Cerca de 40 portugueses a residir em Madrid queixam-se de que foram impedidos de votar. Alegando não ter recebido o boletim de voto pelo correio, tentaram, sem sucesso, votar presencialmente para as eleições legislativas. Alguns eleitores foram informados de que podiam votar presencialmente caso não recebessem o envelope para votarem por correspondência, mas o consulado diz não se responsabilizar por essa informação, que foi dada por um call center, soube a Rádio Observador. O embaixador em Madrid diz que só existem três cenários para o que possa ter acontecido: não receberam as cartas para votar porque se extraviaram; os eleitores mudaram de residência, mas não alteraram a morada fiscal e a carta poderá ter ido para o primeiro endereço; ou as pessoas não terão recebido o aviso de receção de carta para a levantar nos correios.

O Ministério da Administração Interna (MAI) diz que enviou 42.632 boletins de voto para Espanha nos dias 2 e 3 de janeiro. Já a secretária de Estado das Comunidades sugere que as pessoas que não conseguiram votar “não terão estado atentas” à informação relevante quanto ao voto nas legislativas, acrescentando que “deviam ter-se inscrito”. “Acontece que algumas pessoas não terão estado atentas e chegaram para votar presencialmente, talvez confundido, por exemplo, com as eleições presidenciais, em que o voto é presencial”, justificou Berta Nunes à Lusa, em conversa telefónica.

Ainda de acordo com Berta Nunes, nestas eleições só 2.872 portugueses em todo o mundo se inscreveram para votar presencialmente. Os eleitores que votam fora de Portugal podem fazê-lo de duas maneiras: presencialmente ou por via postal. A escolha deve ser feita e comunicada à respetiva comissão recenseadora no estrangeiro até à data da marcação da eleição. Se isso não acontecer, nas legislativas, a votação acontecerá obrigatoriamente por via postal.

Na resposta que enviou ao Observador, o MAI esclarece que os eleitores residentes no estrangeiro e inscritos na Base de Dados do Recenseamento Eleitoral tinham, de acordo com os prazos definidos na Lei Eleitoral, de manifestar até 5 de dezembro de 2021, dia em que o Presidente da República marcou a data das eleições, que pretendiam votar presencialmente nos consulados. E que a Administração Eleitoral da Secretaria Geral do MAI iniciou, a 27 de dezembro de 2021, o envio da documentação eleitoral para a morada de todos os cidadãos portugueses residentes no estrangeiro que optaram pela outra via: não votar presencialmente. Só não enviaram documentação para os portugueses cujo envelope foi devolvidos nos dois últimos atos eleitorais.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

No caso de quem não quer votar presencialmente, os eleitores recebem um boletim de voto para a morada indicada no caderno de recenseamento pela via postal mais rápida e sob registo, explica o site da Comissão Nacional de Eleições (CNE). Este deve ser devolvido devidamente preenchido e seguindo as indicações juntamente com uma cópia do cartão de cidadão ou bilhete de entidade por correio antes do dia da eleição. Ainda segundo o MAI, os 42.632 boletins de voto destinados a Espanha foram expedidos nos dias 2 e 3 de janeiro de 2022 e chegaram aquele país nos dois dias seguintes, sendo depois distribuídos localmente pela empresa Correos. E que até agora já foram recebidos em Portugal 5.691 envelopes contendo o boletim de voto de eleitores residentes em Espanha e que exerceram o seu direito de voto por via postal, representando 12,64% das cartas enviadas.

Os portugueses João Nazareth e Henrique Borges dizem não ter recebido qualquer documentação pelo que ligaram para o consulado que lhes terá dito que então podiam votar presencialmente. Mas chegados este sábado ao local de voto não o puderam fazer, pois não se tinham inscrito para o fazerem de forma presencial até ao dia 5 de dezembro. O mesmo aconteceu com Francisco Neto, que foi impedido de votar este sábado, o primeiro dia para a votação dos portugueses a residir fora do país, à tarde.

Portugueses impedidos de votar em Madrid

Correios espanhóis foram notificados para afluência maior devido às legislativas em Portugal, diz embaixador

À Lusa, o embaixador de Portugal em Madrid, João Mira Gomes, referiu que os 13.000 cidadãos nacionais a viver na área de Madrid tiveram até ao dia 5 de dezembro de 2021 para pedir o voto presencial para as eleições legislativas no consulado, tendo apenas 14 pessoas feito esse pedido de inscrição.Os eleitores que não o fizeram não podem votar presencialmente no consulado, uma vez que apenas constam nos cadernos eleitorais para o voto por correspondência, esclareceu. Dos 14 inscritos para exercer voto presencialmente, cinco já o fizeram, completou o diplomata.

“Este sistema [voto por correspondência] é para permitir que as pessoas possam votar forma mais confortável possível e de forma a permitir uma maior participação cívica nas eleições. É o que queremos, é o que se pretende com este sistema”, argumentou.

Questionado sobre a razão pela qual vários eleitores nacionais a residir em Madrid não receberam as cartas para o voto por correspondência, o embaixador português apresentou três cenários possíveis: não receberam as cartas para votar porque se extraviaram; os eleitores mudaram de residência, mas não alteraram a morada fiscal e a carta poderá ter ido para o primeiro endereço; ou as pessoas não terão recebido o aviso de receção de carta para a levantar nos correios.

João Mira Lopes sustentou que o serviço de correio espanhol foi notificado para uma afluência maior neste período por causa do voto para as eleições legislativas em Portugal. O MAI refere também que Espanha é um país signatário do Acordo Postal Universal, pelo que é possível fazer o seguimento das cartas registadas no seu território pela internet onde está indicada uma linha telefónica de apoio aos eleitores residentes no estrangeiro.

“Se o voto chegar até ao dia 9 de fevereiro há uma possibilidade de ele ser contado”, diz secretária de Estado das Comunidades

Também questionada pela Lusa acerca dos cerca de 40 portugueses residentes em Madrid que este sábado não conseguiram votar presencialmente no consulado, por estarem inscritos nos cadernos eleitorais para o voto por correspondência, a governante sugeriu que estas pessoas “não terão estado atentas” às comunicações oficiais quanto ao voto nas eleições legislativas. E rejeitou qualquer “falta de informação” sobre o ato eleitoral, já que tudo foi “divulgado não só pelos consulados e secções consulares”, mas também pelos “órgãos de comunicação social da diáspora”, estando a informação “amplamente disponível”. “

Nós atempadamente divulgamos a informação pertinente, ou seja, nas eleições legislativas o voto é o voto postal, as pessoas que queiram votar presencialmente devem inscrever-se – ou deviam ter-se inscrito – para votar até ao dia 5 de dezembro”, explicou.

Questionada sobre se tinha informação de que situações semelhantes às de Madrid estariam a ocorrer noutros locais do mundo, a governante disse não ter sido recebida “nenhuma outra reclamação ou pergunta”, mas reconheceu ser “natural que aconteça noutros locais, porque já aconteceu em eleições anteriores”.

Berta Nunes disse que em todo o mundo há “2.872 pessoas inscritas para o voto presencial e é por causa destas pessoas estarem inscritas para o voto presencial que as mesas estão a funcionar”, e vincou que “onde não há inscrição para o voto presencial, nem sequer a mesa está a funcionar”.

A governante assegurou ainda que “todas as pessoas receberam ou a carta – porque a carta é registada – ou receberam uma notificação para levantar a carta nos correios”, e se não receberam o motivo pode ser uma morada errada ou falta de levantamento no correio, rejeitando quaisquer problemas de atraso nos correios “no caso de Espanha ou da Europa”, mas reconhecendo que a questão “pode pôr-se em países em que não funcionem tão bem” ou “onde haja outro tipo de situações”.

Para as pessoas que ficaram hoje sem votar, a governante disse que “se o voto chegar até ao dia 9 de fevereiro há uma possibilidade de ele ser contado”.

Confrontada com o facto de “uma possibilidade” não ser uma opção que dê segurança aos eleitores, Berta Nunes reconheceu que de facto “não dá”, mas relembrou que a lei estabelece que “as pessoas deveriam ter enviado o voto até ao dia de hoje para ele ser contado e só serão contados os que chegarem até dia 9 de fevereiro”.

No caso de um eleitor que não tenha enviado o voto até hoje, mas o consiga enviar depois, “não se pode dirigir a ninguém” para garantir que o seu voto é contado, “porque a lei é clara nesse sentido”.

No Reino Unido, em cuja capital só 23 pessoas se terão inscrito para o voto presencial, também há problemas

À TSF, Filipa Fonseca, cidadã portuguesa a residir no Reino Unido, relatou problemas semelhantes, com vários eleitores a tentar, sem sucesso, votar presencialmente. “Cheguei lá por volta das 13h00 e pelo que me apercebi dos funcionários do consulado, parece que toda a manhã tiveram a receber portugueses, e não só, também falei com um senhor natural de Goa, de cidadania portuguesa e também ficou muito desiludido porque queria votar nas eleições em Portugal e infelizmente não podia.”

De acordo com as informações recolhidas no local por esta cidadã portuguesa, no consulado de Londres só 23 pessoas se terão inscrito atempadamente para votar de forma presencial. “Com as votações para a Presidência da República não houve problemas, as pessoas dirigiram-se ao consulado de Portugal em Londres, as pessoas votavam presencialmente, não houve drama”, reclamou.

“Este ano as coisas foram diferentes porque, supostamente, cidadãos portugueses residentes no Reino Unido com cartão de cidadão e com morada indicada que moram no Reino Unido deviam receber uma carta para votar. Não sabia que me iam enviar essa carta. Ainda não sei se recebi essa carta ou não, mas estou curiosa para saber se a vou receber”, disse ainda.

No site da Comissão Nacional de Eleições, por meio de perguntas e respostas, estão explicadas as diferenças entre os processos de votação para eleições legislativas e presidenciais para os eleitores recenseados no estrangeiro. Nas presidenciais o voto é presencial e decorre no dia anterior à data marcada para as eleições e no próprio dia das eleições. Já nas eleições legislativas, é possível votar presencialmente ou por correio. A escolha deve ser feita junto da comissão recenseadora no estrangeiro até à data da marcação da eleição. “Pode alterar a sua opção a todo o tempo, salvo no período entre a data da marcação e a realização da eleição”, pode ler-se no site. “Se nada disser, vota por via postal.”