Novo líder no PSD, novas prioridades também no grupo parlamentar. Esta quinta-feira, na reunião dos deputados sociais-democratas, Paulo Mota Pinto foi desafiado a dizer o que pretende fazer quando o partido tiver de votar o referendo proposto pelo Chega à despenalização da morte assistida — ideia que Rui Rio nunca acompanhou e que Luís Montenegro sempre defendeu. Perante as perguntas dos próprios parlamentares, Mota Pinto foi evasivo, dizendo que a questão ia merecer a devida análise.

O esclarecimento só viria muito mais tarde e pela voz de Rui Rio. No Parlamento, o ainda líder do PSD revelou que, tal como antes, os deputados sociais-democratas iriam ter liberdade de voto na votação.

A decisão tem potencial para causar algum embaraço entre líder em funções (Rui Rio), líder eleito (Montenegro) e o grupo parlamentar, liderado por Paulo Mota Pinto e maioritariamente rioísta. A decisão assumida pelo ainda líder do PSD choque de frente com as posições de sempre de Montenegro.

De resto, a argumentação utilizada por Rio já tinha sido ensaiada horas antes. Num almoço-debate do International Club of Portugal, em Lisboa, com Paulo Mota Pinto como o convidado, o social-democrata foi questionado por José Ribeiro e Castro, antigo líder do CDS, se os sociais-democratas admitiriam votar a favor de um referendo sobre a questão da eutanásia.

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De acordo com a agência Lusa, o líder parlamentar do PSD recordou que, quanto à questão de fundo, o partido tem dado liberdade de voto aos deputados, considerando que se trata “de uma questão de consciência, em que está em causa uma questão fundamental em relação à vida e morte”, devendo manter-se essa posição quanto aos diplomas do PS, BE e PAN que pedem a despenalização a morte medicamente assistida.

No International Club of Portugal, Mota Pinto deixara tudo em aberto. “O grupo parlamentar ainda não definiu posição sobre isso. Neste momento está em aberto, ouvi defender essa posição pelo líder recentemente eleito, que só entra em funções — como ele próprio disse — a 4 de julho. Temos de definir uma posição sobre isso. Até por isso, não quero estar aqui a dizer-lhe a minha posição pessoal”, salvaguardou o líder parlamentar do PSD.

Ainda assim, o social-democrata não deixou de manifestar dúvidas sobre referendos que envolvem direitos fundamentais sejam adequadas para referendos. “Não estou a dizer que sou contra, mas compreendo quem usa o argumento”, notou Mota Pinto.

Grupo de deputados quer saber futuro de Mota Pinto

Apesar de ser maioritariamente constituída por deputados escolhidos a dedo por Rui Rio, e de Paulo Mota Pinto ter sido eleito por 92% dos votos expressos, há uma minoria na bancada parlamentar — próxima de Luís Montenegro — que entende que Mota Pinto deveria colocar o lugar à disposição, atendendo à mudança de ciclo interno.

Nesta reunião, que era a primeira desde a eleição, o tema foi praticamente ignorado pela direção da bancada, com Paulo Mota Pinto a limitar-se a dizer que tomou a liberdade, em nome do grupo parlamentar, de felicitar Luís Montenegro. Havia quem esperasse uma tomada de posição do presidente da bancada, lembrando que Rui Rio dispensou o então líder parlamentar, Hugo Soares, assim que tomou posse.

Durante a campanha houve uma espécie de tabu sobre a continuidade de Mota Pinto. “A direção do partido e a frente parlamentar têm que estar em articulação”, disse Luís Montenegro na entrevista ao Observador. Os seus apoiantes foram repetindo que era prematura a questão, até porque o próprio Mota Pinto não tinha dito se queria continuar.

Já esta semana, depois da eleição de Luís Montenegro, André Coelho Lima, que deixará a vice-presidência do partido mas, até algo em contrário, permanece como vice da bancada, disse no programa Semáforo Político, da Rádio Observador, que vê “todas as condições” para Paulo Mota Pinto “trabalhar com Luís Montenegro”. É mais pressão para que Montenegro não force a saída do atual líder parlamentar.

Quando o Observador tentou questionar Paulo Mota Pinto, em Roterdão, sobre se irá levar o mandato até ao fim, o líder parlamentar optou por não comentar, com uma justificação com peso de Estado: fora do país não comentava assuntos internos.

Abstenção do PSD/Madeira provoca protestos

Outro dos temas que foi suscitado durante a reunião do grupo parlamentar do PSD foi a abstenção dos deputados do PSD/Madeira na votação do Orçamento do Estado para 2022. Mota Pinto terá manifestado o desagrado com a posição assumida pelo três parlamentares, argumentando que tal tinha violado o sentido de voto da bancada do partido.

Na resposta, Sérgio Marques terá lembrado a autonomia do PSD/Madeira, sugerindo que a abstenção foi articulada com Miguel Albuquerque, presidente do Governo Regional e líder regional do partido. Quando se esperava que o assunto motivasse mais discussão, Paulo Mota Pinto interrompeu a troca de argumentos e disse que a questão estava sanada.

A questão é particularmente delicada porque Miguel Albuquerque foi mandatário nacional de Luís Montenegro. No passado, em 2014, quando era líder parlamentar, o social-democrata chegou mesmo a instaurar um processo disciplinar a três deputados da Madeira (Guilherme Silva, Hugo Velosa e Francisco Gomes e Correia de Jesus), que votaram votaram contra a proposta de Orçamento do Estado apresentado pelo então Governo PSD/CDS. Se a situação se repetir no futuro, Montenegro terá um problema em mãos.

Neste contexto, mais estupefação causou o facto de na mesma reunião ter sido anunciado que os dois deputados dos Açores iam votar ao contrário da restante bancada parlamentar no diploma que atualiza a idade de acesso às pensões e elimina o fator de sustentabilidade nos regimes de antecipação da idade de pensão de velhice do regime geral de Segurança Social, com alguns parlamentares a questionarem os dois pesos e medidas nesta discussão.

*Artigo atualizado com a posição de Rio sobre referendo à eutanásia