O Mercado do Bolhão reabre esta quinta-feira as portas à cidade do Porto e aos comerciantes que há mais de quatro anos aguardavam por voltar à “casa” que está, depois de quatro tentativas nos últimos 34 anos, por fim, reabilitada.

A Nossa Senhora da Conceição, a santa padroeira do Bolhão, foi a primeira a mudar-se e a “abençoar” o centenário mercado do Porto. A ela, juntar-se-ão 79 comerciantes históricos, que durante mais de quatro anos venderam os seus frescos no mercado temporário.

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É com o toque do sino, elemento que se preservou durante a reabilitação, que é assinalada, pelas 08h00, a reabertura do mercado, mantendo “viva” a tradição de avisar, todos os dias, o início das atividades.

Com 81 bancadas, 38 lojas e 10 restaurantes, o Bolhão acomoda os frescos no piso térreo e os restaurantes no piso superior. No exterior, ficarão as lojas e, no interior, haverá ainda espaço para acolher pequenos mercados temporários.

O mercado centenário, cujas origens remontam a 1838, está também “mais adequado aos novos tempos”, tendo agora novas ligações à cidade: uma passagem intermédia que liga as ruas Alexandre Braga e Sá da Bandeira, e uma entrada direta a partir da estação do metro do Bolhão.

Alvo de uma obra de restauro “exigente”, consignada a 15 de maio de 2018, o Mercado do Bolhão estava suportado por andaimes desde 2005, devido a um alegado risco de ruína que só não levou ao seu encerramento porque os comerciantes o impediram.

A empreitada de restauro e modernização foi adjudicada ao agrupamento Alberto Couto Alves S.A e Lúcio da Silva Azevedo & Filhos S.A, por 22,379 milhões de euros, mas, veio, no entanto, a custar mais 15% do que inicialmente previsto, passando para cerca de 26 milhões de euros.

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A pandemia da Covid-19 e “várias vicissitudes” condicionaram a conclusão dos trabalhos — prevista para 15 maio de 2020 — e tornaram necessário o reajustamento do prazo por mais dois anos e quatro meses.

Ao longo da sua história, o Mercado do Bolhão teve um primeiro projeto de requalificação em 1998 e dois planos de intervenção durante os mandatos do social-democrata Rui Rio, mas nenhum saiu do papel.

Em 1998, o projeto do arquiteto Joaquim Massena, avaliado em 12,5 milhões de euros, seria abandonado pelo executivo municipal pouco tempo depois da sua adjudicação por alegada falta de verbas.

E, em 2008, durante o segundo mandato de Rui Rio, a câmara aprovou um contrato para adjudicar a recuperação e exploração do mercado a privados, mas as partes entraram em rutura devido ao que a autarquia apelidou de “incumprimento de obrigações pré-contratuais”.

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À época, decidiu-se, então, por um projeto em parceria com o Ministério da Cultura, através da Direção Regional de Cultura do Norte, mas, no final de 2011, o social-democrata anunciava não poder avançar com o projeto de 20 milhões de euros sem uma substancial comparticipação de fundos comunitários.

O mercado centenário, classificado em 2013 como Monumento de Interesse Público, foi também palco inevitável de inúmeros candidatos e políticos.

Nas eleições autárquicas de 2013, o mercado foi prioridade de vários candidatos, entre eles, Rui Moreira, o independente eleito presidente que, à época, defendia uma concessão a privados, um projeto “exequível em 12 meses” e o renovado mercado aberto em 2015.

Já depois de tomar posse, o independente assegurou que o modelo de recuperação seria público, mas que dependia de fundos comunitários. No entanto, os “tão bons” resultados nas contas de 2014 fizeram crer que a recuperação do Bolhão podia avançar sem privados ou financiamento europeu.

Anunciado a 22 de abril de 2015, durante o primeiro mandato de Rui Moreira na Câmara do Porto, o atual restauro do mercado foi adjudicado em novembro, mas foi preciso esperar por março de 2016 para obter o último visto do Tribunal de Contas.

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Em agosto de 2016, arrancava a primeira parte da atual modernização, com o desvio de infraestruturas e de uma linha de água, necessária para a posterior estabilização do edifício e construção da cave logística.

Nesse mesmo mês, a Procuradoria-Geral da República confirmava que o Ministério Público estava a investigar a existência de um eventual crime no processo de reabilitação do mercado, na sequência de uma queixa que o arquiteto Joaquim Massena, autor do projeto de 1998, apresentara no Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) do Porto.

O arquiteto viria ainda, em maio de 2019, a avançar com uma ação judicial no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) do Porto contra o município por quebra de contrato, pedindo uma indemnização por danos morais e patrimoniais.

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Com as ações judiciais a desenrolarem-se, a reabilitação do Mercado prosseguia, com a autarquia a anunciar, em dezembro de 2019, que as obras iriam ser prolongadas por mais um ano devido à necessidade de alterar o “método construtivo” que, implicava a demolição e reconstrução total das galerias superiores, cujo estado de degradação era “bastante mais grave do que era possível apurar dos estudos preliminares”.

O desfecho da investigação do Ministério Público chegava um ano depois, em dezembro de 2020: arquivada por se considerar que não existiam “indícios da prática de infração criminal” e que as opções tomadas em 1998, 2008 e 2015 “foram diferentes porque o podiam ser” e que, o município podia escolher o projeto que “tivesse por conveniente”.

Depois de várias datas e previsões, o histórico mercado reabre na indicada agenda: “15 de setembro”.