É a terceira mulher na presidência do Parlamento Europeu, mas alguns colegas não consideram que Roberta Metsola defende convenientemente os direitos reprodutivos. A maltesa conseguiu uma maioria de votos nesta terça-feira, dia em que completa 43 anos, e vai substituir David Sassoli, que morreu a 11 de janeiro, mas não fica isenta de críticas.

Roberta Metsola eleita nova presidente do Parlamento Europeu: “Temos de lutar contra a narrativa anti-europeia”

Antes da votação, um coro de eurodeputados socialistas expressou preocupação com as suas posições conservadoras sobre a interrupção voluntária da gravidez, dizendo que estavam “desfasadas da direção política” da União Europeia, recorda o jornal Politico.

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Em Malta, um país predominantemente católico, o aborto é totalmente ilegal — é, aliás, o único país da União Europeia onde é assim. A política é amplamente apoiada pela população.

Em Bruxelas, Metsola opôs-se a várias resoluções que apelavam a que as mulheres tivessem acesso a abortos seguros e que condenavam leis que restringiam esses serviços. Em 2015, juntamente com outros eurodeputados malteses, emitiu um comunicado afirmando ser “categoricamente contra o aborto”.

Em julho de 2021 voltou a defender esta posição ao votar contra um relatório que definia o aborto como um direito humano. “Sem a aprovação no nosso parlamento nacional, as instituições da União Europeia não podem impor nenhuma legislação a Malta nessa matéria”, explicou na altura ao portal Lovin Malta.

Os comentários causaram indignação entre muitos eurodeputados de centro-esquerda, com trabalho feito na preservação do direito ao aborto na Europa.

“Apesar de vários Estados membros da União Europeia estarem a colocar os nossos valores fundamentais em causa, qualquer candidato à presidência do Parlamento não pode deixar margem para dúvidas em relação às suas posições sobre os direitos das mulheres e os direitos humanos”, disse Evelyn Regner, eurodeputada austríaca, que presidente à Comissão dos Direitos das Mulheres e da Igualdade de Género.

Regner chegou mesmo a acrescentar que o histórico de votações de Metsola sobre o aborto “vai contra a clara maioria dos membros do Parlamento Europeu”.

Não recuando nas suas convicções, Metsola tentou deixar garantias: afirmou que o seu “dever vai ser representar as posições do Parlamento”, incluindo sobre direitos sexuais e reprodutivos.

Houve ainda outra polémica, mais localizada. Em 2020, Metsola propôs alterações a uma resolução sobre a Bulgária, insistindo que o documento indicasse que os protestos nesse país estavam a ser financiamentos por um magnata do jogo, acusado de 18 crimes. Depois de ser contactada por centenas de manifestantes, através de redes sociais, e de ter sido ameaçada com uma ação judicial por difamação, Metsola retirou a proposta de revisão da resolução.

Elogios em questões migratórias

Mas não foram só críticas: para lá da questão do aborto, Metsola é, regra geral, respeitada pelos colegas, tendo ganhado mais notoriedade durante as semanas em que substituiu David Sassoli, obrigado a ausentar-se por motivos de saúde.

Alguns eurodeputados elogiam os seus esforços em torno das questões migratórias. Em 2016, por exemplo, durante a crise na Síria, Metsola escreveu um relatório em que apelava à União Europeia para que adotasse uma “abordagem holística” para lidar com o problema, ainda que o bloco não tenha sido bem sucedido a conseguir um consenso sobre o processamento e realojamento de migrantes.

Juan Fernando López Aguilar, eurodeputado socialista espanhol, diz que Metsola merece crédito nesta questão: “Lembro-me dessa resolução e da chamada abordagem ‘holística’ porque se tornou uma espécie de mantra sempre que insistimos que precisamos de uma abordagem mais abrangente e global nas políticas migratórias. A Roberta é eloquente, experiente e tem tudo o que é preciso para este cargo.”

Metsola participou também nos trabalhos do Parlamento para a expansão da Frontex, a Agência Europeia de Proteção de Fronteiras, e na investigação à agência, quando foi acusada de rejeitar migrantes nas fronteiras da UE.

“Sempre tivemos uma relação de trabalho muito boa”, disse Daniel Freund, eurodeputado alemão dos Verdes, que também esteve envolvido na investigação a Frontex.

Esperança e entusiasmo

Apesar das polémicas, há muito que o nome de Metsola era apontado como o mais provável na substituição a Sassoli.

Morreu David Sassoli, presidente do Parlamento Europeu

Nos dias que antecederam a eleição, a maltesa escreveu no Twitter: “Quero que as pessoas acreditem na Europa. Quero recapturar o sentimento de esperança e entusiasmo no nosso projeto. Quero defender os valores que unem os europeus. É por isso que me candidato a ser a próxima Presidente do nosso Parlamento Europeu”.

O ‘twit’ foi partilhado pelo eurodeputado Paulo Rangel. “A UE precisa de políticos como Roberta Metsola. Ela esta comprometida com os nossos valores democráticos, é próxima dos cidadãos, acredita que a Europa pode fazer diferença ao nível global. Tenho orgulho de apoiar a Roberta ao cargo de Presidente do PE”, escreveu o português.

Com 43 anos, a advogada, especializada em Direito Europeu, faz parte do Parlamento Europeu desde 2013 e foi eleita vice-presidente em 2020.