No mesmo dia em que Joaquim Miranda Sarmento, líder parlamentar do PSD, apresentou o pacote do partido para fazer face à inflação, os socialistas lançaram-se à jugular do adversário, dizendo que o partido nada mais queria do praticar “caridadezinha” e seguir um caminho assistencialista para fazer face à crise. Luís Montenegro não se ficou, antecipando-se a António Costa, e garantiu que o Executivo ia apresentar medidas curtas e um programa de apoio que, além de tardio, teria propostas “travestidas” ou muito semelhantes àquelas que foram apresentadas em primeiro lugar pelo PSD.
Esta segunda-feira, António Costa apresentou finalmente o pacote de emergência do Governo e daí resultam duas leituras imediatas: o envelope financeiro do Executivo socialista é superior (2,4 mil milhões contra 1,5 mil milhões do PSD) e o caminho que as duas forças políticas apresentam para atingir os mesmos resultados (proteger famílias, classe média e pensionistas) é muito diferente. Sobretudo num pormenor: onde os sociais-democratas defendem redução de impostos, os socialistas preferem transferências pontuais e compensações de outra natureza.
Vale alimentar de 40 euros por mês até ao 3º escalão do IRS – IGNORADA
Na mesma linha da proposta aos pensionistas, o PSD propunha a atribuição, também entre setembro e dezembro, de um vale alimentar no mesmo valor de 40 euros por mês a todos os que estão na vida ativa e auferem um rendimento até ao 3º escalão do IRS (mais de 10 732 até 20 322 euros).
O Governo já tinha feito saber que não ia condicionar os apoios especificamente a vales alimentares ou de outra natureza. Ou seja: que o apoio fosse dado financeiramente e aplicado pelo contribuinte da forma que considerasse mais adequado para ultrapassar as dificuldades. E foi isso que aconteceu: 125 euros até quem ganha 2.700 euros mensaais. O que o PSD propunha era apenas até ao terceiro escalão, num valor total em vales de alimentação que ia totalizar 160 euros (4×40 euros). A proposta social-democrata foi, no entanto, ignorada.
Redução do IRS aos 4º, 5º e 6º escalões – IGNORADA
O PSD queria que o Governo dedicasse 200 milhões de euros a reduzir o IRS nos 4º, 5º e 6º escalões nos próximos quatro meses. Isto incluiria um acerto na declaração anual de IRS por via da atualização dos limiares daqueles escalões de IRS na medida do alívio fiscal total proposto. O Governo vai atribuir 125 euros a quem está no 4º, 5º e até a quem está no 6º escalão, mas de uma vez só. Não há qualquer acerto previsto na declaração de IRS. Ou seja: a proposta também foi ignorada.
10 euros de abono de família a todas as crianças – AUMENTADA
O maior partido da oposição tinha recomendado que o Governo atribuísse, entre setembro e dezembro, 10 euros adicionais por mês a todas as crianças e jovens que recebem o abono de família. No somatório dos quatro meses, a proposta do PSD daria a cada filho dependente 40 euros divididos em 10 euros mensais. O Governo aumenta este valor dando, de uma vez só, 50 euros por criança ou jovem, desde que dependente, até aos 24 anos. E a todas as crianças e jovens dependentes, não apenas àquelas que têm direito a abono de família (como acontecia na proposta do PSD.
Redução do IVA da luz para 6% – PARCIALMENTE IGNORADA
Os sociais-democratas queriam uma redução do IVA sobre a eletricidade para 6%, a taxa mínima durante 6 meses, com possibilidade de ser renovada por mais seis meses a menos que o Parlamento decidisse em sentido contrário.
O Governo preferiu outro caminho. Assim, os socialistas querem reduzir para 6% a taxa atual de 13% do IVA sobre a eletricidade, um valor que incide sobre os primeiros 100 kWh de energia consumidos em cada mês (150 kWh para famílias numerosas), desde que a potência contratada não supere os 6,9 kVA. Ora, a partir daí, a taxa em vigor será, tal como é hoje, de 23% – uma solução muito diferente daquela que foi proposta pelo PSD.
Redução do IVA do gás para 6% – IGNORADA
O PSD também propõe reduzir o IVA do gás para a taxa reduzida. O Governo, no entanto, excluiu o gás das alterações fiscais. Em contrapartida, os socialistas propõem, de uma forma geral, três soluções para que os portugueses possam poupar na fatura.
São elas: o regresso ao mercado regulado, que António Costa estima que possa representar uma poupança de 10% para um casal com dois filhos (um consumidor-tipo); a readaptação do programa “bilha solidária”, tornando-o mais acessível (tal como foi desenhada, acabou por ser um reconhecido fracasso); e a imposição (já em vigor) de um preço máximo para a venda de garrafas de gás, medida que protege mais de 2 milhões de consumidores.
Redução do IVA sobre combustíveis para 6% – IGNORADA
Mais uma vez, PSD e PS seguiram caminhos diametralmente opostos. Sociais-democratas queriam a redução do IVA sobre gasolina e gasóleo para a taxa reduzida; o Governo preferiu outro mecanismo e prolongar até dezembro a suspensão do aumento da taxa de carbono, a devolução da receita adicional de IVA e a redução do ISP.
“Ou seja”, explicou António Costa durante a conferência de imprensa desta segunda-feira, “a preços desta semana, por cada depósito de 50 litros pagam menos 16 euros na gasolina ou menos 14 euros no gasóleo do que pagariam se o conjunto destas medidas não fosse renovado”.
Linhas de apoio para IPSS e PME – ADIADA
O PSD propunha que o Governo criasse linhas de apoio financeiro para as IPSS e para as Pequenas e Médias Empresas, de forma a que conseguissem ultrapassar os aumentos dos custos de energia. Ora, António Costa prometeu anunciar as medidas para as famílias com alguma “brevidade”, mas não para já. O Governo estará à espera do Conselho Europeu de dia 9 de setembro para depois tomar medidas de apoio às empresas (sobre as IPSS, António Costa não falou de nada em específico). Para já, as propostas do PSD para as empresas, como todas as outras, foram adiadas.
Programa de Incentivo à Poupança de Energia – ADIADA
O PSD tinha proposto um Programa Extraordinário de Incentivo à Poupança Energética por consumidores domésticos e industriais. O plano já estará a ser elaborado desde o início de agosto e o Governo tinha prometido que o apresentava até ao final do mês. Ainda não o fez, mas, segundo o jornal Expresso, será apresentado no Conselho de Ministros da próxima quinta-feira. É, por isso, mais uma proposta do PSD que acaba adiada.