Os Jogos Olímpicos de Inverno tinham terminado há um par de dias quando a Rússia iniciou a invasão à Ucrânia. Para muitos, o momento não foi por acaso. E estaria ligado a uma tensão política entre a China e os russos em agosto de 2008, quando Vladimir Putin deu luz verde à invasão da Geórgia num conflito de menos de duas semanas que coincidiu com os Jogos Olímpicos de Verão também em Pequim. A partir daí, tudo o que de bom e de pior se passou no evento concluído a 20 de fevereiro ficou diluído na atualidade, a ponto de muitas vezes se recuar aos Jogos para falar dos ucranianos que em poucas semanas passaram da luta por medalhas para a luta com armas na mão. No entanto, ficou o caso de Kamila Valieva.
A jovem patinadora russa de apenas 15 anos que tinha ganho (e por larga margem) todas as competições que disputara a nível profissional, fosse em juniores ou em absolutos, chegava como a grande favorita à conquista da medalha de ouro na patinagem artística e começou da melhor forma com dois desempenhos notáveis que deram a vitória à Rússia por equipas. No entanto, nem ela, nem os restantes elementos da equipa foram ao pódio. Razão? Um teste positivo num controlo anti-doping feito ainda antes dos Jogos de Inverno, em dezembro, que levou a que a organização preferisse “congelar” esse momento.
O que se passou a partir daí foi uma bola de neve que chegou ao ponto que muitos temiam perante uma atleta de 15 anos: muita informação e contra-informação, a justificação do teste na possível contaminação com um medicamento do avô, o aparecimento de mais duas substâncias na análise que, não sendo ilegais, potenciavam o rendimento desportivo (e não seria apenas algo para o coração e circulação do sangue), uma pressão mediática crescente, as críticas de vários atletas e antigos campeões em relação a um esquema de falsificação de resultados com recurso a substâncias dopantes da Rússia que se mantinha apesar de todos os castigos, a ameaça de não haver medalhas de novo caso fosse ao pódio. A jovem atleta quebrou e, na final, com todas as condições para mais um triunfo, fez erros atrás de erros até ao quarto lugar.
Não mais se voltou a falar de Kamila Valieva, que entretanto voltou à competição ao mais alto nível na Taça Channel One que se realizou em Saransk, no último mês. A sua equipa, a Time of Firsts, não conseguiu o triunfo na competição mas a atleta de cumpre esta terça-feira 16 anos bateu a campeã olímpica e mundial Anna Shcherbakova no programa curto, perdendo depois para a compatriota no programa livre. “Estou tão contente com a participação nesta prova, foi um sentimento incrível. Estar numa sala cheia permite que tenha mais energia quando já estamos cansados”, comentou em declarações reproduzidas pela TASS.
Patinadores dos Jogos Olímpicos de Inverno poderão vir a competir apenas a partir dos 17 anos
Em dia de aniversário, Kamila Valieva juntou-se à comitiva russa de medalhados nos Jogos Olímpicos de Inverno que foi condecorada no Kremlin por Vladimir Putin. E foi o próprio presidente da Rússia que voltou ao tema do uso de substâncias dopantes, recusando qualquer tipo de recurso a doping.
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????????⚡️#Putin congratulated figure skater #Kamila_Valieva on her birthday
at the awards ceremony for the Olympians.
.. Also, a skater was awarded the Order of Friendship..
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#TelegramРоссия pic.twitter.com/m0jHryupIE— Milky Way (@MilkyWa34808762) April 26, 2022
“A Rússia tem mais uma equipa de ouro na patinagem artística. Foram desempenhos tecnicamente complexos e expressivos de Alexander Gallyamov, Anastasia Mishina, Victoria Sinitsina, Nikita Katsalapov, Mark Kondratyuk e Kamila Valieva que não deixaram nem o público nem os juízes indiferentes”, começou por referir o líder russo na sua intervenção, antes de colocar o foco na grande promessa do país.
“Claro que todo o país e os fãs da patinagem artística por todo o mundo ficaram especialmente atentos e preocupados com a Kamila. Ela absorveu a maioria dos elementos mais complexos da modalidade com a sua flexibilidade, beleza, potência e delicadeza aliada ao seu talento e conseguiu elevar o desporto ao nível de uma real forma de arte. Esse tipo de perfeição não pode ser atingido de forma desonesta com a ajuda de substâncias adicionais, com ajuda de manipulações. Sabemos muito bem que essas substâncias adicionais não são necessárias na patinagem artística. Sabemos e percebemos muito bem isso. Vamos dar os parabéns à nossa Kamila pelo seu aniversário que é hoje celebrado”, acrescentou, numa cerimónia que mereceu também transmissão televisiva em direto e que teve curtas palavras da atleta.
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“Caro senhor Vladimir Vladimirovich, estamos muito contentes por ter conseguido encontrar tempo para se encontrar connosco. É uma grande honra para mim receber a distinção estatal por parte do presidente da Rússia no meu 16.º aniversário. Muito obrigado pelo amor que tem pelo desporto e por apoiar os atletas, é algo muito importante para nós. Muito obrigado”, agradeceu Kamila Valieva.
Mas Vladimir Putin não ficou por aí a nível de comentários ao que se tem passado no mundo do desporto, deixando várias críticas às sanções aplicadas depois da invasão à Ucrânia. “A suspensão dos atletas da Rússia e da Bielorrússia dos Jogos Paralímpicos não só viola de forma direta os princípios fundamentais do desporto mas também viola de forma cínica e aberta os seus direitos humanos básicos. A suspensão do Evgeny Rylov por ter estado no desfile militar no Estádio Luzhniki também é completamente absurda”, apontou o presidente russo, entre outros exemplos de boicotes, castigos e suspensões aplicados.
Três patinadoras russas lutaram pelo ouro. No fim, uma caiu, uma fez birra e uma venceu