O exército da Rússia preparou cerca de 800 quilómetros de fortificações militares em antecipação a uma possível contraofensiva ucraniana. Segundo o El País, que recorreu à análise através de imagens satélite realizada por Brady Africk, mais de 2580 fortificações terrestres terão sido montadas pelas tropas russas, e é provável que dezenas de outras fortificações estejam ainda a ser concluídas.
Em alguns locais, como Stepove e Ternuvate, o exército russo construiu um fosso com um quilómetro de comprimento, e posicionou de seguida três baterias de defesa. Noutras localidades como Tokmak, a estratégia organizada pelas tropas russas é um pouco mais complexa, tendo sido construída uma defesa com duas linhas de contenção diferentes.
A cerca de 10 quilómetros da cidade, foram montados um fosso — que atrasa o avanço tanto das tropas como dos veículos ucranianos — e várias trincheiras, locais a partir dos quais os soldados russos poderão montar posições defensivas. Junto ao perímetro externo da cidade, o exército russo escavou outro fosso e colocou, imediatamente a seguir, uma linha contínua formada por “dentes de dragão”. Ou seja, objetos de betão em forma piramidal que têm como objetivo impedir o avanço dos veículos ucranianos ou obrigar ao seu desvio para locais onde as tropas russas tenham montado armas de maior calibre, eficazes contra veículos.
As fortificações têm início no nordeste da Ucrânia, na fronteira do território ocupado pelas tropas russas na província de Lugansk. A barreira defensiva continua depois em direção a sul, nos territórios ocupados na província de Donetsk, seguindo depois para a província de Zaporíjia. As fortificações continuam ao longo do rio Dnipro, passam pela região de Kherson e terminam num posição defensiva que protege a península da Crimeia. Além da linha defensiva, o exército russo organizou um plano que irá certamente atrasar, ou mesmo estagnar, a contraofensiva ucraniana.
O historiador finlandês e analista da guerra na Ucrânia, John Helin, explicou ao jornal espanhol que as tropas russas fortificaram várias cidades, convertendo-as em autênticos bastiões de defesa. Deste modo, o exército ucraniano terá de travar o avanço da sua linha da frente e tentar conquistar estas cidades, caso contrário arrisca-se a ficar com inimigos entrincheirados na sua retaguarda. Para John Helin, estas fortificações têm alguns pontos fracos em comparação com as linhas defensivas montadas na Segunda Grande Guerra. Os dentes de dragão utilizados pelo russos nesta guerra, por exemplo, não têm a sua base enterrada no solo, pelo que pode ser facilmente retirados do caminho com o recurso a uma retroescavadora. Também os bunkers, explica, ao invés de serem construídos com fundações de cimento debaixo do solo, são pequenos módulos pré-feitos de cimento colocados nos acessos às estradas para proteger os atiradores.
Tanto em Zaporíjia como no território ocupado pelas tropas russas em Kherson, junto da fronteira com a Crimeia, as fortificações consistem em três linhas defensivas paralelas e com cerca de 120 quilómetros de comprimento, separadas entre si por cerca de 15 quilómetros de distância. A primeira linha consiste em trincheiras de combate complementadas com arame farpado. De seguida, um campo de minas dá lugar a dentes de dragão, fossos cavados para travar os tanques ucranianos e novamente trincheiras e arame farpado. No final, foram construídos diversos bunkers e defesas para dar cobertura aos atiradores russos.
Além das posições defensivas, o nível de moral dos soldados é igualmente importante quando o objetivo é defender uma ofensiva militar, salientou o professor universitário e diretor do grupo de análise de defesa Global Strategy, Javier Jordán. Quando Kherson foi reconquistada pelas tropas ucranianas, foi vital eliminar vários comandantes russos: com uma forte estrutura hierárquica e perante a perda das cadeias de comando, o exército russo teve de abandonar as suas posições defensivas. Javier Jordán acredita que o exército ucraniano pode apresentar um número de efetivos acima da proporção de três para um em relação ao exército russo — o que em teoria é o número necessário para que uma ofensiva militar de larga escala tenha sucesso. Qualquer que seja o número, ainda assim, irá envolver a perda de um número elevado de vidas.