O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, disse sexta-feira ao chefe da missão diplomática da Palestina em Portugal que alguns palestinianos “não deviam ter começado” esta guerra com Israel e aconselhou-os a serem moderados e pacíficos. Questionado sobre as declarações poucas horas depois, Marcelo explicou a posição: “O que disse foi que o ataque terrorista serviu de pretexto.”

A questão começou durante uma visita ao Bazar Diplomático, no Centro de Congressos de Lisboa, num momento em que Marcelo Rebelo de Sousa argumentou, perante o chefe da missão diplomática da Palestina em Portugal que, “desta vez o radicalismo começou por parte de alguns palestinianos“. “Desta vez foi alguém do vosso lado que começou. Não deviam”, disse o chefe de Estado português, num diálogo com Nabil Abuznaid, em inglês.

No fim da conversa, o chefe da missão diplomática da Palestina em Portugal manifestou-se desapontado com as palavras de Marcelo Rebelo de Sousa.

“Se queremos ser justos, temos de condenar a violência dos dois lados, pelo menos, e de condenar a ocupação, essa é a raiz do problema. Se queremos ser justos. E o Presidente repetiu cinco vezes para a imprensa aqui o ataque de 7 [de outubro], mas não mencionou o povo de Gaza. Isto é injusto”, declarou Nabil Abuznaid aos jornalistas.

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O chefe de Estado referiu que Nabil Abuznaid “já cá está há muito tempo e sabe que a posição portuguesa não sai daquilo que é a posição das Nações Unidas” nesta matéria, a favor de dois estados, de Israel e da Palestina, “que Portugal apoia, é uma posição portuguesa desde sempre”.

Ao passar pela banca da Palestina, Marcelo Rebelo de Sousa cumprimentou Nabil Abuznaid, que agradeceu a visita do chefe de Estado português neste “tempo muito difícil”.

O Presidente da República concordou que “é um período difícil”, acrescentando: “Mas, sabe, penso que dependerá muito de vós. Têm de ser um exemplo de moderação”. O chefe de Estado defendeu também que a moderação é que vai permitir a paz e a construção de dois Estados, de Israel e da Palestina, que Portugal apoia  “desde sempre” , acompanhando a posição das Nações Unidas.

“É a moderação que vai permitir caminhos para aquilo que nós queremos, que é que haja paz, que haja respeito pelas pessoas e que haja a possibilidade de construção de dois estados, um Estado israelita e um Estado palestiniano”, defendeu o Presidente da República.

Marcelo Rebelo de Sousa defendeu que o ataque do Hamas de 7 de outubro em território israelita não contribui para a luta por um Estado soberano da Palestina. “Têm de ser moderados, de outro modo, perdem a vossa razão”, reforçou.

O chefe da missão diplomática da Palestina em Portugal observou que “a reação foi brutal” por parte das Forças Armadas israelita e defendeu que “a ocupação tem de acabar”.

“Isso é outra coisa. O facto de não haver ainda os dois Estados não significa que vocês possam atacar pessoas inocentes do modo como fizeram – alguns de vocês”, respondeu Marcelo Rebelo de Sousa, ressalvando que não confunde “o ataque terrorista com o desejo de paz do povo palestiniano como um todo”.

Nabil Abuznaid apelou ao fim da guerra: “Temos de parar esta guerra agora, mais pessoas estão a morrer”. Marcelo Rebelo de Sousa aconselhou os palestinianos a terem “calma e prudência”, a serem “cautelosos, inteligentes e pacíficos”, argumentando que, “de outro modo, torna-se mau para toda a gente” e que “o radicalismo cria um clima de radicalismo”.

“E desta vez o radicalismo começou por parte de alguns palestinianos, claro, um grupo” , prosseguiu o Presidente da República.

O chefe da missão diplomática da Palestina objetou que “isso não serve de desculpa para a reação brutal” de Israel na Faixa de Gaza e referiu que “dez mil pessoas morreram”. “Sim, eu sei que culpam Israel por isso. Mas desta vez foi alguém do vosso lado que começou. Não deviam”, retorquiu o Presidente da República.

Quando Nabil Abuznaid invocou “a ocupação de 56 anos”, Marcelo Rebelo de Sousa respondeu da mesma forma: “Eu sei, mas não deviam ter começado”. Israel não tem banca nesta edição do Bazar Diplomático que começou sexta-feira em Lisboa, nem os Estados Unidos da América.

“O que disse foi que o ataque terrorista serviu de pretexto”

Questionado pelos jornalistas sobre o que disse ao chefe da missão diplomática da Palestina em Portugal, Nabil Abuznaid, e à ideia de que alguns palestinianos não deviam ter começado a guerra, Marcelo Rebelo de Sousa começou por recusar que o tinha digo e corrigiu: “O que disse foi que, neste caso especifico, o ataque terrorista, como se deu, serviu de um pretexto.”

O Presidente da República argumentou que “não facilitava a nossa finalidade ter um Estado palestiniano e um Estado israelita” porque isso “dava pretexto aos que são adversários disso”. “Até acrescentei que os palestinianos como um todo não se podem confundir com o ataque terrorista de um grupo muito específico”, sublinhou.

E, numa posição mais geral, Marcelo reiterou que “Portugal tem a mesma posição sempre: acha que deve haver dois estados, um Estado palestiniano e um Estado israelita, que devem conviver pacificamente.”

O Presidente da República recordou as declarações de António Guterres para dizer que “o mais importante são as pessoas” e refere ainda que “o direito humanitário tem de valer para todos”. “O direito humanitário está a ser violado quer por atos terroristas que matam crianças, mulheres e vítimas inocentes quer por respostas a isso que matam crianças, mulheres e vítimas inocentes”, enalteceu o chefe de Estado.

Nas mesmas declarações, Marcelo Rebelo de Sousa citou ainda Francisco Louçã para dizer que é “intolerável haver a ideia de culpa coletiva”, que é “inaceitável” sacrificar vítimas inocentes por essa razão.

O grupo islamita Hamas, classificado como terrorista pela União Europeia e pelos Estados Unidos da América, que controla a Faixa de Gaza, lançou em 7 de outubro um ataque sem precedentes em território israelita, no qual matou e raptou militares e civis, incluindo crianças.

Segundo o Governo israelita, o Hamas fez mais de 1.400 mortos em Israel e levou cerca de 220 reféns, dos quais quatro foram entretanto libertados.

As forças armadas de Israel responderam ao ataque do Hamas com bombardeamentos e o corte do abastamento de água, comida, eletricidade e combustível à Faixa de Gaza, onde vivem mais de dois milhões de pessoas, avisando a população do enclave de que estaria em perigo se não se deslocasse para sul.

As autoridades da Faixa de Gaza reportam mais de 9.000 pessoas mortas pelos bombardeamentos israelitas, entre as quais mais de 3.000 crianças.