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Joe Biden terá dito ao filho que o ia perdoar no feriado do dia de Ação de Graças

AFP via Getty Images

Joe Biden terá dito ao filho que o ia perdoar no feriado do dia de Ação de Graças

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Dez perguntas e respostas sobre o indulto "total e incondicional" que Joe Biden concedeu ao filho Hunter

Prometeu que não utilizaria a posição de Presidente para perdoar o filho. Este domingo, voltou atrás. Trump já reagiu. O que fez Biden mudar de ideias e o que contempla o indulto presidencial?

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“Espero que os americanos compreendam porque, como pai e Presidente, tomei esta decisão.” É assim que o Presidente Joe Biden conclui a sua declaração, em que anunciou um “indulto total e incondicional” ao seu segundo filho, Hunter Biden, publicada no domingo à noite. Biden sobe assim a um pequeno “pódio” da História norte-americana: é apenas o terceiro Presidente a conceder um perdão presidencial a um membro da sua família, e o primeiro a fazê-lo com o seu filho.

Mas a pedra de toque desta decisão será outra, que não a legitimidade das relações familiares, uma vez que, ao longo dos últimos meses, o Presidente repetiu várias vezes que não iria conceder um perdão ou uma comutação da pena ao filho. Hunter deveria conhecer a sua pena para dois casos diferentes de crimes federais ainda este mês.

A mudança de posição de Joe Biden deverá estar relacionada com a vitória do Partido Republicano nas eleições do dia 5 de novembro: Donald Trump venceu as eleições presidenciais e os republicanos conseguiram maiorias nas duas câmaras do Congresso. O Presidente pode ter escolhido a época festiva em volta do dia de Ação de Graças para apelar à empatia dos norte-americanos ao anunciar este indulto, mas a decisão reveste-se de peso político, como declaram os especialistas em Direito norte-americano ouvidos pelo Observador.

epa11395517 Hunter Biden (C), son of US President Joe Biden, and his wife Melissa Cohen Biden (R) arrive to the US Federal District Court in Wilmington, Delaware, USA, 07 June 2024. Hunter Biden is facing federal criminal charges for allegedly lying on a federal form when purchasing a gun in 2018.  EPA/WILL OLIVER

Hunter Biden foi condenado por posse de arma ilegal em junho de declarou-se culpado por evasão fiscal em setembro

WILL OLIVER/EPA

Quais os crimes por que Hunter Biden foi condenado?

Hunter Biden foi condenado este ano em dois casos federais separados. No primeiro, foi considerado culpado de três crimes de compra e posse de arma de fogo ilegal, em junho, no estado do Delaware. Os crimes aconteceram em 2018, quando Biden afirmou, falsamente, que não consumia drogas ilegais nos formulários obrigatórios para adquirir armas. A lei impede pessoas que consomem substâncias ilícitas de comprar armas.

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No segundo caso, Hunter Biden declarou-se culpado de nove acusações de evasão fiscal, em setembro, no estado da Califórnia. O filho do Presidente não pagou 1,4 milhões de dólares (mais de 1,2 milhões de euros) em impostos e submeteu declarações fiscais falsas. O dinheiro foi gasto em carros e hotéis de luxo, prendas para amantes e acompanhantes.

Ambas as acusações remontam ao período entre 2015 e 2019, quando Hunter Biden enfrentou problemas de toxicodependência, após a morte do seu irmão mais velho Beau Biden, tema sobre o qual fala abertamente.

Em que estado se encontravam os dois processos?

Desde os dois julgamentos que Hunter Biden aguardava a leitura das sentenças em liberdade, depois de ter pago a fiança definida pelo tribunal. A leitura da sentença do primeiro caso estava marcada para o dia 12 de dezembro e Biden enfrentava uma possível pena até 17 anos de prisão. Mas juristas norte-americanos apontaram que, devido às atenuantes, a pena de prisão efetiva não deveria passar dos 36 meses.

A sentença no caso de evasão fiscal seria conhecida no dia 16 de dezembro. A pena máxima seria de 25 anos e, neste caso, a pena deveria ser mais pesada do que uns meses de prisão efetiva. Por dois motivos: evasão fiscal é um crime mais grave e a primeira condenação podia ser utilizada como agravante. Os advogados de defesa já notificaram formalmente os juízes dos dois casos que o perdão foi aceite por Hunter Biden e que este “requer a rejeição da acusação e o adiamento de todos os procedimentos futuros”.

O que é um indulto?

Um indulto é um perdão presidencial previsto no 2º. artigo da Constituição norte-americana, onde se pode ler que o “Presidente tem o poder de conceder suspensões e perdões por ofensas contra os Estados Unidos, exceto em casos de impeachment“. Ou seja, o Presidente pode perdoar todos os crimes federais, exceto o de impeachment, mas esse poder não se aplica a crimes estaduais.

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Donald Trump assinou 237 indultos presidenciais em 4 anos na Casa Branca, incluindo ao sogro da filha

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Este poder foi utilizado de forma extensa por antigos Presidentes: Donald Trump utilizou-o 237 vezes em quatro anos e Barack Obama 1.927 em oito, para perdoar crimes que vão desde o consumo ilícito de drogas a evasão fiscal, segundo o Washington Post. “Um indulto é final e não pode ser anulado, nem ser sujeito a recurso“, sublinha ao Observador, Mark Osler, professor de direito na Universidade de St. Thomas, especialista em clemência jurídica.

O que está contemplado no indulto a Hunter Biden?

O indulto concedido a Hunter Biden faz com que nunca venha a ser sentenciado pelos crimes pelos quais foi condenado, perdoando-o ainda de qualquer “infração que tenha ou possa ter cometido ou participado durante o período compreendido entre 1 de janeiro de 2014 e 1 de dezembro de 2024“, como se pode ler na declaração presidencial.

Isso quer dizer que Hunter Biden não pode ser condenado por nenhum crime federal que tenha sido cometido nesse período temporal, incluindo crimes que ainda possam vir a ser revelados. Os mais de dez anos contemplados pelo indulto abrangem o período em que Hunter Biden fez parte da administração da Burisma, uma empresa de gás da Ucrânia. Os republicanos acusam Biden de ter utilizado o seu apelido para conseguir negócios rentáveis com a Ucrânia e a China, mas essas acusações nunca foram confirmadas pelo Ministério Público norte-americano. Agora, mesmo que sejam investigadas e confirmadas pela nova administração republicana, estarão cobertas pelo indulto.

O que é que Joe Biden já tinha dito sobre o caso?

Joe Biden tinha sido muito claro sobre a sua posição: um indulto não estava em cima da mesa. Disse-o logo a seguir à primeira condenação de Hunter, em junho. “Respeito a decisão do júri. Vou fazer isso e não lhe vou conceder um indulto“, afirmou à data, numa conferência de imprensa à margem do encontro do G7, enquanto ainda era candidato à Casa Branca.

"A nossa resposta [à possibilidade de um indulto] mantém-se. É um não."
Karine Jean-Pierre, porta-voz da Casa Branca, em conferência de imprensa no dia 7 de novembro

Em setembro, quando Hunter Biden se declarou culpado no caso de evasão fiscal — e Biden já tinha passado o testemunho a Kamala Harris –, a porta-voz da Casa Branca reafirmou a sua posição. “A resposta continua a ser um não”, declarou Karine Jean-Pierre. Dois dias depois das eleições, quando a vitória de Trump já tinha sido declarada, Jean Pierre afirmou: “A nossa resposta mantém-se. É um não.”

Esta firmeza de Joe Biden, independentemente das circunstâncias, foi recebida por alguns, como o professor Mark Osler, com estranheza. “Pensámos que havia sempre uma possibilidade de o Presidente Biden perdoar o seu filho, devido à sua proximidade. As suas negações insistentes é que pareceram estranhas — ele podia ter dito que ainda não tinha decidido”, afirma ao Observador.

O que mudou agora?

Legalmente, nada. Mas a proximidade familiar parece ter sido mesmo o que fez o Presidente mudar de ideias. Isto porque Joe Biden terá dito ao filho que o ia perdoar durante o feriado do dia de Ação de Graças, celebrado na passada quinta-feira, avançaram fontes anónimas próximas do Presidente à CNN e ao New York Times. O anúncio público foi feito imediatamente a seguir. “Depois de ter tomado a decisão este fim de semana, não havia justificação para a adiar mais”, escreveu o próprio Presidente.

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Biden terá informado o filho da decisão enquanto passavam as festividades juntos no Massachussets

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Funcionários da Casa Branca já tinham relatado que a mudança de cenário político tinha levantado a possibilidade de um indulto. Ainda assim, esperavam que a decisão só fosse finalizada depois da leitura das sentenças, nas próximas semanas. Um membro sénior da sua administração afirma à CNN que o perdão não seria provável se Kamala Harris tivesse ganhado e ressalva que Biden agiu como pai, mais do que como Presidente.

A relação próxima entre o Presidente e o filho já tinha sido apontada como um problema por vários oficiais do Departamento de Justiça, que falaram de forma anónima ao New York Times. Estas fontes classificaram as investigações como “necessárias, mas ingratas”, não só pela dinâmica pessoal envolvida, mas “tempestade política” que levantaram.

Como é que Joe Biden justificou o indulto?

O Presidente justificou o indulto citando, precisamente, a tempestade política criada em volta das investigações ao seu filho. Joe Biden fala em “pressão política” exercida pelos seus “adversários políticos no Congresso” com o objetivo de “quebrar Hunter” — “que está sóbrio há cinco anos e meio, mesmo face aos ataques implacáveis e a perseguição seletiva”, salienta o Presidente na sua declaração.

"[Trump] pode utilizar o perdão para justificar as suas ações futuras, especialmente as mais controversas."
Dan Kobil, professor de Direito na Capital University, no Ohio

O chefe de Estado argumenta ainda que Hunter foi “tratado de forma diferente” face a outros casos, com os mesmos crimes e as mesmas circunstâncias, apenas por ser seu filho. “Acredito no sistema judicial, mas também acredito que a política infetou este processo e conduziu a um erro judiciário”, acrescenta Joe Biden.

Dan Kobil, professor de Direito Constitucional da Capital University no Ohio, sublinha que a pressão política dos republicanos deverá aumentar com a chegada de Donald Trump à Casa Branca — que, desde que foi eleito, deixou ameaças aos seus adversários políticos, incluindo aliados do Presidente e jornalistas. “O filho de Biden poderia ser o alvo principal da nova administração se o objetivo fosse a retaliação”, diz.

Qual a posição de Donald Trump sobre os casos?

Donald Trump utilizou as mesmas palavras que Joe Biden: “Erro judiciário”. Mas enquanto o Presidente cessante se referia à investigação contra Hunter, o Presidente eleito fazia menção ao indulto, acrescentando que é “um abuso”. O republicano sempre foi uma das principais vozes de incentivo à investigação a Hunter Biden, incluindo aos negócios ilegais que o acusa de ter realizado através da empresa ucraniana. Foi ele que nomeou David Weiss, o procurador do Delaware que avançou com os processos. Além disso, durante as duas campanhas presidenciais contra Joe Biden, utilizou por várias vezes o nome de Hunter para fazer acusações contra o seu adversário.

Trump não pode reverter esta decisão. “Contudo, pode utilizar o perdão para justificar as suas ações futuras, especialmente as mais controversas”, argumenta o professor Dan Kobil. Kobil e Osler concordam naquela que deverá ser uma das primeiras respostas de Trump a este indulto: perdoar os manifestantes que foram detidos por terem invadido o Capitólio no 6 de Janeiro. O Presidente-eleito deixou este objetivo em cima da mesa ao longo da campanha e reafirmou-o este domingo. “O indulto dado por Joe a Hunter inclui os reféns do J-6, que estão presos há anos?”, questionou na Truth Social.

Qual é o histórico de indultos concedidos por antigos Presidentes?

Como o Post destacou, não só não é raro, como até é comum que os Presidente utilizem o poder de indulto. É ainda mais comum na reta final da Presidência, como já muitos Presidentes fizeram. O que é raro é que o perdão seja atribuído a um familiar. O primeiro caso verificou-se a 20 de janeiro de 2001, no último dia de Bill Clinton na Casa Branca. O democrata assinou uma série de indultos, entre os quais se encontrava o seu meio-irmão. Roger Clinton foi condenado por posse e venda de cocaína a um polícia infiltrado em 1985, crime pelo qual cumpriu um ano de prisão.

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Trump disse estar a considerar indultos aos manifestantes que invadiram o Capitólio a 6 de Janeiro

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O segundo caso foi em dezembro de 2020, quando Donald Trump perdoou Charles Kushner, sogro da sua filha Ivanka Trump, por crimes de evasão fiscal e retaliação contra testemunhas, a irmã. Kushner tinha assumido a culpa por 18 acusações e cumpriu 14 meses de prisão, de uma sentença de dois anos. Este fim de semana, Kushner foi anunciado por Trump como o novo embaixador dos Estados Unidos em França.

O perdão de Joe Biden é apenas o terceiro concedido a familiares de presidentes. Contudo, os perdões atribuídos por Clinton ou Trump só foram assinados depois de os indultados já terem cumprido as penas e eram mais uma questão de justificação, nota o New York Times. Além disso, ambos assinaram outros perdões com muito mais peso político que estes dois. Clinton perdoou antigos parceiros de negócios, condenados por crimes fiscais, e Trump perdoou aliados que estavam a ser investigados por terem contribuído para os crimes ligados a uma interferência russa na sua primeira eleição, em 2016.

Que consequências políticas tem a decisão de Joe Biden?

O professor de Direito Mark Osler argumenta que é importante contextualizar o contexto da decisão do Presidente. “Ele nunca vai concorrer a um cargo. Não tinha nada a perder politicamente”, nota o especialista ao Observador, uma visão partilhada por Dan Kobil. Contudo, ambos afirmam que a decisão “mancha o legado” de Joe Biden. “Pode ofuscar muitas das coisas boas que fez”, remata o professor Kobil.

"É uma ação egoísta de Biden, que vai fortalecer Trump politicamente. [Trump pode dizer] 'Não sou uma ameaça única. Todos o fazem. Joe Biden fez o mesmo'."
Joe Walsh, antigo congressista republicano, crítico de Trump

O jornalista norte-americano Stephen Collinson, que analisou as consequências políticas do indulto, argumenta por sua vez que reacende a discussão entre democratas e republicanos sobre a politização do sistema judicial e dá armas aos republicanos, que acusam os democratas de utilizarem o Departamento de Justiça a seu favor. O maior exemplo disso é a acusação de que as quatro investigações contra Trump — duas federais e duas estaduais — se baseiam em “acusações fabricadas” que têm como objetivo retirar-lhe poder político.

Com a decisão de Biden, qualquer crítica que os democratas possam fazer aos indultos que Trump pretende atribuir sai fragilizada, aponta Mark Osler. Joe Walsh, antigo congressista republicano, crítico de Trump, define o indulto como “uma ação egoísta de Biden, que vai fortalecer Trump politicamente“. Em declarações ao canal MSNBC acrescentou que o Presidente eleito tem agora legitimidade para dizer “Não sou uma ameaça única. Todos o fazem. Joe Biden fez o mesmo”.

As críticas dos republicanos — da politização do sistema judicial ao facto de os Biden “fugirem às responsabilidades” — eram esperadas. Mas o indulto também dividiu os democratas. Enquanto alguns concordaram com a justificação de Joe Biden e afirmaram que outras pessoas não seriam investigadas pelas mesmas acusações, outros, como o governador do Colorado, declararam que era um “mau precedente que podia ser abusado por outros Presidentes”.

“Enquanto pai compreendo o desejo natural do Presidente Biden ajudar o seu filho, mas uma pessoa pode simpatizar com as dificuldades de Hunter Biden ao mesmo tempo que reconhece que ninguém está acima da lei, nem o Presidente, nem o filho do Presidente“, criticou Jared Polis.

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