“Eu estava ali, vi-o mas não falámos. Lido com isso amanhã. Hoje celebramos esta vitória. Agora temos de recuperar disto.”
Depois do empate sem golos frente ao Newcastle, adensando o mau arranque também no plano ofensivo da equipa que nos últimos três encontros em Old Trafford levava apenas um golo (com o Omonia, no período de descontos), a receção ao Tottenham era fundamental para o Manchester United e para Erik ten Hag. Porque uma derrota começava a adensar em demasia o fosso para os primeiros lugares, porque mais um jogo em branco tendo deixado desta vez Ronaldo no banco provocaria mais ruído, porque a seguir viria a deslocação a Londres para defrontar o Chelsea. A vitória foi um bálsamo para quase tudo isso.
Nem mesmo aquela reação de Ronaldo durante o encontro, quando abandonou o relvado aos 89′ em direção aos balneários sem falar com ninguém, perturbou o sentimento do técnico neerlandês. No entanto, não ficou esquecido. Pelo contrário. E foi o tema de conversa no regresso aos trabalhos da equipa.
Antes, houve um pouco de tudo. Defesa do português, por Rio Ferdinand: “Ronaldo não jogou e acho que vai estar completamente irritado com isso, naturalmente. Não espero nada diferente dele. Se não vê Ronaldo como titular, tem de deixá-lo ir. Qual a razão de não o ter deixado sair se sabia que não estava nos planos?”. Ironia entre a defesa do português, por Nani: “Não sei o que se passou naquele momento. Talvez tenha precisado de ir à casa de banho… Ele é um grande profissional, trabalha duramente para estar em campo e talvez possa ter havido um pouco de frustração”. Desilusão com o português, por Schmeichel: “Sair daquela maneira cria tudo aquilo que não precisamos. Sabia que ia ser destaque. É a primeira vez que posso dizer que estou desiludido com ele. Normalmente apoio-o mas não precisamos destas distrações”.
O Cristiano percebeu que já não ia entrar e foi tomar banho mais cedo ????
???????????????????????????? @premierleague | @ManUtd 2 x 0 @SpursOfficial#PremierELEVEN pic.twitter.com/OFvAv0fKon
— DAZN Portugal (@DAZNPortugal) October 19, 2022
“Cristiano não fará parte do plantel para o jogo de sábado com o Chelsea. O resto do plantel está totalmente focado na preparação dessa partida”, anunciou o clube em comunicado, sem mais detalhes sobre o castigo que, de acordo com o The Athletic, fará com que o avançado treine à parte dos seus companheiros durante alguns dias. Pela primeira vez, com treinador e dirigentes em sintonia, o Manchester United tomava uma posição contra o português, consubstanciada não só para ausência da próxima partida mas também numa multa muito elevada pelo ato. E foi também por isso que Ronaldo fez um mea culpa da situação que pode depois ajudar à futura reintegração a partir de domingo – sem mudar a má relação com Ten Hag.
“Não mudei. Sou a mesma pessoa e profissional que tenho sido nos últimos 20 anos a jogar futebol de alto nível e o respeito sempre desempenhou um papel muito importante no meu processo de tomada de decisão. Comecei muito jovem, os exemplos de jogadores mais velhos e experientes sempre foram muito importantes para mim. Mais tarde, procurei sempre dar o exemplo aos jovens que cresceram em todas as equipas que representei. Isso nem sempre é possível e às vezes o calor do momento leva a melhor. Neste momento, sinto que tenho que continuar a trabalhar duramente em Carrington, a apoiar os meus companheiros e estar pronto para tudo em qualquer jogo. Ceder à pressão não é uma opção. Nunca foi. Este é o Manchester United e unidos devemos ficar. Em breve estaremos juntos novamente”, disse.
Cristiano Ronaldo makes a statement on Instagram ???? pic.twitter.com/uwtxg5vwIc
— ESPN UK (@ESPNUK) October 20, 2022
Em nenhum momento o capitão da Seleção aludiu às notícias que davam conta de uma eventual recusa de ouvir Erik ten Hag e entrar em campo nos derradeiros (poucos) minutos do jogo frente ao Tottenham, uma informação que adensava ainda mais o caso de disciplina em causa. Mais: já antes o The Times escrevera que Ronaldo não gostava também dos treinos do neerlandês, argumentando que o técnico quer colocar o Manchester United a jogar como o Ajax tendo jogadores que não têm nada a ver com aqueles que tinha em Amesterdão. Para Ten Hag, que foi tentando gerir dentro do possível a situação sem assumir que o número 7 não conta como opção inicial mas dando a entender isso pelas opções, foi um fim de linha.
Disgraceful. Ten Hag once again opting to humiliate the greatest footballer in history & Utd’s top scorer last season… @Cristiano should find another club asap where they treat him with the respect he’s earned. https://t.co/gSMYwGxEbb
— Piers Morgan (@piersmorgan) October 20, 2022
É por isso que, de acordo com alguma imprensa inglesa, Ronaldo poderá ter permissão para sair mesmo a custo zero em janeiro. Contudo, há dois problemas: que clube estará disponível a aceitar o avançado depois das recusas que se foram sucedendo no verão e quem conseguirá lidar com um ordenado que aponta para os 2,3 milhões de euros por mês. No fundo, uma versão 2.0 do que se passou em agosto, sendo que até hoje houve sete episódios marcantes que dinamitaram por completo a relação com o técnico.
After a difficult start ETH has really stamped his authority on #MUFC on & off the pitch. Their performance against Spurs was one of the best of recent years & he has dealt with the Ronaldo situation perfectly since day one. https://t.co/KIYIRll7Ae
— Jamie Carragher (@Carra23) October 20, 2022
1. A ausência da digressão da equipa pela Ásia e pela Austrália, na altura devidamente justificada (e até autorizada) pelo Manchester United e pelo próprio Erik ten Hag com “problemas pessoais”;
2. O pedido de saída no regresso aos trabalhos 22 dias depois, com a chegada ao centro de treinos de Carrington acompanhado do empresário Jorge Mendes e do representante da Nike, Ricardo Regufe;
3. A saída de Old Trafford quando ainda decorria a segunda parte do encontro particular com o Rayo Vallecano (à semelhança de outros companheiros de equipa), um teste em que o técnico não contava inicialmente com o português que anunciou nas redes sociais que iria voltar aos relvados. “É um comportamento inaceitável por parte de todos, vamos ter de falar sobre isto”, disse Ten Hag;
4. A condição de suplente com mais ou menos minutos que teve início na receção ao Liverpool, depois da goleada sofrida frente ao Brentford, e só mudava nos jogos da Liga Europa em que o neerlandês aproveitava para ir rodando parte da equipa tendo em conta a grande densidade competitiva;
5. O facto de não ter sequer saído do banco contra o Manchester City no dérbi realizado no Etihad que terminou com um autêntico atropelo dos visitados. “Seria uma grande falta de respeito pelo Cristiano e pela grande carreira se o colocasse em campo a perder por 4-0”, destacou Ten Hag;
6. A substituição por Marcus Rashford aos 70′ da receção ao Newcastle, quando o resultado estava ainda em branco (como acabaria) e com o português a não esconder a sua irritação primeiro sozinho e depois em conversa com Antony: “Eh pá vai para o car****, precisas ganhar o jogo…”, atirou enquanto saía;
7. A saída da zona do aquecimento para os balneários a um minuto dos 90′ na receção ao Tottenham, depois de alegadamente ter também recusado entrar para os derradeiros minutos do triunfo por 2-0 que nunca ofereceu dúvidas perante a superioridade manifestada contra os londrinos.
Agora, e até à paragem para o Mundial, o Manchester United terá mais sete encontros, a começar pelo Chelsea para a Premier League. Nesse, Ronaldo ficará de fora; nos restantes seis, dependerá do marcar de posição do clube e de Ten Hag depois do sucedido, sendo que metade são para Liga Europa (Sheriff e Real Sociedad) e Taça da Liga (Aston Villa). Em janeiro, nova novela em torno de uma possível saída poderá ter início, mesmo que as soluções sejam tudo menos óbvias olhando para as cinco principais ligas e até para os apurados para os oitavos da Liga dos Campeões. Em fevereiro, no dia 5, faz 38 anos.