A economia mundial deverá crescer menos em 2014 e no próximo e a retoma está a tornar-se cada vez mais desequilibrada, fazendo-se agora a múltiplas velocidades, com os Estados Unidos e o Reino Unido à cabeça das economias desenvolvidas, a deixarem a crise para trás, e as economias emergentes a enfrentarem mais dificuldades, diz o Fundo Monetário Internacional (FMI). Deflação na zona euro pode trazer sérios problemas à economia mundial.
Na atualização dos primeiros capítulos do World Economic Outlook, com as perspetivas económicas mundiais, na preparação da reunião anual do FMI e do Banco Mundial, que decorrem no final desta semana, o fundo revê em baixa as projeções para a evolução da economia mundial em 2014, face ao que esperava em julho: 3,3% de crescimento do produto interno bruto (PIB) em 2014 (menos 0,1 pontos percentuais do que em julho) e 3,8% em 2015 (menos 0,2% em relação à projeção anterior).
Nas últimas atualizações dos relatórios, o FMI tem vindo a alertar para os perigos que rondam a recuperação da economia no período pós-crise e em especial para uma retoma a duas velocidades. Nesta última atualização, o fundo já aponta para uma recuperação a várias velocidades. O ritmo da retoma já está mais dependente das especificidades de cada país.
A maior revisão em alta é feita para a economia dos Estados Unidos, a maior do mundo, durante este ano, que o FMI espera agora que cresça mais 0,5 pontos percentuais face ao que se esperava em julho, ficando-se, ainda assim, pelos 2,2%, mantendo a previsão do próximo ano. O Reino Unido também parece estar a deixar a crise para trás, diz o fundo, mas tanto nos EUA como no Reino Unido, que parecem estar em melhor posição, o ritmo de crescimento caiu face aos níveis pré-crise.
Em relação à zona euro, as notícias continuam a não ser animadoras. O fundo espera que a economia cresça menos 0,3 pontos percentuais em 2014, ficando-se pelos 0,8%, prejudicada essencialmente pelo menor crescimento dos seus principais motores: Alemanha, França e Itália.
O FMI espera que a maior economia da zona euro cresça menos 0,5 pontos percentuais que o estimado em julho, ficando-se pelos 1,4% do PIB este ano, já a França deve crescer menos 0,4% e a Itália 0,5%. Nos casos da Alemanha, França e Itália, as revisões em baixa não se ficam apenas por este ano. O fundo espera que estas economias cresçam menos também no próximo ano, em especial no caso da França, que deve crescer menos 0,5%.
Projeções atualizadas do FMI para a economia mundial. Fonte: World Economic Outlook, October 2014. Chapter 1.
O economista chefe do FMI, Olivier Blanchard, explica que o abrandamento cada vez maior da economia na zona euro se deve, parcialmente, a fatores temporários, mas também aos desequilíbrios acumulados até à crise, em especial no sul da Europa, e à queda do potencial de crescimento das economias um pouco por toda a zona euro.
As economias emergentes, que no período inicial da crise estavam a ser o principal motor da economia com taxas de crescimento significativas, têm agora um potencial de crescimento cada vez menor e algumas a enfrentar já um abrandamento considerável, em especial o Brasil.
Para o bloco das economias emergentes, o FMI reviu em baixa o crescimento esperado para este ano em 1,5%, mas também aqui as diferenças intra-bloco são consideráveis. A China, por exemplo, está a conseguir manter fortes taxas de crescimento da sua economia, apesar dos problemas no mercado imobiliário, a Índia está a recuperar e espera-se que em breve consiga chegar a taxas de crescimento superiores a 5%, graças em parte a medidas tomadas, mas também a uma renovação da confiança no país. Em sentido inverso está a Rússia, que antes da crise na Ucrânia já se via a braços com menores perspetivas de crescimento fruto da incerteza em torno da concretização de investimentos, perspetivas essas que ficaram mais negras depois de toda a incerteza na região e da dimensão geopolítica do conflito.
Abrandamento na zona euro pode trazer grandes problemas
Os riscos são negativos e estão claramente presentes, diz o fundo e um deles tem sido muito debatido nos últimos meses e muitas dores de cabeça tem dado aos responsáveis europeus: deflação na zona euro.
O FMI diz que existe o risco de a recuperação da zona euro estagnar, que a procura enfraqueça ainda mais, levando a baixa inflação e a tornar-se em deflação. “Este não é o nosso cenário base, porque acreditamos que os fundamentais estão a melhorar lentamente”, disse o economista chefe da instituição na conferência de imprensa de apresentação do WEO, mas “caso isso venha a acontecer, seria claramente uma questão significativa para a economia mundial”.
Outros dos riscos, segundo o FMI, estão na complacência dos mercados em relação ao risco. O já extenso período com taxas de juro baixas que se vive estará a levar os investidores para produtos mais arriscados em busca de maior rendibilidade, o que pode estar a fazer com que os mercados estejam a subvalorizar o risco.
Finalmente, os riscos geopolíticos, em especial com a crise na Ucrânia, continuam a aumentar. Os problemas na região do Médio Oriente também contribuem para o aumento destes riscos, mas até agora os efeitos macroeconómicos parecem estar confinados a essas regiões. No entanto, o FMI vê riscos reais de estes virem a ter impacto nos preços da energia de forma a ter um impacto negativo significativo na economia mundial.
“Mas, claramente, o risco de que o possam fazer no futuro existe, e pode afetar a economia mundial de forma considerável”, afirmou Olivier Blanchard.