Os cidadãos em Portugal têm um nível de consumo menor face à média da União Europeia (UE), têm menos tempo de lazer e vivem numa sociedade mais desigual (em termos médios). Por outro lado, têm uma esperança média de vida superior. O Banco de Portugal fez as contas e estima que o índice de bem-estar no país ainda esteja abaixo da média da UE, embora tenha conseguido convergir desde 1995. O mesmo não se pode dizer do PIB per capita, que tem crescido em termos médios abaixo da média da união.
A conclusão consta de um estudo sobre bem-estar e PIB da instituição liderada por Mário Centeno, que constará no boletim económico de março. O Banco de Portugal olhou para os dois dados para colmatar as limitações de analisar apenas o Produto Interno Bruto (PIB), que ignora indicadores como o tempo de lazer, a esperança média de vida ou a desigualdade no país.
O índice de bem-estar calculado pelo Banco de Portugal (que segue uma metodologia entre várias possíveis), que inclui estes indicadores mais o consumo, também não é perfeito (deixa de fora, por exemplo, o nível de educação, o meio-ambiente ou a segurança), mas permite uma visão mais transversal sobre a evolução das condições de vida dos portugueses.
Segundo o estudo, em 2022, Portugal tinha um índice de bem-estar que se fixava em 87% da média. Por outras palavras, e olhando em detalhe, o bem-estar em Portugal é inferior face à média porque o nível de consumo é menor, os cidadãos têm menos tempo de lazer (ou seja, trabalham mais horas) e vivem numa sociedade mais desigual do que a média da UE. Por outro lado, Portugal pontua bem na esperança média de vida, que é mais elevada do que a média da UE. O Banco de Portugal sublinha que “a diferença no consumo per capita explica a maior proporção do diferencial negativo” e tem sido o principal responsável pela diferença face à UE, embora tenha aumentado nas últimas décadas.
O Luxemburgo, a Bélgica e os Países Baixos integram o grupo de países com bem-estar mais elevado, enquanto a Bulgária, a Letónia e a Hungria estão no extremo oposto. Portugal está na metade com menor nível de bem-estar.
O Banco de Portugal olha também para o período entre 1995 e 2022 e conclui que nos últimos 27 anos, o bem-estar aumentou em todos os países da UE, com crescimentos mais significativos nos países que aderiram mais tardiamente à UE (Portugal aderiu em 1986) porque beneficiaram neste período do mercado único ou de programas de financiamento.
Nesse período, o bem-estar em Portugal aumentou, em média, 2,7% por ano, o que refletiu sobretudo o aumento do consumo per capita (1,3%), da esperança média de vida (também 1,3%) e, em menor grau, da redução da desigualdade (0,1%). Já o contributo do tempo de lazer manteve-se praticamente inalterado, o que sinaliza que as horas trabalhadas por trabalhador não sofreram grandes alterações em 27 anos (como, aliás, na média da UE).
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Neste indicador, Portugal convergiu nos 27 anos em análise: o índice de bem-estar cresceu em média 2,7% ao ano, acima do índice da UE de 2,4%.
O PIB per capita teve um comportamento diferente: cresceu 1,3% ao ano, em média, abaixo de 1,5% na UE. “Em Portugal, o índice de bem-estar exibiu uma trajetória ascendente entre 1995 e 2022 — quer medido em paridades de poder de compra, quer em termos reais —, apontando para um processo de convergência do país face à UE. Esta conclusão contrasta com a obtida com base na análise do PIB per capita, onde não se observam progressos na aproximação aos valores da UE entre 1995 e 2022″, indica o Banco de Portugal.
A avaliação do nível de vida em Portugal com base no índice de bem-estar “é mais favorável que a resultante do PIB per capita”, isto porque Portugal passa da 20.ª posição do ranking com base no PIB per capita para 16.ª usando a medida de bem-estar (situando-se oito pontos percentuais mais próximo da média da UE).
A instituição deixa um alerta: o nível de consumo daqui adiante dependerá da “manutenção de condições favoráveis à acumulação de fatores produtivos e incorporação de avanços tecnológicos, bem como da aposta contínua na melhoria das qualificações da população e do funcionamento dos mercados”. Mas o aumento da esperança de vida e tempo de lazer, assim como a redução da desigualdade, “devem também continuar a fazer parte do processo de decisão da política económica devido ao seu impacto na sustentabilidade do crescimento e no bem-estar no médio e longo-prazos”.