Os ministros com a tutela da Energia vão reunir de emergência esta terça-feira para alcançar um difícil acordo para a redução voluntária do consumo de gás natural face à ameaça cada vez mais real de corte no abastecimento russo. E a pressão é cada vez maior. Esta segunda-feira, a empresa russa Gazprom anunciou que vai voltar a reduzir o fornecimento através do gasoduto Nord Stream com destino à Alemanha, uma notícia que fez disparar as cotações do gás no mercado holandês em 10%.
Na reunião em Bruxelas onde estará sentado o ministro Duarte Cordeiro, a Comissão Europeia vai colocar a discussão um texto revisto face à proposta conhecida na semana passada na qual se apontava para diminuição transversal e solidária — para ajudar os países mais expostos ao gás russo — em 15% do consumo de gás já a partir de agosto e até ao início da primavera de 2023. Este corte seria obrigatório a partir do momento que Bruxelas decretasse o estado de alerta na sequência de um corte de abastecimento unilateral por parte da Rússia nos meses de inverno, quando a Europa mais precisa de gás.
Uma das principais cedências à contestação de vários estados-membros é a necessidade de submeter uma proposta de corte de Bruxelas ao conselho europeu, que terá de ser votada por uma maioria qualificada dos países (15 entre 27).
A meta voluntária que passava a vinculativa dos 15% foi muito mal recebida por vários países, entre os quais Portugal que, ao lado da Espanha, apontou para a posição geográfica periférica e para as fracas interligações ao continente europeu. A reforçar a objeção portuguesa está também a dependência que o sistema elétrico tem do gás natural devido à seca (e agravada em Portugal com o fecho das centrais a carvão). As autoridades portuguesas sempre defenderam que o país não seria afetado pelas perturbações no fornecimento devido à guerra da Ucrânia porque não precisava do gás russo, ao contrário dos países do leste e centro da Europa.
Solidariedade ou sacrifício sem sentido? Porque é difícil para Portugal cortar no consumo de gás
De acordo com a Reuters e o jornal espanhol El País, a proposta trabalhada nos corredores da diplomacia para os ministros europeus discutirem (e eventualmente aprovarem) mantêm o princípio do corte de 15% no uso do gás, mas permite uma série de isenções face a essa meta, o que permitiria a cada país ter objetivos de redução diferenciados. “Todos têm de contribuir na medida das suas possibilidades”, referiu um diplomata europeu à agência Reuters, segundo o qual esta nova proposta continuará a permitir cobrir o buraco de 45 mil milhões de metros cúbicos nas redes de gás europeias que a Rússia pode provocar este inverno.
O El País cita um esboço do novo texto no qual se mantêm o objetivo de diminuir em 15% o consumo nacional, mas abrindo exceções que vão de encontro às objeções levantadas por Portugal e Espanha e por outros países europeus. A exceção que foi reconhecida para permitir desligar o preço ibérico da eletricidade do do gás natural voltaria a ser aceite abrindo a porta a uma exceção no corte para países com fracas interligações ao mercado europeu e cuja produção elétrica dependa em grande medida do gás. Numa versão anterior essa situação poderia aliviar em 5% o corte. Países com grandes volumes de armazenamento e que exportaram gás para parceiros europeus, como é o caso de Espanha podem vir a ter de reduzir menos o seu consumo. E setores industriais essenciais também poderiam beneficiar de uma situação de exceção.
Outra cedência da parte de Bruxelas aos países opositores é o mecanismo decisório que ativa o corte de emergência. Segundo o El Pais, a proposta de corte poderia ser emendada por uma maioria qualificada dos 27 estados-membros. Para além de Portugal e Espanha, também França, Itália, Holanda e Polónia contestaram o poder conferido à Comissão Europeia na gestão da crise energética a nível nacional.
Apesar dos sinais que estão a ser vistos como de aproximação aos contestatários, fontes diplomáticas citadas pelo ABC consideram que Espanha sai derrotada deste processo na medida em que se mantém a meta de cortar 15% do consumo em caso de ruptura de abastecimento.
A partir de quarta-feira, a empresa estatal russa vai introduzir uma redução adicional das entregas via Nord Stream para um nível que corresponde a 20% da capacidade desta infraestrutura. A Gazprom voltou a usar o pretexto da turbina e da estação de compressão que a Siemens enviou para reparação no Canadá e cuja entrega estará retida devido às sanções contra a Rússia. O Nord Stream I é a principal porta de entrada do gás russo na Europa com capacidade para 33 milhões de metros cúbicos diários.