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A diretora do Serviço Secreto dos Estados Unidos admitiu esta segunda-feira que a tentativa de assassinato do ex-Presidente Donald Trump foi o “fracasso operacional mais significativo” da agência em décadas. “A missão do Serviço Secreto é proteger os líderes da nossa nação. No dia 13 de julho, falhámos”, afirmou Kimberly Cheatle aos representantes durante uma audição no Congresso sobre o atentado contra o ex-líder da Casa Branca e candidato nas eleições presidenciais de 5 de novembro.

No dia 13 de julho, Thomas Matthew Crooks, de 20 anos, subiu ao telhado de um edifício próximo do comício do partido republicano e abriu fogo, matando uma pessoa e ferindo outras duas, antes de ser abatido no local.

Praticou tiro e comprou munições. As últimas horas de Thomas Crooks, o jovem que tentou matar Donald Trump

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As autoridades têm procurado pistas sobre o que motivou Crooks, mas até agora não encontraram nenhuma tendência ideológica que pudesse ajudar a explicar as suas ações. No seu telefone, encontraram fotografias de Trump, Biden e outros altos funcionários do Governo, e descobriram também que tinha consultado as datas da Convenção Nacional Democrata, bem como as aparições de Trump.

Esta segunda-feira, a responsável dos Serviços Secretos assumiu total responsabilidade pelos erros da agência relacionados com este ataque, que deixou Donald Trump ferido numa orelha.

Apesar da longa audiência perante a Comissão de Supervisão da Câmara dos Representantes, as respostas sobre o que levou à falha de segurança no comício foram escassas. Cheatle afirmou que já foram abertas investigações, nas quais o Serviço Secreto está a participar e escudou-se atrás de um eventual relatório.

“Não descansaremos até termos explorado todas as opções e não deixaremos pedras por levantar. A nossa missão não é política, é literalmente uma questão de vida ou morte. E 13 julho lembrou-nos disso”, garantiu a diretora.

Não havia ameaças e não há demissões: o que ficou esclarecido

A demissão foi o pedido mais consensual entre republicanos e democratas e a resposta foi a mais categórica de Kimberly Cheatle: não se demite e afirmou ser “a melhor pessoa para dirigir o Serviço Secreto”. Ainda assim, deixou claro que houve um erro grave e inegável e assumiu repetidamente a responsabilidade. Os deputados não se escusaram de lhe apontar a discrepância nas declarações.

Quanto aos acontecimentos concretos, a diretora reconheceu que Crooks foi visto pelos agentes no local, mas que não foi identificado como “uma ameaça e sim como suspeito”. A diferença? Um suspeito requer um menor nível de atenção por parte do Serviço Secreto e o atirador encontrava-se fora do perímetro de segurança e sem uma arma visível, pelo que não foi considerado uma ameaça. A diretora avançou ainda que tudo indica que o atirador trabalhou sozinho.

No domingo, os jornais Washington Post e New York Times tinham noticiado que altos funcionários do Serviço Secreto norte-americano negaram repetidamente pedidos de mais recursos e pessoal para a segurança do ex-Presidente Donald Trump durante os dois últimos anos. Sobre estes supostos pedidos, Cheatle garantiu que foram entregues todos os meios solicitados.

Perante muita insistência sobre este tema, confirmou que as solicitações incluíram detetores de explosivos — que encontraram os materiais no carro de Crooks — e meios aéreos, como drones.

As fontes do The Washington Post avançaram que os pedidos foram frequentemente rejeitados por várias razões, incluindo a falta de recursos. A representante democrata do Estado da Pensilvânia confrontou, então, Cheatle com os 3 mil milhões de dólares (cerca de 2,7 mil milhões de euros) de financiamento para o Serviço Secreto em 2024, valor que irá aumentar em 2025, questionando que percentagem era alocada para formação e para missões de segurança. A diretora respondeu que seria 30% do valor.

“Claramente a falta de financiamento não é problema“, conclui a deputada. Sobre a formação dos agentes, os democratas quiseram saber se os agentes receberam formação para o preconceito, que visa combater o preconceito na identificação de uma ameaça. A representante do Texas alertou para estudos que comprovam que as autoridades são menos prováveis de identificar uma ameaça num homem branco, como era o caso de Thomas Crooks. A diretora do Serviço Secreto garantiu que estas formações existiam e que não tinha sido o caso.

Já os republicanos quiseram saber se os agentes destacados eram os mais adequados para a missão, sublinhado o facto de a comitiva incluir várias agentes mulheres, mais baixas que Donald Trump. Os deputados questionaram se estes agentes tinham sido escolhidos para a missão devido ao princípio DEI [Diversity, Equity, Inclusion — Diversidade, Equidade, Inclusão, no português]. Cheatle reafirmou que todos os agentes têm o mesmo treino e que as escalas são feitas com antecedência, recusando acusações de falta de competência por serem mulheres.

Conservadores culpam mulheres dos Serviços Secretos por ataque a Trump

Kimberly Cheatle esclareceu ainda que a segurança dos candidatos (e dos restantes protegidos pelo Serviço Secreto) foi revista e reajustada e que a de Kamala Harris foi reforçada logo a partir de domingo à noite, quando Biden desistiu da corrida e a apontou como sua sucessora na candidatura democrata.

Além destes poucos esclarecimentos, os restantes foram adiados para os resultados da investigação inicial, que deve estar concluída em 60 dias. Também o prazo foi criticado, pelo facto de ser demasiado demorado, algo “simplesmente inaceitável” nas palavras da representante Alexandria Ocasio-Cortez.

As comunicações, o telhado e os agentes que erraram: o que ficou por esclarecer

A diretora do Serviço Secreto repetiu por várias vezes que “não tinha a certeza” e “que tinha de esperar pelos resultados da investigação”. A primeira destas hesitações foi sobre as comunicações entre as autoridades sobre a presença de Crooks nas margens do comício. “Não tenho um número exato para partilhar convosco hoje [esta segunda-feira], mas, pelo que pude perceber, entre duas e cinco vezes houve algum tipo de comunicação sobre um indivíduo suspeito”, respondeu.

Ainda estamos a analisar as comunicações e o momento em que foram transmitidas”, acrescentou, uma expressão que se ia repetir ao longo das mais de duas horas e meia de questões e críticas.

As comunicações voltaram a ser alvo de questões quando questionada sobre quando tinha contactado os agentes que tinham entrado em ação no comício. Cheatle disse no dia seguinte, o deputado republicano Pat Fallon afirmou que os registos telefónicos diziam 72 horas. A diretora admitiu que não tinha certeza absoluta da linha temporal.

A hesitação surgiu novamente quando questionada por que motivo o comício continuou depois de um suspeito — não uma ameaça — ter sido identificado. “Mais uma vez, não tenho a certeza de quando é que o Serviço Secreto e o contra-atirador foram notificados. Tenho de assumir que eles não sabiam que havia uma ameaça quando trouxeram o Presidente para o palco”, defendeu.

Sobre a ausência de agentes no telhado em que estava Crooks, Kimberly Cheatle justificou-se com o facto de este ser fora do perímetro — e portanto ao abrigo das autoridades locais — e o facto de o telhado ser demasiado inclinado. Fallon confrontou-a então com o facto de o telhado em que estava o contra-atirador ser mais inclinado, não tendo obtido resposta. Fallon expôs ainda as suas próprias tentativas com uma AR-15 num telhado a 150 metros de um alvo, tiros que acertou quase todos.

Telhado onde estava atacante de Trump “demasiado inclinado” para o Serviço Secreto, que esteve no interior do edifício

Sem resposta ficaram também as questões sobre os detalhes de protocolo, por uma questão de segurança, o nome dos agentes que tinham sido diretamente responsáveis — “ainda estamos à procura de responsabilidades”, declarou –, quantos invólucros de balas tinham sido encontrados no telhado onde se encontrava Crooks ou até por que motivo não tinham sido colocados atiradores no reservatório de água no local, o posto mais alto nas proximidades.

Convergências bipartidárias e aproveitamentos políticos

Apesar das divergências, democratas e republicanos concordaram: a falha de segurança do Serviço Secreto foi inaceitável e, como responsável da agência, Kimberly Cheatle devia pedir imediatamente a demissão. Os representantes criticaram ainda a “falta de transparência” da agência e a indisponibilidade da diretora para responder às questões, quer no Congresso, quer em conferências de imprensa.

Ainda assim, foi uma convergência curta. Os republicanos aproveitaram a audiência para encontrar “conspirações”. Primeiro, Virginia Foxx sugeriu que Cheatle só tinha chegado ao cargo através da influência de altas figuras do Partido Democrata. “Consegui chegar ao cargo porque passei 27 anos na agência e subi na carreira graças ao trabalho que desenvolvi em várias investigações”, assegurou a diretora do serviço.

Depois, Marjorie Taylor Greene pôs em cima da mesa uma “conspiração para matar o Presidente Trump”. Perante o “claro que não” veemente de Cheatle, Greene resumiu o “falhanço” à incompetência de Cheatle.

Do lado dos democratas, foram vários os que sublinharam as preocupações com o uso de armas e como esta ocasião tinha sido apenas mais uma em que um jovem teve acesso a armas semi-automáticas mal guardadas. Rashida Tlaib, democrata do Michigan, sublinhou que, ao contrário da tentativa de assassinato a um ex-Presidente e candidato, os civis, vítimas de violências com armas, não tinham direito a audiências no Congresso por cada tiroteio que testemunhavam.

Jamie Raskin encerrou a sessão, pedindo aos dois partidos para “concordarem na questão da segurança pública, como concordaram na questão da segurança presidencial”. A Kimberly Cheatle expressou “a perplexidade e indignação [do Congresso] perante o chocante falhanço operacional que levou ao desastre e à catástrofe no dia 13 de julho”.