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Aos 48 anos, Pedro Carvalho, técnico superior da câmara de São João da Madeira que até aqui dirigia a Divisão da Juventude e Desporto daquele município, foi escolhido pelos bispos católicos portugueses para liderar o Departamento Nacional da Pastoral Juvenil (DNPJ), uma estrutura eclesiástica nacional que se dedica a idealizar e a promover a relação entre a Igreja Católica e os jovens. É o terceiro leigo a ocupar este cargo (numa instituição que tem gradualmente colocado cidadãos comuns em lugares anteriormente reservados aos membros do clero), mas é o primeiro a fazê-lo a tempo inteiro: um sinal, diz, de que os bispos estão mais atentos à necessidade de levar a mensagem cristã às camadas mais jovens num tempo marcado pela secularização.
Numa entrevista ao Observador poucos dias depois de assumir o cargo, Pedro Carvalho fala dos desafios da Igreja em chegar à geração Z, uma geração politicamente comprometida com causas como o ambiente ou os movimentos feministas, e diz que a Igreja tem de se colocar ao lado desses jovens nas suas lutas. O responsável diz mesmo que gostava de ver os movimentos da Igreja Católica a marcharem na rua ao lado dos mais jovens em manifestações contra as alterações climáticas, em vez de se mobilizarem apenas para protestos contra o aborto e a eutanásia. “Se formos à Laudato Si’, tem imensas frases que podiam ser cartazes”, diz, referindo-se à encíclica do Papa Francisco sobre o ambiente.
O novo responsável pela política de juventude da Igreja em Portugal defende que a Igreja tem de deixar de lado a ideia de que tem o monopólio da interpretação dos textos bíblicos e reconhece que será “residual” o número de jovens, mesmo entre os que frequentam os movimentos católicos, que conhecem realmente os Evangelhos e vida de Jesus Cristo. A responsabilidade, diz, é da “educação muito formal da Igreja”, que não dá espaço aos jovens para que descubram “por si” a revolucionária mensagem do Cristianismo. Pelo contrário, os jovens contactam mais frequentemente com uma versão já resumida pelas interpretações pré-formatadas da instituição eclesiástica.
Pedro Carvalho relativiza também as questões da moral sexual. Diz não acreditar que é pelas posições da Igreja sobre a sexualidade que os jovens se afastam da instituição, mas considera que é necessário compreender os jovens de hoje. Repetindo as palavras do Papa Francisco em Lisboa, sublinha que a Igreja não pode ser uma alfândega que deixa entrar uns e fecha a porta a outros — e que não pode ser, por exemplo, o facto de um jovem viver com a namorada antes de casar a impedir o encontro entre os jovens e a Igreja. “Se tivermos de nos atualizar, que nos atualizemos”, assume ainda.
Sobre uma pelo menos aparente aproximação entre os jovens rapazes e a extrema-direita, Pedro Carvalho alerta que “nos extremismos não estão os valores cristãos” — apesar de figuras como Trump ou Ventura se assumirem como defensores desses valores — e que “não é por andar com uma Bíblia debaixo do braço ou ajoelhar-se na igreja que somos cristãos”.
“De facto, nós não conseguimos ainda entender os jovens de hoje”
Que sinal é que a Igreja está a tentar dar ao decidir, pela primeira vez, pôr uma pessoa a tempo inteiro a tratar das questões da juventude?
O sinal é de grande ousadia. A Conferência Episcopal lançou-me o convite e foi ousada em lançar este desafio a um leigo, a uma pessoa comum, entre tantas comuns, também ele pecador — e poder desempenhar estas funções. Não sou o primeiro leigo, sou o terceiro leigo nestas funções de dirigir o Departamento Nacional da Pastoral Juvenil. Portanto, é mesmo este sinal: um sinal de grande ousadia e de dizer que estamos atentos aos jovens. O pós-Jornada Mundial da Juventude fez com que os bispos pensassem numa nova abordagem.
A Igreja percebeu que estava a ficar para trás com os jovens?
Não penso nisso, até porque no mesmo dia — no dia 14 de novembro — houve dois sinais da Conferência Episcopal. Primeiro, a nomeação do diretor da Pastoral Juvenil; e também devolver um documento, para auscultarmos os jovens e todas as estruturas eclesiais, que serão as bases de uma nova referência para a pastoral juvenil em Portugal. Portanto deu aqui dois sinais.
Numa entrevista recente ao Observador, o teólogo Tomáš Halík refletia sobre a ideia de uma Igreja que não consegue dar respostas às grandes questões dos homens de hoje — especialmente quando chegam àquele momento de convulsão que é a adolescência e a juventude. Genericamente, contactamos com a fé em criança e essa é a primeira perspetiva que temos da fé — na catequese, uma relação infantil com a fé, com a ideia de um Deus controlador e castigador —, até que chegamos à adolescência e começamos a questionar tudo: quem é Deus, como é que sabemos que existe, se faz ou não sentido acreditar, e por aí fora. Nesta fase, diz Halík, a Igreja continua a insistir numa abordagem infantil à fé. Isso é um problema que a Igreja precisa de ultrapassar?
É verdade, e quem sou eu para pôr essas palavras de Tomáš Halík em causa, mas adianto mais um ponto. O Papa Francisco diz que nós chegamos à adolescência, fazemos o crisma e é como se fosse o “crisma da extrema-unção”. As pessoas fazem o crisma e depois vão em debandada embora. Isto acontece porque, de facto, nós não conseguimos ainda entender os jovens de hoje. Temos de compreendê-los e torná-los protagonistas. Os jovens têm de ser protagonistas de um tempo novo, de um tempo que está a surgir, mas ainda não conseguimos sonhar com eles. O Papa Francisco fala muito do sonho, do “laboratório de sonhos”. Ainda não conseguimos que a Igreja seja a casa dos jovens. Quando aceitei este desafio, quis embarcar nesta aventura pelos jovens, a partir da beleza e do amor, tentar escutá-los, compreendê-los, ler os sinais dos tempos, para através deles nós construirmos uma Igreja interpeladora, alegre, poética e acolhedora. Digo que é preciso a Igreja entrar no algoritmo dos jovens. Isto é, nós ainda não percebemos qual é o algoritmo deles e, às vezes, a Igreja parece que vai estragar aquele algoritmo. Temos de ter essa capacidade de a Igreja ser uma casa onde nós possamos acolher as aspirações, os sonhos deles, e também as fragilidades e inquietações que eles têm. E darmos respostas com a linguagem deles.
Entrevista ao teólogo Tomáš Halík: “A Bíblia pode ser levada à letra ou ser levada a sério”
Já tem trabalhado alguns anos nestas áreas da juventude dentro da Igreja — esteve também envolvido na preparação da JMJ. Que sinais dos tempos é que são esses? Estava a dizer que a Igreja não consegue compreender os jovens. Mas o que é que tem ouvido dos jovens?
Tenho ouvido, primeiro, que nós devemos ter tempo em silêncio, para os escutar. A minha primeira palavra foi “obrigado” e a segunda foi “eis-me aqui para escutar, refletir e agir”. Escutar, questionar, ouvi-los em silêncio, falar com eles, refletir com eles sobre todas as dimensões da sua vida.
E como é que isso é possível se os jovens não se aproximarem? Se a Igreja não for capaz de os atrair?
Temos de ter o que o Papa Francisco diz: ser uma Igreja em saída. O que é que o Papa Francisco nos disse na JMJ? Disse muitas coisas aos jovens, mas a nós, adultos, deixou-nos uma missão irrecusável: aventurarmo-nos no mar da evangelização e missão. Isto foi dito no Mosteiro dos Jerónimos. Quem lê aquele discurso para as estruturas, percebe que é muito claro, está lá tudo dito. Esta missão irrecusável aponta três caminhos: fazermo-nos ao largo, fazermos a pastoral junto dos jovens e não ter medo de lançar redes para nos fazermos pescadores de homens, de mulheres e jovens. Nas dimensões da vida deles, nós temos de escutá-los e percebê-los — e, depois, ajudá-los, trabalhar com eles. A ecologia, a sustentabilidade, a solidão, a espiritualidade, a fé, a saúde, a saúde mental, o desenvolvimento sustentável, as migrações… Aqueles temas em que eles têm uma voz, nós temos de compreender aquilo que eles nos estão a dizer, à Igreja. A nós, adultos, cabe-nos acompanhar, sermos facilitadores, sermos mentores de uma nova perspetiva de realidade da Igreja.
Mas parece-lhe que a Igreja também tem de mudar para dizer alguma coisa de significativo aos jovens de hoje? Por exemplo, o número de casamentos ajuda a perceber esta realidade: em 1990, houve 19.691 casamentos civis e em 2023 foram 27.999, ou seja, um aumento de 42%; se olharmos para os casamentos católicos, de 1990 para 2023 passaram de 51.963 para 7.862, ou seja, uma queda de 85%. Os jovens já não olham para a Igreja — e a Igreja já não se apresenta — como uma instituição com autoridade para validar o percurso de vida das pessoas, como durante séculos quis ser?
Se calhar um dos problemas da Igreja foi mesmo ser essa autoridade, ser muito vertical, dizer o que é que nós temos de fazer. O que nós temos de procurar neste tempo novo — e que o Sínodo nos dá — é que nós consigamos, enquanto Igreja, fazer com que os jovens de hoje habitem o espaço público e nós dando ferramentas para eles perceberem e entenderem a rua, o espaço público, o território. Mas dava mais um exemplo. Além desses números que o João deu, este fim-de-semana, em Setúbal, o D. Américo Aguiar falava de menos 10 mil pessoas a frequentar as igrejas. Se formos também a números, o target de que estamos a falar é de 1,6 milhões de jovens. Mas só cerca de 50% é que são católicos. E, depois, se formos na perspetiva de ver quantas vezes é que frequentam o culto e as atividades semanalmente, então começa a reduzir. Gosto de trabalhar com números e, a partir de números, fazermos a nossa visão, a nossa evangelização, junto de jovens. É um facto, não podemos desmentir. Mas temos de criar com eles, fazer com que sejam eles a dar as respostas da Igreja do futuro. Os jovens são o futuro e os jovens são o presente. Então, com eles, façamos o futuro presente. É isso que temos de conseguir. Um estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos diz que a grande preocupação dos jovens. Nós temos uma exortação apostólica do Papa Francisco fantástica, a Laudato Si’. Temos de esmiuçar aquilo, fazer que eles se aproximem daquele texto e percebam o que é que a Igreja também pensa. O Papa tem sido uma das vozes mais ativas e ativistas no ambiente. Então porque é que os jovens não se revêm naquele texto ou na ideia da Igreja? Provavelmente é comunicação.
Será que é comunicação? Ou que, por outro lado, há a ideia de que a Igreja, apesar de ter uma perspetiva sobre o ambiente que se alinha com as prioridades dos jovens, continua a ser vista como uma instituição que não diz muito de significativo à juventude? Há pouco mencionou a questão da sinodalidade. Basta olharmos para o relatório português da primeira fase para encontrar frases sobre a relação da Igreja com os jovens que são muito demolidoras. Por exemplo: “Os jovens referem que o principal motivo que os afasta da Igreja e os impede de caminhar juntos assenta na diferença existente entre o seu modo de pensar e a doutrina da Igreja Católica, referindo que a Igreja tem uma mentalidade retrógrada e desajustada dos tempos em que vivemos.” Continuando a ler este documento, encontramos exemplos concretos que têm a ver, por exemplo, com a moral sexual. Como é que a Igreja pode pensar a sua mensagem para os jovens dos dias de hoje?
Em 2019, houve uma exortação apostólica dirigida aos jovens, Christus vivit, que tem uma frase que fecha o documento: “A Igreja precisa do vosso — dos jovens — ímpeto, das vossas intuições, da vossa fé. Nós temos necessidade disto. Quando chegarem onde nós ainda não chegámos — nós, Igreja —, tende paciência e esperai por nós.”
Mas porque é que os jovens hão de dizer que sim a esse apelo do Papa? Há pouco dizia que a Igreja pode ser uma plataforma para colocar os jovens a falar no mundo, na rua. Mas há outras plataformas, outros movimentos civis, que parecem ter maior adesão.
Bem, o papel da Igreja é a evangelização. Enquanto diretor nacional, não posso fugir disso, para trazer o Evangelho para o centro da vida, para o estilo de vida das pessoas e para o modo de pensar. Nós mostrarmos o Evangelho, Jesus Cristo, que é o modelo: é um Cristo vivo, ressuscitado. Uma das frases é “ide por todo o mundo e anunciai a boa nova” — boa nova deste Cristo vivo. Claro que nós temos sempre esta sensação de que não estamos a chegar aos jovens, que eles estão desalinhados. Às vezes, tendo a pensar divergente disso. Dou dois ou três exemplos. Este fim-de-semana, tive a oportunidade de estar em Leiria no primeiro encontro nacional de Cáritas Jovens. Vi gente de quase todo o país, jovens a quererem participar nas suas paróquias, no seu território de determinadas maneiras. No domingo de manhã, num passeio familiar, encontrei um grupo de escuteiros a limpar a Ria de Aveiro. No domingo à noite tive o privilégio de ir assistir a um coro que surgiu na Jornada Mundial da Juventude, também eles com jovens, a dar um espetáculo num espaço cultural. Bem, eles estão connosco também — mas nós temos de chegar a mais. Esse chegar a mais não é termos um pensamento inquisidor, não é dizermos “tu pecaste”; é compreensão, escuta, compreender “porque é que estás a pensar nisso?” E nós, depois, mostramos: o Evangelho diz-nos isto.
“Acredito numa Igreja horizontal, transversal”
Tocou aí num ponto interessante, que é indesmentível: olhamos para a realidade do país e encontramos movimentos de jovens católicos, os escuteiros são a maior organização de juventude do país. Há de facto muito envolvimento dos jovens em movimentos e instituições. A questão é que podemos fazer a mesma pergunta a quem está fora da Igreja como a esses jovens que referiu: mesmo esses jovens que estão dentro dos movimentos encontram nas perspetivas da Igreja, na doutrina da Igreja, nas suas propostas concretas, algo de significativo para as suas vidas? Ou estão nesses movimentos porque têm lá os amigos, porque é o movimento da sua terra, etc?
Isso é verdade. Quando os jovens se aproximam da Igreja, é por várias razões. Os amigos, a tradição dos pais, por quererem, porque descobriram o Evangelho… O nosso propósito é que consigamos que eles sejam adultos em Cristo. Adultos em Cristo quer dizer que eles consigam perceber o Evangelho e como é que o Evangelho pode ser útil na sua vida, na sua prática diária. Esse é o grande objetivo: não estar lá por estar, mas estar lá porque compreendem o Evangelho, percebem como que é que Jesus Cristo e as suas ações podem fazer sentido no seu dia-a-dia, nessa vivência diária e, sendo assim, percebam que pode haver uma sociedade diferente de justiça, de paz, de amor, que é isso que nós queremos. Se nós conseguirmos imitar os ensinamentos do Evangelho — não é a Igreja, mas o Evangelho —, acho que conseguem perceber que a vida pode ser melhor, mais feliz, mais alegre. Aquele sentido de “eu sou feliz, é bom estar na Igreja, sinto-me melhor no meu dia-a-dia, na minha relação com os meus amigos, com os meus pais, com os meus avós”. Mas também precisamos de pessoas que ensinem bem o Evangelho.
Dentro da Igreja não há só ensine bem, é isso que posso depreender da sua expressão?
Acho que há espaço para todos. Todos temos talentos. Agora, é verdade — e isso também um dos nossos eixos, no departamento — que queremos que as pessoas que acompanham os jovens, que são catequistas, que são educadores dos jovens, também tenham este processo de poder transmitir melhor o Evangelho, que eles consigam compreender para serem jovens adultos e habitem o espaço público de uma forma feliz.
Ouvindo tanto os teólogos como aqueles que estudam a demografia, por exemplo, sobre este fenómeno de secularização contemporâneo, a conclusão aponta praticamente sempre num sentido: as pessoas não se estão necessariamente a tornar ateias, a afastar-se de Deus ou da dimensão transcendental da vida. Afastam-se de fórmulas institucionais, da Igreja propriamente dita, de doutrinas. É incontornável que aqueles quatro textos do Evangelho continuam a ser uma pedrada no charco na história da Humanidade — e Jesus continua, dois mil anos depois, a ser uma figura referencial tanto para crentes como para ateus. Ora, a Igreja apresenta-se como tendo a missão de transmitir esta história. Está a falhar alguma coisa? Os jovens têm contacto com o Evangelho? Ou têm contacto com interpretações, catecismos…?
Isso é uma interrogação minha. Uma das razões que me fez dizer que sim a este departamento foi eu achar que podia ajudar a transformar um bocadinho a Igreja. Não consigo perceber — é uma interrogação minha — como é que uma história, que é transmitida pelo Novo Testamento, que é bonita, que fala de paz…
… que é revolucionária.
Que é revolucionária! Como é que nós não conseguimos comunicar esta história com os jovens? Vamos lá ao início: se calhar, estamos a infantilizar a palavra. Em vários textos, mesmo na Igreja, eu posso ter uma interpretação enquanto criança e adolescente, outra em velho, outra em jovem…
E os jovens será que leram esses textos? Ou tomaram contacto com homilias e catecismos? Se for a um grupo de jovens católicos ou um grupo de escuteiros e perguntar “já leste o Evangelho?”, qual será a resposta?
Provavelmente, será residual. Porquê? Lá está, esta educação muito formal da Igreja a transmitir o Evangelho, que é muito formal. Não é uma educação não-formal, ou seja, eles descobrirem por si o Evangelho. Muitas vezes, damos takes. Uma frase aqui, uma frase ali, parece que aquilo resume todo o Evangelho. Não. Se nós conseguirmos ter esse contacto e eles descobrirem por eles…
E interpretarem.
E interpretarem. É isto a educação não-formal. Não é aquela formalidade, “está aqui este texto e agora vai aqui alguém mediar”. O futuro não é esse e temos de antecipar o futuro. O futuro é construir com eles a interpretação do Evangelho. E, com eles, fazer essa vivência do Evangelho. Se começarmos a meter aqui a Igreja vertical — e eu acredito numa Igreja horizontal, transversal…
No fundo, a ideia de que a Igreja tem o monopólio da interpretação.
Exatamente. Não pode. Temos de os acompanhar na sua descoberta. Eu fui tanto mais feliz na minha adolescência — e também tive pessoas que me ajudaram nisso, em movimentos e congregações — a interpretar o Evangelho. Há aqui um ponto importante: nós temos a tendência de olhar para os jovens e apresentar a mesma receita médica. Entre os 14 e os 30 anos, tomem lá que isto é tudo igual. Temos de começar a pensar nesta capacidade de comunicar esta história bonita de forma segmentada. Caímos naquele erro, de que já falámos, de infantilizar a Igreja em toda a sua dimensão. Um jovem de 14 anos pensa de forma diferente de um jovem de 18 ou de 20. O de 20 anda preocupado com a habitação ou com o primeiro emprego e vai olhar para aquela leitura de uma forma, enquanto eu, com 14 anos, estou preocupado com a minha adolescência e com a minha relação com os meus amigos — e olharei para aquele texto de maneira diferente. Capacitemos os educadores, os facilitadores, os mentores, para ouvirem jovens de 14 anos e de 18 anos e, em relação ao mesmo texto, terem um pensamento diferente na transmissão.
E nesse trabalho pode ajudar o facto de haver mais leigos como o Pedro em cargos de tomada de decisão? Em vez de a abordagem da Igreja ser sempre feita por um padre, com a autoridade que associamos a um membro do clero?
As minhas referências são padres, porque também me ajudaram, teologicamente, a compreender os textos dos Evangelhos. Mas o Sínodo é um bocadinho isso: a comunhão, a participação e a missão. Está lá dito que os leigos têm de participar. É uma Igreja de que façam parte todos na decisão — já não é aquela Igreja vertical. Acho que esta é a grande pedrada no charco, até pela urgência que é. O Papa Francisco tornou isto muito urgente, está aprovado, tomem lá, vamos chegar às paróquias. As paróquias não podem ser pequenas e castradoras no sentido de nós imaginarmos o futuro, arriscarmos o futuro, de nos aventurarmos, sermos poéticos como o Papa Francisco diz. É verdade que os leigos trazem uma dimensão da vida diferente dos consagrados, dos padres e dos bispos. Mas somos todos Igreja. Eu sou mais uma peça neste caminho para ajudar na evangelização.
A ideia muito repetida pelo Papa de que o cria a pertença é o batismo, não é a ordenação. Mas a verdade é que continua a haver uma desigualdade funcional…
Claro. Mas vamos lá ver: o primeiro anúncio do Evangelho, que nós pensamos que é aos cinco ou seis anos, pode ser aos sete, aos dez, aos 12, aos 20, aos 30 ou aos 40. O que temos de fazer é evangelizar, evangelizar, evangelizar. É esse o nosso desafio enquanto Igreja. Agora, se o contacto connosco é aos 40 anos, que seja aos 40 anos. Tenho um exemplo na minha família. Tenho três filhos, e o do meio entrou mais tarde do que o irmão mais novo. Foi o chamamento, sentiu-se aí bem.
“Muitas vezes somos castradores”
Estávamos a falar sobre a ideia de um certo afastamento das pessoas, sobretudo das camadas mais jovens, de uma forma institucional de Igreja. No caso concreto dos jovens adolescente, um dos aspetos que surge sempre é a moral sexual. Parece-lhe que as questões da moral sexual contribuem para um certo afastamento dos jovens? A Igreja não tem acompanhado a evolução dos tempos? Que sentido faz, hoje em dia, insistir na ideia de que um jovem é pecador porque vive com a namorada, por exemplo?
Nesse aspeto, há todo um mar de desafios da Igreja para a compreensão dos jovens dos dias de hoje, embora eu não ache que eles se afastem porque a Igreja diz isto sobre a sexualidade ou sobre outras temáticas.
Acha que esse não é um fator?
O Papa Francisco, na Jornada Mundial da Juventude, disse uma coisa: todos, todos, todos. “Todos, todos, todos” quer dizer provocar esta aproximação e nós podermos explicar, à luz da Igreja, aquilo que é o nosso pensamento. E, ao mesmo tempo, compreendê-los.
Mas eu estava a dar um passo à frente: “Todos, todos, todos” podem aproximar-se para ouvir a explicação da perspetiva da Igreja. Essa perspetiva até tem sido explicada. A questão é se continua a fazer sentido. Novamente, citando o relatório do Sínodo: “Uma Igreja que não se adapta aos ritmos e às exigências da família de hoje, na sua ampla variedade, desde as questões relacionadas com a vivência da sexualidade conjugal aos novos ritmos das famílias, sobretudo as que têm filhos. A questão relativa à contraceção apresenta-se como um elemento contrastante entre a tradição versus a normalidade trazida pela secularização, uma posição que, aos olhos dos jovens, se apresenta como desatualizada da realidade.”
Bom, o Papa Francisco também diz outra coisa, e disse-o em Lisboa: a Igreja não pode ser uma alfândega, onde entram uns e não entram outros. Cabe à Igreja explicar aquilo que o Evangelho nos transmite, de uma forma muito transparente — e as pessoas fazem as suas escolhas. Não me preocupa tanto as pessoas estarem em união de facto ou que vivam a sua sexualidade — que isso não seja um impedimento à entrada na Igreja. Ou melhor, no seu contacto com a evangelização. Isso não pode ser um impedimento. O que nós temos de entender é que isso é assim. É uma realidade. Mostramos o Evangelho e explicamos o que é que nós achamos. Se isso quebra a aproximação? Acho que não, sinceramente. Acho que há outras coisas que afastam mais do que essas.
Por exemplo?
O clericalismo da Igreja. Chegar a uma paróquia e não ser ouvido, não ser escutado. Se calhar, estou ali a aproximar-me e só por não ter um abraço, um acolhimento, afasto-me. Se calhar é mais isso do que outras situações.
Só para clarificar a questão anterior, eu não estava a dizer que um eventual julgamento feito pela Igreja à vida dos jovens fosse um impedimento à aproximação para a escuta; a questão é se faz sentido ser um impedimento, por exemplo, aos sacramentos. Nesse aspeto, a Igreja continua a ser uma alfândega, não?
Depende de quem estiver a liderar. O Papa tem dado muitos exemplos no seu papado sobre as nossas abordagens. Muitas vezes somos castradores. Não podemos ser castradores, ou a alfândega. Nos projetos em que já estive envolvido, incluí sempre todos. Não é novidade para mim. Mas também sei que noutras práticas, noutros territórios, eventualmente mais conservadores, podem olhar para estas temáticas de maneira diferente. O mundo está em constante convulsão. Acredito que existe essa visão castradora. Nós temos é de ver nas palavras e das ações do Papa um exemplo a seguir.
“O que nós temos de mostrar é que nos extremismos não estão os valores cristãos”
Temos assistido, nos últimos anos, a uma aparente viragem à direita das camadas mais jovens, concretamente entre os rapazes. Na recente vitória de Trump, por exemplo, há dados que apontam para um papel muito importante do voto dos jovens rapazes. Em Portugal também se tem verificado alguma tendência nesse sentido. Compreender esta realidade sociológica é importante para perceber a implantação da Igreja entre as novas gerações, incluindo a geração Z?
O campo de ação do departamento nacional já são três gerações — Z, Y e Alfa. Voltando um bocadinho atrás: nós, enquanto evangelizadores, precisamos de mostrar o Evangelho e de ser missionários no nosso dia-a-dia. Capacitarmos os jovens para que eles vivam o seu dia-a-dia cristão e habitem o espaço público. Se nós conseguirmos chegar a mais jovens, provavelmente eles vão ter um entendimento sobre a sociedade, sobre os extremismos. Na segunda-feira estive a conversar com uma jovem que é a nossa representante, da Conferência Episcopal, na COMECE Youth Net [Comissão dos Episcopados da Comunidade Europeia, que representa os bispos católicos europeus junto das instituições da UE], que precisamente no último ano foi uma reflexão sobre os extremismos na sociedade. O que nós temos de mostrar é que nos extremismos não estão os valores cristãos. Não estão. E que eles consigam compreender isso.
Curiosamente, são os partidos mais próximos dos extremos que se dizem os verdadeiros defensores dos valores cristãos — Ventura, Trump, etc.
Mas também temos gente católica ou cristã nos outros extremos.
Sim, mas estou a falar dos partidos que dizem que defendem os valores cristãos. Isto é um problema?
O que eu peço muitas vezes aos políticos — e nós, Igreja, temos de mostrar isso — é que falem verdade, que sejam sérios e que sejam éticos nos atos e ações. Está aqui o Evangelho. Apropriar-se do Evangelho para não sei o quê não é bom.
Para ganhos políticos?
Exatamente, para ganhos políticos. Não é por andar com uma Bíblia debaixo do braço ou ajoelhar-se na igreja que somos cristãos. Os cristãos são-no nos atos e nas ações. E é disso que nós precisamos deles. Cada vez mais nestes extremismos já não há lugar ao bom-senso, à concórdia que nos é cara, ao poder de escuta e de diálogo. É isso que nós temos de mostrar aos jovens, para eles entenderem também o outro lado. Nós não vamos aqui, mais uma vez, dizer “vocês são pecadores”. É mostrar como é que pode ser bom viver numa sociedade em que não haja extremos.
Voltando um pouco ao início da minha pergunta, um certo reforço, entre os jovens rapazes, do voto em partidos mais perto da extrema-direita é algo que pode preocupar a Igreja quando tenta perceber a sua implantação entre os mais jovens? Por exemplo, em temas como o alargamento da ordenação sacerdotal às mulheres, que a Igreja, apesar de dizer que vai estudar mais uma vez o diaconado feminino, continua a recusar liminarmente. Isso faz assentar a estrutura hierárquica da Igreja numa desigualdade fundamental entre homens e mulheres.
No sacramento da ordem, sim. Nos ministérios, não. A Igreja já permite os ministérios quase todos às mulheres.
A questão é o quase.
O sacramento da ordem, precisamos de mais reflexão sobre isso. E também porque a Igreja é universal. Temos de entender isto. A Igreja é universal e há vários contextos neste planeta. Não é num estalar de dedos que a Igreja da Europa, que até pode perceber isso, e a Igreja de África ou da Ásia pode não compreender… Temos de entender os contextos universais da Igreja.
O ponto-chave da sua frase é o “quase”. Pode dizer-se que a maioria dos serviços e ministérios podem neste momento ser desempenhados por mulheres, mas o chefe de Estado do Vaticano continua a não poder ser uma mulher. Na hierarquia eclesiástica, continua a haver uma desigualdade.
As fotografias mostram isso. Não há aqui que fugir. Mas a Igreja também já deu passos muito interessantes, já há alguns anos. Em Aveiro, na coordenação da pastoral juvenil, já esteve uma mulher há dez anos. Neste momento, nos secretariados, já são cinco mulheres. A questão do “quase” é na ordem — não é nos ministérios.
Isto até era um parênteses na questão. A ideia de a Igreja continuar a recusar o sacramento da ordem às mulheres pode contribuir para atrair para o interior da Igreja também os mais conservadores e a alienar as jovens raparigas, por exemplo? É que, paralelamente, parece haver pelo menos a perceção do ressurgimento de algum conservadorismo entre os mais jovens na Igreja. Não sei se também tem essa perceção.
Às vezes as perceções não são aquelas que existem nas realidades paroquiais. Agora, a Igreja não vai ser diferente por haver pessoas que vivam de uma forma mais conservadora e mais radical — não quero dizer a palavra “fundamentalista” — o Evangelho e outras de uma forma mais leve, mais progressista. A questão é que essa forma de viver não implique que seja a Igreja a marcar o ritmo e que sejamos castradores e alfândegas. Isso é que esses supostos movimentos que estejam a surgir não podem permitir. No meu grupo de jovens, quando eu era jovem, eu vivia a minha prática crista de uma forma e ao meu lado estavam a viver de outra forma. Haja respeito entre todos. Entre uns e outros.
Mas preocupa-o, como responsável de um organismo da Igreja, o crescimento dos extremismos entre os jovens? Acha que a Igreja deve agir?
Preocupa-me o extremismo, como é óbvio. E há aqui um campo fértil para a Igreja mostrar um caminho diferente.
“Vamos ter de deixar de lado os caminhos tradicionalistas de abordar o Evangelho”
A geração Z, por exemplo, que é esta mais recente, será talvez a geração mais empenhada de sempre em assuntos como a luta climática, os movimentos feministas, a luta antirracista, e por aí fora. Como dizia há pouco, isto pode não significar necessariamente um afastamento da dimensão transcendental da vida, nem há qualquer indicador nesse sentido, mas pode estar associado a um afastamento da Igreja, da instituição? A Igreja tem de ir mais vezes buscar estes temas para cima da mesa?
Um dos meus compromissos é que o Departamento Nacional da Pastoral Juvenil seja a casa dos jovens. Que percebamos todas as dimensões da sua vida. Todas as dimensões são todos os temas para cima da mesa. Que possamos estar com eles. Eu estou muito feliz, muito alegre, de ver cristãos comprometidos com o cuidado da casa comum. Fico muito contente. O que às vezes não percebo é que nós deixamos para algumas associações de ação climática que façam manifestações — e nós não consigamos mostrar, nessas manifestações, a nossa manifestação enquanto cristãos. Se formos à Laudato Si’, tem imensas frases que podiam ser cartazes a dizer “o Papa Francisco diz isto”.
Então, já que diz isso, porque é que, na sua opinião, a Igreja parece ter capacidade de mobilização para manifestações na rua sobre dois ou três temas — como o aborto e a eutanásia quase sempre — e não vemos, numa manifestação pelo clima ou numa manifestação em defesa dos migrantes a presença clara da Igreja?
É verdade.
Gostava de ver movimentos católicos nessas manifestações?
Gostava muito. Porque nós temos isto, temos este trabalho, temos esta preocupação com a casa comum — não há outra! Vou dar um exemplo muito concreto. Quando chegaram os símbolos [da Jornada Mundial da Juventude] a Aveiro, nós fizemos uma provocação aos jovens, quisemos ser disruptivos e quisemos que eles participassem na receção dos símbolos. Foi a primeira vez que os símbolos andaram de comboio, de Braga a Aveiro. Depois, no largo da estação, desafiámos os jovens a trazer as suas mensagens, a descer a Avenida Doutor Lourenço Peixinho, que é uma avenida de referência nossa, e a passar no Teatro Avenida, que é histórico, a manifestar a nossa fé. Com cartazes, sem pálio ou cruzes à frente. Apareceram frases da Madre Teresa de Calcutá, do Papa Bento XVI, de João Paulo II, de Francisco, de Santa Joana — e eles fizeram isso. Já fizemos, portanto temos de replicar alguns bons exemplos. Também, e porque estamos nos 50 anos do 25 de Abril, uma das maiores alegrias que tive foi descer a Avenida da Liberdade várias vezes, durante a Jornada Mundial da Juventude, e haver uma manifestação de jovens cristãos naquela avenida. Esta liberdade de dizer “nós somos felizes, temos uma alegria de transmitir que Cristo está connosco, que Cristo vive em mim”. Foi na Avenida da Liberdade e houve esse respeito todo. Dei estes dois exemplos porque, como é óbvio, nós devemos estar na rua, a manifestar e a habitar o espaço público, dizendo aquilo que somos: cristãos.
Talvez a síntese desta pergunta seja: na sua opinião, naquilo que são as grandes preocupações, lutas e bandeiras dos jovens de hoje, a Igreja está ao lado dos jovens ou, por outro lado, representa a resistência? Em alguns temas podemos identificar a resistência.
Nós vamos ter de mudar o chip. Os caminhos tradicionalistas de abordar o Evangelho e de aproximar dos jovens, vamos ter de os deixar de lado. Já sabemos qual é o resultado. Vamos querer trilhar caminhos diferentes. Não é por acaso que digo que há todo um mar de desafios para os jovens. Temos de ser ousados, temos de ser aventureiros, temos de ser criativos, temos de ser criativos, temos de ser poéticos. Esse é o caminho. Ou melhor, é um caminho — e é esse que eu preconizo. Trabalhar com eles, não trabalhar para eles de cima para baixo. O departamento nacional será a base, será a casa. Já dei este exemplo: o departamento não está no “top” da pirâmide, vai estar no “down“, vamos virar isto ao contrário. Os jovens estão cá em cima e é para eles que nós vamos trabalhar. Trabalhar para eles, por eles e com eles. Que nesta dinâmica de participação os projetos e as ações sejam dinamizados por eles, que sejam transmitidos aos adultos e que nós os acompanhemos.
E será possível fazer um trabalho que vá além de, perdoe-me a expressão, “pregar aos convertidos”?
Quando falei de 1,6 milhões de jovens, é 1,6 milhões de jovens. Se começamos a pensar nos 50% que são católicos, são 800 mil. Depois, se ainda descermos mais um bocadinho, vai para os 200 mil, portanto temos muito terreno para evangelizar. É a esses que nós queremos chegar. Um dos nossos desafios, quando preparávamos a Jornada Mundial da Juventude era: temos de chegar a 1,6 milhões de jovens, dizer que vai haver Jornada, pelo menos mostrar. Se eles depois quiserem vir, vêm e nos acolhemos. Se não quiserem vir, pelo menos nós transmitimos. Na nossa realidade, em Aveiro, nós praticámos a Igreja de saída. Calcorreámos todas as paróquias a mostrar a JMJ. Uma das coisas que eu fazia nas minhas apresentações era um slide onde dizia: vocês têm não sei quantos jovens; nesta paróquia ou neste arciprestado existem 20 mil jovens. Vamos lá meter pés ao caminho, porque há 20 mil jovens para saberem que há JMJ, aproximar-se do Evangelho, aproximar-se de Cristo, e depois podem fazer o seu caminho e o seu discernimento. Portanto, nesta caminha da JMJ, eu pessoalmente pratiquei muito isso. Costumo dizer que não vamos falar para os cristãos da primeira fila. Falemos para os cristãos da última fila e, da igreja de portas abertas, para os que estão lá fora.
Voltando um pouco à discussão anterior, que tinha a ver com a expressão que surge no relatório do Sínodo, que é a questão da doutrina. Muitas vezes, aquilo que afasta os jovens da Igreja tem menos a ver com o Evangelho — que podemos até discutir se é suficientemente divulgado…
Não é. Nós não sabemos… Era o que eu dizia: o Evangelho é tão bonito, como é que nós temos dificuldade de transmitir a beleza aos jovens e a todos? Não consigo compreender.
A Igreja foca-se mais em disseminar a doutrina, é isso?
Se calhar, perdemos mais tempo na doutrina e menos na evangelização. Provavelmente.
E parece-lhe que será possível chegar aos jovens de hoje sem mudanças substanciais, por exemplo, na doutrina? Mudanças no catecismo sobre temas como a sexualidade, que é um dos temas quentes, mas também sobre a questão das mulheres, por exemplo?
A Igreja demora, muitas vezes, muito tempo a atualizar-se. Acho que temos sempre de ser contemporâneos no pensamento. Não é ser modernos — é ser contemporâneos. Ser contemporâneo é estar constantemente a atualizar. Não vejo porque não explicarmos numa linguagem jovem, clara, aquilo que a Igreja pensa sobre os assuntos que disse. Mas, de certa forma, se tivermos de nos atualizar, que nos atualizemos.
Com base em tudo isto que discutimos, que iniciativas concretas é que o Departamento Nacional da Pastoral Juvenil quer fazer?
Eu estou há poucos dias no departamento, mas uma das coisas que estou a fazer — e a dedicar os meus primeiros 40 dias — é praticar esta Igreja de saída. Se nós pedimos aos outros, também temos de ser exemplo. Vou ter uma odisseia nacional de percorrer todas as dioceses, escutar todos os secretariados, escutar também os jovens dessas dioceses e já comecei. Quero escutar, refletir e depois agir. Não quero agir antes de escutar. Obviamente, tenho ideias claras e uma visão para o Departamento Nacional da Pastoral Juvenil, mas essa visão também tem de ser construída por todos. Tenho é alguns princípios de atuação e de trabalho. São seis princípios: que o departamento seja sinodal, inclusivo, sustentável, transparente, transversal e digital. Isto são os princípios de atuação que eu quero levar para o departamento e, a partir daí, saírem as atividades. Agora, há uma em que estamos já a trabalhar, que é a peregrinação do jubileu da esperança, a Roma, em julho/agosto de 2025. O que tenho sentido é que de facto há uma mobilização de jovens portugueses, cristãos, para irem ao jubileu. Isso é bom. A partir do jubileu, nós vamos centrar todas as dinâmicas de ação para este próximo ano. Depois, no outro, vamos construir juntos esse caminho. Não vamos pelos eventos, vamos pelos princípios de atuação e, depois, na decisão, tenho o critério de amor ao próximo: não fazer aos outros o que não gosto que não me façam a mim.
É curioso o tema da esperança para o jubileu. Além de ser empenhada numa série de lutas, a geração Z é também uma geração marcada por uma certa falta de esperança no futuro: dificuldade em ter emprego, empregos mal pagos, dificuldade em comprar caso, não ter dinheiro para um dia criar os filhos, guerras no horizonte… Parece um cenário negro pela frente.
E vou acrescentar aí outro que é a vivência dos jovens durante dois ou três anos em solidão, por causa da covid. Mas temos esperança no futuro. Acho que esta ideia de sermos peregrinos na terra, pensarmos num mundo melhor e termos esta esperança, dá-nos a alegria de poder viver bem.
A fé tem um papel importante na construção da esperança?
Claro. Eu também sou um homem de fé, acredito que conseguimos construir um mundo melhor a partir do Evangelho, com ações no dia-a-dia.