Porfírio Silva, até aqui vice-presidente da bancada parlamentar e deputado do PS, acredita que, mesmo depois de ter conseguido maioria absoluta nas últimas legislativas, António Costa pode vir a ter a oportunidade de rumar à Europa, quando se colocar em jogo a discussão do cargo de presidente do Conselho Europeu, algures em 2024. Nessa altura, assume o dirigente dirigente socialista, Costa poderá mesmo dizer que sim ao desafio e deixar o cargo de primeiro-ministro.

Numa Vichyssoise especial emitida a partir do Parlamento, e que pôs frente a frente Porfírio Silva e André Coelho Lima, o deputado socialista recordou que António Costa já tinha tido essa mesma oportunidade no passado, mas decidiu declinar o convite em “nome da estabilidade da governação de Portugal”.

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“Agora, as condições são outras”, continuou. “Se as circunstâncias nacionais e internacionais forem mais suaves, penso que terá mais margem de manobra. Se António Costa achar que o país está numa circunstância particularmente delicada, certamente que não abandonará o barco.”

A saída de António Costa deixaria um vazio no poder e uma dificuldade aos socialistas: ir ou não a votos, correndo o risco de hipotecar a maioria absoluta conseguida nestas legislativas. Porfírio Silva a sua opinião muito pessoal. “Se fosse eu, não quereria suceder a António Costa por sucessão dinástica. Mas até pode ser que na altura seja necessário”, assume. A questão, no entanto, não é líquida.

“Há países onde essas questões são muito claras: no Reino Unido, por exemplo, muda o líder do partido, muda o primeiro-ministro. No no nosso país, essa é uma questão controversa. Como sabe, dentro do PS houve um discussão complicada por causa da decisão que o Presidente Jorge Sampaio tomou [ao indigitar Santana Lopes]. Mas mesmo aqueles que não gostaram na altura hoje reconhecem que teria sido pior para o país se a solução tivesse sido outra.”

“Eduardo Ferro Rodrigues ficou muito desagrado com a opção que se tomou, mas, passados estes anos todos, provavelmente até o próprio reconhece que foi a melhor maneira de não levantar uma onda. Sobre cenários futuros e nebulosos, não podemos ter demasiadas certezas“, salvaguardou o socialista.

Confrontado com as críticas de André Coelho Lima ao facto de António Costa ter feito do desenho do novo Governo uma forma de promoção dos vários candidatos à sua sucessão, Porfírio Silva rejeitou esse tipo de leituras. “Não é digno do debate que precisamos de ter. Este Governo faz uma boa combinação de competências e assume o momento particularmente duro que esta governação vai ter. Precisávamos de um Governo com competências fortes, com gente capaz de decidir politicamente e coeso”, começou por dizer.

“Agora, isto é como pudim: a prova do pudim é comê-lo. Todos os governos podem errar mais por aqui ou mais por acolá. Espero que tenham a oportunidade de não errar muito e de fazer aquilo que é preciso fazer em circunstâncias muito difíceis.”

Ainda assim, o socialista não negou que este Governo tem alguns dos melhores quadros do partido e naturais candidatos à sucessão do atual secretário-geral. “É natural que, tendencialmente, os mais bem-preparados, aqueles que eventualmente podem vir a substituir António Costa na liderança do partido, estejam disponíveis [para integrar o Governo].”

“Se o PS não tivesse ninguém que, no futuro, tivesse condições de substituir António Costa, diríamos que PS estava seco, que não tinha alternativa, que estava a viver à custa do secretário-geral. Assim como há três, quatro, cinco, seis, sete — às vezes já nem sou capaz de contar o número de putativos sucessores que os mais diversos comentadores põem em cima da mesa — mostra que há muita gente capaz de, chegado o momento, substituir António Costa.”

Porfírio Silva deixou ainda um elogio a João Torres, novo secretário-geral adjunto do PS e prova provada de que António Costa não se deixa ficar “enquistado na sua geração”, e a Eurico Brilhante Dias, alguém com “uma forma de fazer política bastante distendida”. “É um daqueles que vai ajudar a acalmar o tom do debate político”, disse.

O dirigente socialista defende, de resto, que o PS tenha perfeita noção do desafio que a maioria absoluta representa. “Uma maioria faz falta ao país. Uma oposição faz tanta falta ao país como uma maioria. Espero que a maioria de que faço parte seja capaz de reconhecer isso”, nota.

“Estou confiante que esta maioria saberá comportar-se como se deve comportar qualquer maioria no Parlamento. Não podemos esquecer que os números contam. O PS tem o maior número de deputados. Dá-nos mais responsabilidade. Temos de ter predisposição para discutir com os outros, porque é mais fácil fazermos erros quando estamos sozinhos.”

Defensor de sempre da solução encontrada à esquerda, Porfírio Silva deixou também um aviso ao PS: não pode, nem deve ignorar o maior partido de oposição. “Continua a ser só possível fazer maioria constitucional com o PSD, não nos podemos esquecer disso. Não podemos achar que numa semana tratamos mal o PSD e na outra vamos tentar formar uma maioria constitucional com ele. É do realismo político nós acharmos que uma maioria absoluta é uma responsabilidade absoluta. Não é um risco, mas é uma responsabilidade absoluta. A responsabilidade é maior”, rematou.