Sempre num inglês perfeito que quem não conhecesse consideraria ser a sua língua nativa, ou não tivesse passado pela universidade americana de Clemson, na Carolina do Sul, para tirar o curso de engenharia biomédica, Patrícia Mamona foi a primeira presença esta tarde no Sportstrade da Web Summit capaz de motivar aplausos entre cada intervenção. Os temas foram variados, da necessidade de cuidar do corpo da mesma forma como se cuida a mente à forma como os Jogos de Londres em 2012 serviram de lição para a final no Rio de Janeiro em 2016 e para a medalha de prata este ano em Tóquio, mas existe cada vez mais um reconhecimento nacional extra futebol pelos melhores dos melhores. E é aí que se encontra a atleta.

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Numa fase ainda de pré-temporada, depois de um ano com muitos altos como a vitória nos Europeus de Pista Coberta depois de ter estado dez dias de cama na antecâmara da competição por ter contraído Covid-19 ou o pódio nos Jogos, Patrícia Mamona admite que já pensa no próximo ciclo olímpico em Paris-2024 mas tem antes mais um desafio para quebrar, que passa pela conquista da primeira medalha em Mundiais. E a disponibilidade para explicar essas metas foi a de sempre, com um pedido à organização para que pudesse antes falar aos jornalistas presentes à margem do plantel onde participou no evento.

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“Foi um momento muito importante para divulgar o nosso desporto, no meu caso específico o atletismo, e porque também conseguimos ter ligação com outras coisas que podem ser importantes para fazer conexões de negócios ou das nossas vidas pessoais por exemplo. Por isso achei uma oportunidade engraçada para poder partilhar um pouco a minha experiência, pelo menos como atleta. Ligação corpo e mente? Sem dúvida, acho que é isso que faz um ser humano melhor, trabalhar o corpo tanto como a mente. Sei que uma das coisas que melhorei muito foi a minha parte mental, conseguir conciliar isso com o meu estado de forma. Resultou para mim e foi isso que aconteceu em Tóquio. Tenho agora três anos para preparar Paris e estou super motivada porque o que fiz não chega, quero sempre mais e melhor, mas tenho este ano [de 2022] os Mundiais, uma competição importante porque nunca consegui nenhuma medalha, só um quarto lugar. Tenho estado a trabalhar bem para esse momento”, começou por destacar.

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“Assim que saí de Tóquio-2020 já estava a preparar Paris-2024 e estes momentos intercalares com os Mundiais e os Europeus também fazem parte dessa preparação. Tenho de pensar no mais importante no momento, que é criar uma boa base na pré-temporada, para mostrar depois nas competições que estou em forma e competir ao mais alto nível. Paris faz-se assim, vamos construindo aos bocadinhos para no dia x, à hora certa, estar no pico de forma. Já estou no triplo salto há muito tempo, já consegui uma medalha olímpica mas tenho de esquecer o que fiz no passado. É importante mas no futuro tenho de fazer mais e melhor”, frisou, recordando uma outra barreira que teve de superar que foi a operação em 2017: “Não sabia se ia voltar à forma normal, porque era joelho, mas às vezes isso deixa-nos mais robustos”.

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“Não sei quanto posso valer a nível de marca em 2022, de futuro não percebo nada, mas o que sei é que no presente vou dar o meu melhor para fazer acima do que tenho, que é 15,01 metros. Sei o trabalho que foi para chegar lá, sei o trabalho que será para superar isso. A minha experiência é que a seguir ao Rio, onde fiz 14,65 que era recorde pessoal [e nacional], demorei cinco anos para melhorar um centímetro. Não consigo prometer o que vou saltar mas prometo que vou dar tudo para saltar o melhor possível. Com uma medalha nos Jogos sonho com uma medalha do Mundial mas sei que as minhas adversárias são fortes e que aquelas que não bateram recorde nos Jogos podem bater agora. Tenho de pensar apenas em mim, em saltar muito alto”, concluiu a atleta de 32 anos que superou a barreira dos 15 metros em Tóquio.

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Fernando Pimenta ocupou o palco com Patrícia Mamona e partilhou também, neste caso em português, o que foi necessário para se readaptar ao adiamento dos Jogos por um ano até conseguir aquela que foi já a segunda medalha olímpica, primeira em K1 onde seria pouco tempo depois campeão mundial pela segunda vez na carreira. O canoísta de 32 anos recordou que em 2020 tinha como objetivo ser pai e fazer um pódio em Tóquio, que a segunda ficou apenas adiada por um ano e que, hoje como ontem ou amanhã, continua a levantar-se todos os dias para ir treinar a pensar em ser campeão europeu, mundial e olímpico. A seguir, fez um compasso de espera e esteve também à conversa com os jornalistas antes de voltar a Ponte de Lima.

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“Vou ser o mais sincero: houve sempre abertura da minha parte e por parte do meu treinador para poder fazer uma embarcação que não o K1. Neste ciclo optou-se pelo K1 e pelo K4, no meu caso do K1 acho que foi uma aposta ganha, conseguimos sempre medalhas. Para este novo ciclo ainda não nos sentámos para pensar na estratégia, espero que nos próximos tempos nos sentemos todos para definir essa estratégia de um barco de equipa porque é uma mais valia ter um Fernando Pimenta numa barco de equipa pelas minhas características e pela experiência que fui ganhando no K1. O K1 será sempre um dos grandes objetivos mas quando me sentar num barco de equipa o objetivo é lutar pelo pódio e medalhas de ouro, é o que posso levar para lá, a ambição e a garra”, começou por contar sobre as perspetivas para 2024.

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“Este ano temos um ano preenchido, com Taças do Mundo, com o Campeonato da Europa que vai ser em Munique e um bocado diferente por ter várias modalidades, e depois dois Campeonatos do Mundo: um, o de velocidade, onde sou o detentor do título em K1 1.000 metros no início de agosto no Canadá, e outro, o de maratonas, que tenho em mente porque vai ser em Portugal e em Ponte de Lima, no final do mês de setembro. Estou preparado para sofrer, para abdicar do que for preciso mas ser campeão mundial em Ponte de Lima, na minha terra. Deve ser a primeira e última oportunidade para ser campeão em Ponte de Lima, tal como fiz em 2018 quando o Mundial de velocidade foi em Montemor-o-Velho”, salientou.

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Em paralelo, Pimenta falou também do que poderia significar uma terceira medalha olímpica, recordando um palmarés com mais de 100 títulos internacionais que ainda assim nem sempre parece reconhecido como deveria ser. “É assim, quatro títulos de campeão do Mundo, sete de campeão da Europa, 15 medalhas de ouro nas Taças do Mundo, as quatro pratas nos Jogos Europeus, mais as duas olímpicas… Não sei se não são já suficientes, se calhar já suficiente para ser um dos melhores de sempre mas para mim não chega, quero sempre mais. Se puder ganhar três ou quatro medalhas nos Jogos, é para isso que vou trabalhar. Sei que perdi duas medalhas em Jogos, em 2016 no K1 e agora em Tóquio se fizesse uma tripulação, poderia estar na luta por uma medalha. Não aconteceu mas tenho de continuar a trabalhar para o que me falta: uma medalha de ouro em Jogos Europeus e uma medalha de ouro nos Jogos Olímpicos”, assumiu.

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“O grande objetivo para Paris é esse mas se terminar o ciclo olímpico com outras conquistas, se acabar de consciência tranquila de que dei o meu melhor e que mais não podia e fui só ultrapassado porque os meus adversários foram melhores… O meu objetivo é fazer o que não foi feito, na minha modalidade nunca houve um campeão olímpico nem um ouro nos Jogos Europeus. Se alguma coisa mudou? Não, só o tempo de férias, deu para passar mais tempo com a minha filha, para trocar umas fraldas, para lhe dar de comer… Ser pai é a dois, quero estar presente sempre que consiga, é ser pai. De resto nada mudou, espero que em termos desportivos cada vez mais as modalidades tenham outra visibilidade e outro tipo de apoio porque o que me tenho vindo a aperceber é que países que se calhar em termos financeiros até estão mais abaixo do que nós mas que dão outro tipo de condições aos atletas. Temos de mudar algumas coisas”, culminou.