma série de coisas que não tem nada a ver” com o processo. “É evidente que esperar para me ouvirem e andarem a investigar há nove anos assuntos que se passaram há 15 anos não é uma coisa própria de uma democracia”, atirou.

As três tentativas anteriores para ouvir Pinho

Manuel Pinho foi formalmente constituído arguido a 3 de julho de 2017 na Polícia Judiciária, tendo então sido imputada a alegada prática dos crimes de corrupção, fraude fiscal e branqueamento de capitais. Contudo, e por vontade dos procuradores titulares da investigação, Pinho não foi confrontado com os factos que o MP lhe imputava. Por isso mesmo, o interrogatório não se concretizou — contra a vontade de Pinho, alegou então o seu advogado Ricardo Sá Fernandes.

Sá Fernandes recorreu para o juiz Ivo Rosa, titular dos autos no Tribunal Central de Instrução Criminal, e conseguiu anular a constituição de arguido por a PJ não ter confrontado o seu cliente com todos os indícios reunidos pela investigação. Uma decisão de Ivo Rosa que veio a ser revertida pelo Tribunal da Relação de Lisboa a 27 de junho de 2019.

Casa de Manuel Pinho em Nova Iorque custou cerca de 1 milhão de euros

A segunda tentativa, a 16 de julho de 2018, também não se concretizou, mas devido a um incidente de recusa dos procuradores interposto por Sá Fernandes junto do diretor do DCIAP, então o procurador-geral adjunto Amadeu Guerra.

Já a terceira tentativa, a 10 de setembro de 2019, foi impedida devido a um novo incidente processual levantando pela defesa de Manuel Pinho. Em causa, estava uma alegada irregularidade devido a um requerimento de outro arguido que impediu o interrogatório do ex-ministro da Economia de José Sócrates.