A bastonária da Ordem dos Enfermeiros faz duras críticas ao Governo e ao órgão que o Executivo quer criar e que vai passar a supervisionar a atividade das Ordens Profissionais. Em declarações ao Observador, Ana Rita Cavaco acusa o Governo de “ingerência” e de ter a intenção de retirar a independência às Ordens, num processo que, diz, é consequência da maioria absoluta do Partido Socialista.

“Temos uma divergência insanável com o Governo, que é a questão do conselho de supervisão, que vai fazer com que as ordens percam a sua autonomia e a independência”, diz a bastonária dos Enfermeiros. Ana Rita Cavaco critica a alteração decorrente da nova Lei-Quadro das Ordens Profissionais, que prevê a criação de um órgão de supervisão independente, com membros externos às Ordens, pessoas que, diz, poderão influenciar questões disciplinares.

A Ordem dos Enfermeiros, tal como as restantes ordens profissionais, mostrou-se contra a ideia de criar este órgão. Mas o Governo, lamenta a responsável, vai mesmo avançar com a criação deste órgão, depois de o Tribunal Constitucional — chamado a pronunciar-se depois de um pedido de fiscalização da lei feito pelo Presidente da República — ter considerado, no final de fevereiro, que a alteração da lei das Ordens não era inconstitucional.

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Admitindo que, em relação a este tema, “não há volta a dar”, a bastonária dos Enfermeiros não deixa de criticar a criação de uma entidade de supervisão junto das Ordens. “Este órgão vai ter pessoas que vêm de fora da profissão. É uma ingerência direta”, salienta. Estes membros externos não estarão em maioria neste órgão, mas Ana Rita Cavaco garante que terão de ser pagos por dinheiro dos profissionais. “As Ordens não têm subvenções do Estado. É dinheiro das quotas dos membros”, diz.

A reforma das Ordens profissionais foi uma exigência que Bruxelas fez ao Governo português e que passava, sobretudo, pela redução das restrições no acesso a profissões reguladas, nomeadamente através do fim dos estágios não remunerados. Sem a aprovação da nova Lei das Ordens, o acesso de Portugal a parte das verbas do Plano de Recuperação e Resiliência poderia ficar comprometido. No entanto, Ana Rita Cavaco salienta que “nada foi dito por Bruxelas relativamente a ter uma ‘polícia política’ dentro das Ordens profissionais”. Ou seja, esta medida foi uma opção do Governo, e não imposta por ninguém.

A introdução do órgão de supervisão, diz a responsável, “tem a ver com uma questão ideológica do partido que está no Governo, que tem maioria absoluta e que faz aquilo que quer”, salienta. “É o quero posso e mando.”

Como já tinha afirmado ao Observador, no final de maio, a bastonária dos Enfermeiros acusa o Executivo de querer condicionar a atuação das Ordens, sendo a criação do órgão de supervisão dirigida especialmente “às Ordens mais incómodas”. “Este governo demonstrou que não gosta das denúncias que as Ordens profissionais fazem. No caso da Ordem dos Enfermeiros, isso é claro. O governo não gosta de quem lhes faz oposição.”